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Noronha quer mudar o Bradesco com negócios mais seguros; investidores veem com ceticismo

As ações preferenciais do Bradesco caíram 19% este ano, mais do que a queda de 4,5% do Ibovespa

Marcelo NoronhaFotógrafo: Victor J. Blue/Bloomberg

Após um ano como presidente do segundo maior banco do Brasil, Marcelo Noronha diz que está reestruturando o Bradesco com mais do que apenas lucros em mente.

“A gente está mexendo muitas coisas de uma vez só, e não é apenas para aumentar a rentabilidade”, disse Noronha em entrevista na sede da Bloomberg em Nova York. No topo da lista: tornar o banco mais competitivo em meio ao aumento nos juros brasileiros e a uma maior competição das fintechs. 

Noronha, 59 anos, assumiu o cargo logo após as taxas de inadimplência e as despesas com provisões para perdas com empréstimos do Bradesco atingirem o pico em 2022 e 2023. Os maiores bancos e fintechs do Brasil expandiram enormemente sua oferta de cartão de crédito durante a pandemia e logo depois passaram a lutar contra os atrasos nos pagamentos. Para piorar, empresas grandes entraram com pedido de recuperação judicial, com a varejista Americanas e a concessionária de energia Light liderando o grupo no ano passado.

Noronha começou reduzindo as fragilidades na carteira de crédito do Bradesco, fazendo mudanças grandes na alta cúpula e fechando cerca de 1.000 agências. Os resultados do terceiro trimestre mostraram os sinais positivos da transformação: o lucro líquido recorrente aumentou 13%, para R$ 5,23 bilhões, em relação ao mesmo período do ano anterior, superando as estimativas dos analistas.

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E o retorno médio do banco sobre o capital, um indicador da rentabilidade, subiu para 12,4% no trimestre, face aos 11,3% do ano anterior. Mas ele ainda fica atrás de concorrentes como o Itaú, com 22,7%, e o BTG Pactual, com 23,5%.

“Um período prolongado de retorno do capital abaixo do custo do capital – que tem aumentado no Brasil – continuará a ser razão para resistência dos investidores”, disseram analistas do JPMorgan. Mesmo assim, disseram, “reconhecemos o valor da franquia do Bradesco”.

Os acionistas também ainda não estão especialmente animados. As ações preferenciais do Bradesco – o segundo maior banco do país em valor de mercado que não pertence ao governo – caíram 19% este ano, mais do que a queda de 4,5% do índice de ações de referência do Brasil, o Ibovespa, e do que o avanço de 1,9% do Itaú.

Noronha, que ingressou no Bradesco em 2003, foi escolhido para ser presidente com o objetivo de mudar o rumo do banco. Ele já havia sido responsável por vários dos muitos negócios do Bradesco, incluindo varejo, atacado e cartões de crédito. Antes de ingressar no Bradesco, sediado em Osasco, Noronha foi executivo da unidade local do espanhol Banco Bilbao Vizcaya Argentaria que o Bradesco comprou em 2003.

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Essas experiências serão úteis agora, pois os desafios voltaram a crescer. Espera-se que o Banco Central do Brasil continue a aumentar as taxas de juros, forçando os bancos locais a adotar uma postura mais cuidadosa para evitar uma nova onda de empréstimos inadimplentes. Isso significa uma expansão mais modesta das suas carteiras de crédito e uma ênfase em clientes de menor risco, como os mais ricos, e em segmentos mais seguros, como empréstimos consignados ou crédito a pequenas empresas com garantias do governo. 

Mas a concorrência por esses clientes é feroz e os prêmios de risco de crédito são menores, reduzindo a rentabilidade.

“A gente continua trabalhando com uma expansão de 9% em nossa carteira de crédito, mas temos um portfólio muito mais seguro, que nos dá tranquilidade para desacelerar um pouco o ritmo de crescimento em um cenário de maior estresse”, disse Noronha. 

A margem financeira do Bradesco caiu para 8,4% no último trimestre, de 9,1% no terceiro trimestre de 2023, e foi “a maior frustração nos resultados do Bradesco no terceiro trimestre”, segundo Pedro Leduc, analista do Itaú BBA.

“Não tem data, dia ou hora” para que o retorno sobre o capital do Bradesco ultrapasse novamente o seu custo de capital, disse Noronha, mas os investidores devem esperar uma melhoria no quarto trimestre e nos trimestres subsequentes. 

“Estamos trabalhando para entregar ROEs cada vez melhores”, disse ele. “Estamos crescendo, mas temos os pés no chão.”

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As despesas aumentaram devido ao fechamento de agências, à necessidade de contratar talentos mais especializados e a maiores investimentos em tecnologia – incluindo em inteligência artificial. Mas os gastos deverão ajudar a aumentar a competitividade do banco no longo prazo, segundo Noronha.

O Bradesco também gastou ao criar uma joint venture com a unidade da Deere & Co. no Brasil, o Banco John Deere, para expandir no agronegócio. E o banco concluiu a aquisição das ações em bolsa da empresa de cartão de crédito Cielo junto com seu sócio, o Banco do Brasil. Essas duas transações deverão ajudar a aumentar a lucratividade do Bradesco no futuro, disse Noronha. 

Eduardo Rosman, analista do BTG Pactual, elogiou a margem financeira pós-provisões do Bradesco no terceiro trimestre, que foi melhor que a esperada. Mas o desafio maior para o crescimento da margem financeira dada a Selic mais elevada e o estreitamento dos prêmios de de crédito “podem desapontar aqueles que esperam uma recuperação mais rápida do ROE”, disse ele.

Noronha não tem pressa.

“A gente não mudou nosso ritmo”, disse ele. “Temos um plano e vamos segui-lo: será passo a passo.”

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