Todo ano, entre os meses de novembro e dezembro, surgem diferentes oportunidades para quitar as dívidas em atraso — do “Feirão Limpa Nome” até a Black Friday. Aproveitando o fluxo maior de receitas das pessoas, seja por bonificações no trabalho, 13º salário ou aumento de vendas para os comerciantes, as empresas não perdem a chance de oferecer condições “vantajosas” para fechar o ano no azul.

Em 2020, com a pandemia e uma crise econômica latente, estas condições podem se tornar mais atrativas. Segundo um levantamento feito pelo Serasa Experian, o Brasil tem atualmente 62,7 milhões de pessoas com dívidas atrasadas, ou seja, inadimplentes.

Com recursos na mão e uma boa estratégia, é possível tentar terminar o ano com o nome limpo. Mas é preciso ter cuidado com as armadilhas na hora de fechar uma renegociação. Por este motivo, o InvestNews consultou algumas especialistas para avaliar as oportunidades mais pop do mercado, e as vantagens e desvantagens destas.

De olho no Feirão da Serasa

Uma das alternativas para tentar renegociar as dívidas é o Feirão Limpa Nome organizado pela Serasa, que ocorre anualmente nos meses de março e novembro. Este ano, ele acontece de forma 100% online até o dia 30 de novembro. É possível renegociar dívidas com apenas R$ 50 e, em alguns casos, com até 98% de desconto. Participam mais de 50 empresas, entre lojas de departamento, companhias telefônicas, bancos e faculdades.

Embora os descontos pareçam mirabolantes, quem aceitaria quitar uma dívida por apenas R$ 50? Luciana Ikedo, assessora de investimentos e sócio-fundadora do escritório Ikedo Investimentos, explica que isso ocorre por causa dos juros. Suponhamos que você tinha uma dívida original de R$ 100, acrescida de juros sobre juros ela virou R$ 1000 meses depois. Muitas vezes no Feirão, você tem a oportunidade de quitar a dívida no valor inicial.

O processo de negociar pela internet costuma ser simples. Basta entrar no site do Serasa Limpa Nome, clicar na empresa devedora e começar a negociação. Ou para quem prefere o Whatsapp, há também um número disponível: o (11) 99575-2096. O participante precisa enviar um “Oi” e um assistente virtual da Serasa auxiliará no processo, apresentando as dívidas e as alternativas de negociação.

Mil parcelas ‘sem’ juros?

Como tudo está ao alcance de um clique, eis que surge o primeiro cuidado. Se você não vai pagar à vista sua dívida, fique de olho nas parcelas. Por exemplo:

Em 2017, Renan Lopes, de 25 anos, contraiu três dívidas usando cartão de crédito, problema muito comum entre os brasileiros. Elas foram vendidas do Bradesco para a empresa Recovery, especializada em renegociação. As dívidas acumularam em três anos, após juros acrescidos, o total de R$ 9.179,57.

Ao entrar no Serasa Limpa Nome, foi oferecida a ele a alternativa de pagar à vista o total da dívida pelo valor de R$ 2.022,26, o que equivale a um desconto de 77,97% sobre o valor total da dívida.

Caso Renan não tivesse o dinheiro para pagar a dívida à vista, veja como ficariam algumas simulações oferecidas pela empresa:

Segundo a educadora financeira Cintia Senna, um problema muito comum é que a maioria das pessoas provavelmente escolheria a última alternativa: pagar R$ 73,36 por mês em 48 parcelas, sem calcular que estaria optando por um valor muito maior.

No entanto, neste caso, o maior valor renegociado de R$ 3.521 ainda é menor que a dívida atual com juros de R$ 9.179,57. “Quanto menor o número de parcelas, maior o desconto sobre a dívida”, afirma.

Antes de optar por pagar a dívida em parcelas, Cintia aconselha comparar quão distante é este valor do pagamento à vista. Se a diferença for muito discrepante e a pessoa tiver um valor aproximado, muitas vezes é melhor esperar “Suponhamos que eu tenha R$ 1.800. Falta muito pouco para me aproximar desta dívida, e pode ser mais interessante aguardar e juntar o valor inicial de R$ 2.022,26”, explica.

