A moeda americana já caiu cerca de 14% contra o real neste ano, é verdade, mas as coisas podem mudar em breve: em 2026, ano de eleição, é quase uma leitura tácita entre profissionais de mercado que os problemas fiscais do país voltarão a ganhar protagonismo. Se isso acontecer, o dólar deve, no mínimo, recuperar uma parte do terreno perdido.
É aí que entra o poder da primeira forma – e talvez a mais eficiente – de se investir com essa estratégia de “dolarização” da carteira: os ETFs. E o destaque aqui vai para o IVVB11, o mais líquido entre todos os fundos de índice internacionais listados na B3 e que replica o desempenho do S&P 500, sem hedge (proteção cambial).
As ações americanas estão no ponto em que podem, sim, ser consideradas caras. Ainda assim, mesmo uma alta modesta na renda variável dos EUA serviria de impulso para os ativos estrangeiros negociados aqui. A matemática, então, fica clara: um avanço do dólar, ainda que pequeno, junto com uma alta, ainda que modesta, das ações dos EUA torna um simples ETF de S&P 500 uma excelente escolha. Em prazos maiores, então, nem se discute.
É exatamente isso que contam os dados históricos, ainda que tenhamos que lembrar que retorno passado nunca é garantia de retorno futuro. O IVVB11 cai cerca de 3% neste ano exatamente porque capturou a alta do S&P 500 lá fora, de 11%, mas também a queda da dólar ante o real. Nem por isso deixou de ser uma ótima opção: já entregou um retorno de 13% em 12 meses e 61% em 24 meses. Nas janelas acima de 12 meses, o dólar não chegou a superar o Ibovespa todas as vezes, mas o IVVB11 sim, justamente pelo efeito cumulativo do câmbio com a renda variável.
Comprando ações “gringas” sem sair do Brasil
Para investir em empresas estrangeiras sem sair da bolsa local, o investidor tem à disposição os BDRs. É o equivalente a negociar a ação no Brasil, tão simples quanto. E a grande jogada aqui é fazer o dever de casa básico: optar por companhias líderes em seus setores ou com negócios que só elas conseguem oferecer, além da óbvia entrega de lucros e receitas consistentes.
Como a bolsa americana pode estar passando por uma fase de preços caros, o investimento nos BDRs precisa ser feito para o longo prazo ou então via uma exposição um pouco mais diluída com outros ativos – que é o que próprio IVVB11 permite.
Fora isso, vale dar dois passos para trás no caso dos papéis que subiram muito nos últimos meses. É o caso do setor de tecnologia, cujas altas já começam a deixar os investidores inquietos. Não é como se o mundo estivesse perdido para Nvidia, por exemplo, mas uma “correção” do mercado não seria surpreendente a essa altura do campeonato.
Vamos para alguns exemplos. Os BDRs da Tesla (TSLA34), os mais negociados do mercado, acumulam queda no ano pelo aumento da forte concorrência com os carros chineses e com a leitura cada vez mais crescente de que houve euforia demais na esteira tema inteligência artificial. Quem investiu no BDR da Tesla já perdeu 17% com o “combo” dólar mais a ação. E, para frente, a situação não deve melhorar para a companhia, que enfrenta o ceticismo do mercado em vê-la como mais do que uma empresa de veículos, além dos desafios concorrenciais.
É uma situação totalmente diferente do Mercado Livre (MELI34), também um dos papéis mais negociados. Nesse caso, o investidor colheu a valorização na bolsa americana Nasdaq, mas perdeu o restante da alta por causa do dólar. O papel, porém, segue muito bem avaliado pelas áreas de pesquisas dos maiores bancos de investimento. O movimento dos concorrentes é uma pedra no sapato no curto prazo, mas os investimentos da empresa para continuar crescendo no e-commerce e na América Latina colocam a companhia em vantagem.
Bonds, a diversificação na renda fixa internacional
Fora do Brasil, os investidores têm acesso a títulos de dívida do governo americano (Treasuries), de outros governos, de empresas estrangeiras e empresas brasileiras. Todos eles são chamados de bonds. No caso desses produtos, a expectativa se repete: com a queda do dólar, abre-se a chance de entrar nos ativos a preço mais baixo e diversificar a carteira em moeda forte.
No caminho ideal, o investidor pode ter bonds na carteira por meio de ETFs ou fundos tradicionais de renda fixa, como aqueles oferecidos por gestoras “gringas” especializadas no tema, caso da Oaktree e da Pimco ou grandes gestoras locais como JGP e Legacy. Investir diretamente só dá para fazer por meio de uma conta internacional.
Em especial no caso das Treasuries, a oportunidade que o investidor tem é garantir exposição ao governo americano. A despeito de toda a dúvida sobre a situação fiscal do país, trata-se de investir no maior mercado – e na maior economia – do mundo. Vale para outros mercados desenvolvidos, que também oferecem diversificação geográfica. Sempre bem vindo.
Saber escolher entre as alternativas globais, porém, não é tarefa simples para um investidor de varejo no Brasil. Daí a importância de contar com os fundos. Entre os ETFs, como mencionamos, vale considerar o BNDX11, que compra emissões de diversos países desenvolvidos sem contar os EUA, e o USDB11, que replica o mercado agregado de renda fixa dos EUA, entre títulos do governo e crédito corporativo de melhor qualidade (high grade).
Exportadoras, o jogo “dolarizado”, mas com a moeda local
Existe uma outra forma de trazer o efeito do dólar para a carteira sem sequer comprar ativos lastreados diretamente nele: o investimento em exportadoras. Esse talvez seja o modo menos óbvio entre todos, porque aqui os riscos e cenários para as empresas é ainda mais evidente. Diferentemente dos BDRs, ETFs e bonds, a relação com o dólar não é necessariamente o fator determinante. Mas é, sem dúvida, um deles, então essa estratégia precisa entrar na nossa conta.
As empresas com exposição direta ao dólar na bolsa são aquelas ligadas às commodities, caso da Vale, da Petrobras e da Suzano, e também aquelas cujos negócios são dependentes do exterior, como a Embraer. Em linhas gerais, toda exportadora é beneficiada pela alta do dólar porque isso aumenta a receita delas.
Com nem tudo são flores, no caso das empresas de commodities, o que dita a direção delas é o preço das matérias-primas. No caso da Petrobras, o preço do petróleo é o que importa, óbvio, embora não valha para toda a operação da empresa, necessariamente. Como os preços do Brent devem continuar sob pressão por causa da oferta elevada, isso deve pesar para o balanço da estatal. O que o dólar vai fazer é aliviar essa dinâmica, sobretudo em um momento em que a empresa vem trabalhando em planos de ação para otimizar seus investimentos e gastos para enfrentar o cenário.
Na Vale, a jogada é ainda mais direta do que na Petrobras. O preço do minério de ferro atinge diretamente o balanço. Em termos de receita, a companhia até pode sair beneficiada de alguma forma se o dólar ficar mais caro, mas sem muito amparo dos preços da commodity. Isso porque o cenário é de preços ao redor dos atuais US$ 100, sem grande demanda sobretudo no setor imobiliário da China – o parceiro comercial mais importante da empresa.
Na Suzano, o placar está a favor. Um dólar mais fortalecido deve se somar aos preços de celulose em recuperação. É o melhor dos mundos. Não por menos, a recomendação da maioria das casas de análise dos grandes bancos é de compra.
Por fim, falamos de Embraer, que têm outra dinâmica. A empresa ganha com o dólar mais alto, mas depende substancialmente do mais simples: vender aviões. É por isso que os “pedidos firmes” de aeronaves é o que dita a perspectiva para as ações da empresa.