Na próxima semana, o mercado americano vai atingir a marca de 200 novas empresas que abriram seu capital nas bolsas de lá em 2024 – o volume de IPOs nos Estados Unidos até o fim de novembro é 30% maior do que o registrado no ano passado. Uma dessas 200 é a Brazil Potash, sediada no Canadá e que vai explorar uma mina de potássio no Amazonas. A empresa estreia hoje (21) na Bolsa de Nova York.
Abundância por lá, escassez por aqui. Em 2024 tivemos zero IPO no Brasil. Em 2023? Zero. E 2022? Adivinhem? Zero também.
Com a seca de IPOs no Brasil e sem perspectiva de melhora do mercado no horizonte, empresas brasileiras que tinham se preparado para levantar recursos no mercado de ações local atingiram o limite de espera. E estão mudando os planos. Algumas estão aumentando seu endividamento. Outras fazem operações privadas de venda de ações. Para as que atendem certos requisitos, um dos caminhos estudados é o mercado de ações americano, onde, como se vê, o apetite do investidor segue bastante aquecido.
Compass, braço de gás e energia da Cosan, e Votorantim Cimentos aguardam há alguns anos o melhor momento para abrir o capital no Brasil e são vistas por especialistas consultados pelo InvestNews como duas fortes candidatas à listagem nos Estados Unidos. A Votorantim Cimentos nega que esteja se preparando para fazer o IPO na bolsa dos EUA, mas fontes ligadas a bancos de investimentos afirmam que a companhia monitora o mercado com atenção.
As duas atendem ao principal critério para a listagem nos Estados Unidos: tamanho. É que, no mercado americano, as ofertas costumam ser maiores do que no Brasil. Este ano, o volume médio das ofertas foi de US$ 380 milhões, o equivalente a R$ 1,2 bilhão. Ou seja, a empresa precisa ter um valor de mercado bem mais alto do que isso para chegar lá. Até porque, fazer uma oferta de ações em uma bolsa dos Estados Unidos é mais caro. E o chamado liability – exigências regulatórias – é mais rigoroso do que no Brasil.
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Porte para isso, tanto Votorantim Cimentos quanto Compass têm. A questão, dizem especialistas, é que as duas empresas são consideradas as “joias da coroa” de seus conglomerados.
Isso significa que seus controladores serão muito exigentes em relação ao preço – ou valuation – para a venda dessas ações. Por isso, os controladores tendem a ser muito rigorosos na decisão: só irão a mercado quando tiverem certeza de ter encontrado o melhor momento. Especialmente no caso da Compass, da Cosan de Rubens Ometto, depois de o IPO (nos EUA) de outra empresa do grupo, a Moove, de lubrificantes, ter fracassado no início do mês passado.
A Compass tem um incentivo adicional para fazer o movimento em direção ao mercado acionário americano. Depois de alguns meses tentando, sem sucesso, fazer um IPO na B3, a companhia optou em setembro por uma operação privada de venda de participação no capital para um grupo liderado pelo Bradesco Seguros. Foi possível levantar R$ 1,44 bilhão – a empresa já havia feito uma outra operação privada de R$ 810 milhões em maio deste ano.
A entrada de R$ 2,25 bilhões deu fôlego à empresa de energia da Cosan. Mas as duas operações têm prazo determinado e, em algum momento, será preciso dar saída para os investidores.
Apetite americano
O que especialistas dizem é que, neste momento no mercado americano, há apetite por empresas vindas de outras praças, mesmo que elas não tenham receita em moeda forte. “Existe uma demanda grande por small caps [empresas de menor valor de mercado], de diferentes setores, não apenas de tecnologia”, afirma Ricardo Lacerda, CEO do BR Partners.
Até aqui, as empresas brasileiras que se lançaram no mercado americano tinham como característica comum terem um forte apelo para o investidor do setor de tecnologia – caso da Embraer ou do Nubank, por exemplo – ou então terem atividade globalizada – caso da Gerdau. “Agora, o que a gente vê é uma janela muito boa para empresas do setor industrial, mesmo as que não têm operação direta relevante no mercado americano”, diz Teodora Barone, head de equity capital markets do UBS BB.
Ainda que haja muitos argumentos a favor, ser aquela empresa a colocar o pé na água para testar a temperatura do mercado é sempre mais desafiador. Foi o que a Moove, empresa da Cosan, tentou fazer. Mas especialistas afirmam que a experiência negativa da fabricante de lubrificantes teve mais a ver com uma estratégia errada na definição do preço do ativo do que com as condições de mercado. E defendem que existe espaço para que alguma delas faça esse movimento.
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Enquanto isso, outros caminhos têm sido adotados. Depois de contratar bancos em janeiro para fazer seu IPO, a Oceânica, empresa que oferece soluções para exploração submarina de óleo e gás, estreou no mercado de bonds e emitiu em agosto US$ 375 milhões em títulos de dívida com prazo de cinco anos no mercado internacional. Com o IPO, a companhia pretendia captar R$ 1 bilhão.
Já a BRK Ambiental, outra candidata a uma oferta primária de ações, colocou alguns ativos à venda, entre elas algumas concessões no Estado de São Paulo e em Cachoeiro (ES). (Colaborou Raquel Balarin)
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