Em meio à crise após o anúncio de “inconsistências contábeis” de R$ 20 bilhões, a  Americanas (AMER3) divulgou em fato relevante nesta quinta-feira (19) que entrou com pedido de recuperação judicial. Caso seja aprovado, analistas apontam algumas de quais devem ser as implicações para a companhia, além de possíveis impactos nas ações da varejista.

“A despeito dos esforços e das medidas que a administração vem tomando nos últimos dias, em conjunto com seus assessores financeiros e legais, para proteger a companhia dos efeitos decorrentes da descoberta de financiamentos de compras da dimensão de R$20 bilhões não adequadamente refletidos nas demonstrações financeiras de 30/09/2022, os membros do conselho de administração da companhia deliberaram, por unanimidade, aprovar, em caráter de urgência, a apresentação do pedido de recuperação judicial da companhia”, informou a varejista em fato relevante.

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Caso o pedido de recuperação judicial seja aprovado, analistas da XP apontaram alguns caminhos a serem seguidos pela varejista:

O que pode acontecer com a ação da Americanas?

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Americanas. Crédito: Adobe Stock

De acordo com o analista da Nord Research, Bruce Barbosa, se a Americanas entrar em recuperação judicial é preciso entender qual seria a diluição dos acionistas no processo para entender o valor das ações da varejista. 

“Em recuperação judicial, AMER3 teria um valor reduzido, apenas centavos, bem abaixo do valor atual, mas ainda teria algum valor”,  disse Barbosa em relatório.

Ricardo Brasil, fundador da Gava Investimentos, explica que, apesar de o papel da varejista deixa de fazer parte dos índices da B3, caso o pedido de recuperação seja aprovado, é importante ter cuidado. Brasil lembra que deixar de fazer parte do índice não significa que o ativo deixa de ser listado em bolsa de valores.

“A negociação continua normal, continua tendo volume. Quem quiser comprar ou vender consegue, tranquilamente, durante a recuperação judicial”, explica o fundador da Gava Investimentos.

Brasil destaca ainda que outra consequência para o papel de Americanas seria a de liquidez, pois o valor negociado por dia tende a cair bastante quando a empresa deixa de fazer parte do Ibovespa, com fundos precisando vender o papel.

“Passando essa fase de crise em que muitos especuladores compram e vendem, vamos ter a empresa com volume bem menor por dia. Quando a ação vale pouco, qualquer centavo faz diferença. Isso não é saudável para o mercado”, diz o fundador da Gava Investimentos.

Em meio a este cenário, a XP Investimentos informou em relatório que mantém  recomendação da ação da Americanas sob revisão.

Outros impactos

Já quando se observa o mercado acionário brasileiro como um todo, Heitor Martins, especialista em renda variável na Nexgen Capital, lembra que como Americanas é uma ação que faz parte do Ibovespa, o índice terá que ser remodelado e, provavelmente se acontecer, a ação permanecerá em preço ainda mais baixo, mudando o cenário de referência para vários fundos de ações e também terá impacto relevante no preço por causa de realocação.

“Como tem alguns ETFs e fundos que replicam o Ibovespa, esses fundos precisam vender até para corresponder a performance exata do Ibovespa, recomprando ações que ficarem no mesmo patamar”, diz Martins.

Outro impacto relevante, segundo o especialista da Nexgen Capital, é na questão do crédito, pois como Americanas tinha bastante crédito emitido, e com valor relevante, fundos de crédito podem sofrer impacto na cota, uma vez que a marcação a mercado desses títulos, com a recuperação judicial, pode ir a zero.

“A depender do tamanho da posição do crédito da Americanas dentro do fundo pode impactar o valor da cota, ou seja, mesmo em um fundo DI de liquidez ele pode sofrer uma variação negativa no mês”, diz Martins.

O especialista recomenda, no entanto, que o investidor que tem esse tipo de fundo e vê uma variação negativa no mês, não precisa fazer resgate, nem entrar em pânico,. Ele defende que as gestoras são responsáveis, têm diligência de risco forte e conseguem fazer o fundo voltar a desempenhar positivamente com entrega da segurança e da liquidez que os investidores precisam.

Relembre o caso

No dia 11 de janeiro, a companhia anunciou inconsistências contábeis da ordem de R$ 20 bilhões, o que resultou na renúncia dos então  CEO e CFO da empresa.

Dois dias depois, credores pediram o vencimento antecipado das dívidas da companhia e notícias indicaram que os acionistas de referência propuseram um aumento de capital de R$ 6 bilhões, enquanto bancos credores exigiram um mínimo de R$ 10 bilhões.

Na mesma data, a companhia conseguiu uma tutela de urgência na justiça, suspendendo por 30 dias o vencimento antecipado das dívidas e quaisquer obrigações.

Posteriormente,  o BTG Pacutal realizou um pedido para derrubar a medida, que foi indeferido pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro.

Em meio aos desdobramentos, a companhia, que teve sua nota de crédito rebaixada por agências de classificação de risco, chegou a anunciar a contratação do Rothschild & Co como seu representante no processo de reestruturação com credores e a nova CFO Camille Faria, uma executiva com experiência em processos de recuperação judicial,  foi anunciada.

Após uma série de pedidos, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro concedeu ao BTG Pactual uma decisão favorável, para a compensação de R$ 1,2 bilhão do caixa da Americanas depositados no banco. 

De acordo com a XP Investimentos, a decisão pode levar outras instituições onde a companhia mantém seu caixa a fazer o mesmo, impactando a liquidez da varejista, que atualmente está em R$ 800 milhões em caixa.