São Paulo – Os preços internacionais do petróleo despencaram e afetam mercados do mundo todo após um desentendimento entre os maiores players do setor. No final de semana, um racha na Opep (Organização dos Países Exportadores de Petróleo) levou a Arábia Saudita, maior exportador de petróleo do mundo, a anunciar um aumento drástico na produção – resultando em uma imediata queda nos preços. Com isso, os mercados vivem um novo capítulo de tensão, que já era agravado pela crise do coronavírus.
O barril de petróleo tipo Brent (negociado em Londres) desabava 20% por volta de 7h30 (horário de Brasília) desta segunda-feira (9), negociado ao redor de US$ 35, após ter chegado a cair 30%. No começo do ano, a cotação estava acima de US$ 65.
Já o petróleo WTI, negociado dos Estados Unidos, caiu ao menor nível em quatro anos. Na abertura dos mercados asiáticos, as cotações voltaram a patamares de 1991, quando ocorreu o estopim da Guerra do Golfo.
‘Circuit breaker’ e tombo da Petrobras
O principal índice da bolsa brasileira, o Ibovespa, despencou mais de 10% na abertura desta segunda-feira (9) e entrou em “circuit breaker”. A negociação na Bolsa foi suspensa por 30 minutos. Todas as ações do indicador tiveram fortes perdas na abertura, com as ações ordinárias da Petrobras (PETR3) chegando a cair mais de 25% e as preferenciais (PETR4) desabando 24%.
Em Nova York, o ADR (recibo de ações negociado no exterior) da estatal recuava mais de 16% no pré-mercado nesta manhã (antes do pregão oficial), negociado a US$ 8,80. Já o fundo de índice que representa os principais papéis do Ibovespa no exterior, o EWZ, caía acima de 9% em Nova York.
O risco-país do Brasil medido pelo CDS (Credit Default Swap) nos contratos de cinco anos subiu para um spread 207 pontos. É o maior patamar desde o dia 28 de dezembro de 2018.
O índice futuro do S&P 500, o mais importante de Wall Street, entrou em “circuit breaker” na noite deste domingo (8) após cair mais de 5%. O mecanismo paralisa as negociações por alguns minutos para evitar quedas ainda maiores (veja abaixo como funciona o circuit breaker em Nova York).
As bolsas da Ásia e do Pacífico encerraram em forte queda generalizada, e investidores continuaram buscando ativos mais seguros, como Treasuries e o iene. O índice japonês Nikkei sofreu um tombo de 5,07% hoje, a 19.698,76 pontos. Na China continental, o Xangai Composto recuou 3,01% nesta segunda.
Na Europa, o índice FTSE 100, do Reino Unido, afundava mais de 6% no início da manhã. O DAX, da Alemanha, caía quase 6%, enquanto índice CAC, da França, recuava 6,26%.
As principais commodities caíam com força, com exceção do ouro, que é tido por investidores como um porto seguro em tempos de incerteza.
As ações da Saudi Aramco, maior petroleira do mundo, chegaram a cair ao redor de 10% nesta manhã, ficando 15,6% abaixo de seu preço no IPO (oferta inicial de ações), diante da notícia de que cortaria seus preços. A companhia abriu seu capital no final do ano passado e ultrapassou a Apple como empresa mais valiosa do mundo.
As petrolíferas foram destaque negativo na Ásia. Em Tóquio, a Japan Petroleum Exploration caiu 12,69%. Já em Hong Kong, ações de PetroChina e CNOOC recuaram 9,63% e 17,23%, respectivamente.
O que levou ao racha na Opep
A decisão dos sauditas de aumentar a produção do petróleo, que foi interpretada como uma guerra de preços, veio após a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep) e os aliados da Opep+ não conseguirem fechar um acordo, na última sexta (6), para cortar ainda mais a produção, como estratégia para lidar com o impacto econômico do coronavírus.
A Rússia, líder informal da Opep+, não aceitou uma proposta da Opep de reduzir a oferta coletiva em mais 1,5 milhão de barris por dia. “A Rússia não concordou com os cortes adicionais porque seu orçamento é, em tese, mais bem preparado para preços baixos do que os demais países”, escreveu em relatório o analista de energia do BTG Pactual, Thiago Duarte.
Em reação à atitude da Arábia Saudita, os preços despencaram. Na sexta, as cotações já haviam caído em torno de 10% após o fracasso das negociações da Opep+.
Um aumento na produção, neste momento, representa um duro golpe para os preços do petróleo, já que a demanda mundial está enfraquecida pelos efeitos do coronavírus, cujas consequências ainda são desconhecidas.
Possíveis efeitos para o Brasil
O que mais preocupa os mercado agora é o aumento das incertezas, em um cenário já bastante tenso com o coronavírus. “Mas ao contrário do que aconteceu nos anos 70, este evento tem caráter deflacionário para energia e poderia ser benéfico a diversos setores, com exceção daqueles ligados à commodity”, escreveu em relatório o economista-chefe da Infinity Asset, Jason Vieira.
No Brasil, a consequência mais imediata do petróleo cotado na casa dos US$ 30 seria uma redução drástica nos preços dos combustíveis pela Petrobras. Hoje, a companhia trabalha com a paridade de preços dos combustíveis no mercado internacional.
Em outras palavras, quando os preços do petróleo caem lá fora, a estatal repassa a variação da gasolina e do diesel para as refinarias. Estas, por sua vez, decidem se reduzem ou não os preços para o consumidor final, nos postos de combustível.
Por um lado, a queda dos combustíveis no Brasil ajudaria a reduzir os custos energéticos e de transportes. Por outro, isso reduziria a competitividade da Petrobras, já que os custos de produção ficariam mais apertados, diante de uma receita menor.
Outra consequência seria “quebrar” o efeito do real desvalorizado frente ao dólar, lembrou Vieira. “Para as empresas petrolíferas, obviamente, a história é mais pesada”, escreveu.
Enquanto isso, a disseminação do coronavírus em outros países além da China, onde o surto teve início, continua alimentando a busca por segurança. Os juros dos Treasuries (títulos de dívida dos EUA) de 10 e 30 anos, por exemplo, renovaram mínimas históricas nesta madrugada.
Também no fim de semana, dados oficiais mostraram que as exportações chinesas tiveram uma redução anual de 17,2% no primeiro bimestre, um pouco maior do que o declínio de 17% previsto por analistas consultados pelo “The Wall Street Journal”.
Como funciona o circuit breaker nos EUA
De acordo com a Bolsa de Valores de Nova York (NYSE), os negócios nas bolsas americanas podem ser interrompidos sempre que houver fortes baixas e volatilidade. Pela regra, o circuit breaker é acionado em três situações:
- Se o S&P 500 cair 7%, os negócios ficam suspensos por 15 minutos
- Se o S&P 500 cair 13%, há uma nova pause de 15 minutos, se a queda ocorrer até 15h25.
- Se o S&P 500 cair 20%, os negócios param pelo resto do dia.
*Notícia em atualização.