Ela reforça que não é necessário esperar outro feirão acontecer para negociar. Mas é importante anotar o valor da oferta para ter em conta o valor real da dívida. “Anote o valor à vista de R$ 2.022,26 e ligue para empresa oferecendo isso em negociação. A instituição estará aberta a aceitar”, aconselha.

Contudo, para quem vai optar por pagar parcelado, ela reforça a importância de avaliar se a parcela vai caber no orçamento mensal. Por exemplo, se optar por uma parcela de R$ 300, você tem como honrar esse compromisso todo mês sem atrasos? Caso contrário há perigo de quebrar o acordo e ficar endividado novamente.

Caso a dívida seja negociada fora do feirão, ela aconselha tomar cuidado com os golpes. “É importante ter certeza que está negociando uma dívida com a empresa que deve e não sair pagando boletos sem antes confirmar a origem”, aponta.

Para garantir ainda mais sua segurança, peça um comprovante da renegociação ou quitação. E certifique-se que em até 5 dias úteis seu nome seja retirado dos birôs de crédito: SPC, Serasa, SCPC Boa Vista e Quod.

Como negociar fora do Feirão?

Se a companhia não está listada no Feirão Limpa Nome, você ainda pode usufruir do final do ano para encontrar boas pechinchas. Aliás, quando a dívida é muito antiga, há sempre oportunidade de obter bons descontos. Segundo Cintia, quando a dívida supera os 7 meses, as empresas costumam considerá-la como perdida e estão mais propensas receber qualquer valor no lugar de não receber nada.

Um exemplo disso é o jovem Bruno Henrique, de 26 anos, morador de Arthur Nogueira (SP), que tinha uma dívida de R$ 2.795 no cartão de crédito com o Bradesco e conseguiu pagar três anos depois por R$ 380 no boleto, pelo aplicativo da Serasa. “Entrei no aplicativo e estranhei o desconto, mas consegui pagar à vista no boleto”, comenta.

Para renegociar suas dívidas, Luciana Ikedo aconselha consultar a empresa para a qual você deve e qual o valor por meio dos birôs de crédito. Na sequência, é hora de fazer contato. Veja algumas dicas:

Luciana aconselha também não ir com muita sede ao pote, embora novembro e dezembro são meses com maiores recursos, é importante lembrar que em janeiro surgem novas obrigações. “Tem pagamento de IPVA, IPTU e para quem tem filhos ainda tem material escolar, matrícula e anuidade, isso não pode sair do nosso radar financeiro”, afirma.

Devo, não nego, pago quando puder

Nesta pandemia, muitas pessoas perderam seus empregos e algumas tiveram sua renda reduzida. Se você está nessa situação e ainda não tem uma reserva de emergência ou uma fonte de renda fixa, as especialistas recomendam esperar antes de resolver seu endividamento.

E não há necessidade de ficar frustrado por causa disso. Aproveite a oportunidade para se reeducar financeiramente. Cíntia aponta que o primeiro passo é encarar a a realidade e entender quanto de fato eu ganho e quais são os meus gastos necessários. Entre eles, contas de luz, água, alimentação, internet e outros. Usar planilhas pode ajudar.

Luciana Ikedo observa que não adianta se apegar à antiga situação econômica. “Se sempre tive TV a cabo, preciso entender que talvez nesse meu novo momento de vida este serviço precisa ser cortado e agir com frieza”, aconselha.

Além de encarar a realidade, é importante refletir qual foi o motivo que nos levou ao endividamento, consumo excessivo ou falta de renda, e tentar mudar esse comportamento.

E, principalmente, começar a constituir uma reserva de emergência, recurso para garantir suas necessidades de três a seis meses. O dinheiro investido poderá até mesmo ser utilizado no pagamento destas dívidas mas, principalmente, ajuda a adquirir o hábito de poupar e logo investir.

Segundo os especialistas ouvidos, não adianta se escudar no clichê que a “dívida vence daqui a 5 anos”. Ela pode sair dos órgãos de restrição, mas não da memória da empresa. “Antigamente era tudo muito mais fácil de caducar, agora de forma online o seu registro ainda permanece naquela instituição”, diz Cintia.

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