Desde a eleição, o empreendimento de criptomoedas da família Trump gerou mais riqueza — cerca de US$ 4,5 bilhões — do que qualquer outra parte do império empresarial do presidente.

Um dos principais motivos para o sucesso é a parceria com uma plataforma de negociação, administrada pela Binance, a maior corretora de criptomoedas do mundo, cujo fundador busca o perdão do presidente Trump, segundo pessoas familiarizadas com o assunto.

Essa plataforma de negociação, a PancakeSwap, funciona como uma espécie de incubadora, despertando o interesse de traders que querem usar moedas emitidas pela principal empresa de criptomoedas da família Trump, a World Liberty Financial.

Quanto mais a moeda principal da World Liberty, o USD1, for utilizada, maior será a demanda para aumentar sua circulação e maiores serão os lucros para a World Liberty e seus proprietários, incluindo a família Trump.

A PancakeSwap é um mercado online para criptomoedas. Ele conecta usuários que negociam USD1 com moedas recém-criadas, como Torch of Liberty e Eagles Landing. Essas moedas, com nomes patrióticos, de acordo com seus sites, foram lançadas este ano com o objetivo principal de ajudar a aumentar o uso do USD1.

Traders, que escrevem principalmente em chinês, reúnem-se em grupos no Telegram para discutir a competição por recompensas pagas aos principais usuários de USD1 e anunciadas pela PancakeSwap.

A World Liberty e a PancakeSwap anunciaram sua parceria para impulsionar a adoção do USD1 em junho.

Recompensa

Plataformas de negociação de criptomoedas frequentemente oferecem recompensas ou prêmios para despertar o interesse em novas moedas, de forma semelhante à forma como corretoras oferecem negociações gratuitas ou cassinos dão fichas grátis para novos clientes.

O que não foi divulgado na época é que funcionários da Binance criaram a PancakeSwap, de acordo com pessoas familiarizadas com a empresa.

O fundador e acionista majoritário da Binance, Changpeng Zhao, passou quatro meses preso nos EUA no ano passado, depois que a Binance concordou em pagar uma multa de US$ 4,3 bilhões por se tornar um polo global de lavagem de dinheiro para criminosos, terroristas e sonegadores.

Sua empresa aprofundou seu relacionamento com a World Liberty ao mesmo tempo em que Zhao intensificou os esforços para obter o perdão de Trump.

Zhao — considerado a pessoa mais rica do setor de criptomoedas e com patrimônio superior a US$ 70 bilhões, segundo a Forbes — contratou recentemente Ches McDowell, lobista e amigo de Donald Trump Jr., para pressionar pelo perdão, disse uma pessoa familiarizada com o relacionamento.

Um porta-voz da World Liberty não quis comentar. Porta-vozes da Binance e da PancakeSwap não responderam aos pedidos de comentário do The Wall Street Journal.

Após um artigo de março no The Wall Street Journal, Zhao escreveu no X que “nenhum criminoso negaria um perdão”, ao mesmo tempo em que rejeitou qualquer conexão entre acordos e um perdão.

A secretária de imprensa da Casa Branca, Karoline Leavitt, afirmou que “as tentativas contínuas da imprensa de fabricar conflitos de interesse são irresponsáveis” e que “nem o presidente nem sua família jamais se envolveram, ou jamais se envolverão, em conflitos de interesse”.

O papel da Binance

Trump anunciou o lançamento da World Liberty durante a campanha presidencial do ano passado, publicando nas redes sociais que a empresa planejava “ajudar a tornar os Estados Unidos a capital mundial das criptomoedas”.

A World Liberty lançou o USD1 em março, afirmando que o token auxiliaria a missão de Trump de proteger o status do dólar americano como moeda de reserva mundial.

A Binance desempenhou um papel fundamental desde o início.

O USD1 teve seu primeiro grande avanço quando a Binance aceitou US$ 2 bilhões de um investidor externo pago na moeda World Liberty. O acordo fez com que o valor da criptomoeda em circulação se multiplicasse por 15 e, da noite para o dia, se tornasse uma das maiores do mundo.

O que é o USD1

O USD1 é o que conhecemos como stablecoin, uma moeda digital de invenção privada lastreada em dólares americanos na proporção de 1:1. A World Liberty investe o dinheiro que lastreia a moeda em títulos do governo e fundos do mercado monetário, sem pagar juros aos usuários da moeda.

Com mais de US$ 2 bilhões de USD1 em circulação, a moeda pode render cerca de US$ 80 milhões por ano, com base nas taxas de juros atuais.

A Binance mantém os US$ 2 bilhões em USD1 em sua plataforma, de acordo com dados de blockchain e uma pessoa familiarizada com o assunto.

Quando a stablecoin não é resgatada, isso garante que a World Liberty continue lucrando com o investimento dos dólares que a lastreiam.

Trump e sua família detêm 40% da World Liberty. Embora o valor total da empresa não seja divulgado, grande parte dele é derivada de uma de suas criptomoedas.

A participação da família Trump nessa criptomoeda está estimada em US$ 4,5 bilhões, de acordo com um comunicado publicado na segunda-feira (11).

Negócios com a China

Por meio do relacionamento da World Liberty com a PancakeSwap, cujo site foi registrado em Xangai, e a Binance várias entidades e indivíduos com fortes laços com a China apoiaram os negócios de criptomoedas da família Trump.

Um dos maiores investidores da World Liberty é Justin Sun, o bilionário radicado em Hong Kong.

Isso ocorre mesmo com a Casa Branca promovendo uma guerra comercial contra a China e buscando restringir os laços de empresas americanas com o país devido a temores de segurança nacional. Trump pediu neste mês que o presidente-executivo da Intel renunciasse devido às suas conexões anteriores com a China.

De acordo com uma reportagem anterior do WSJ, a China é o maior mercado da Binance em volume de negociação e permaneceu assim até o final do ano passado.

O país tem sido uma base principal para seus desenvolvedores de software, com centenas de programadores, de acordo com ex-funcionários, registros internos e postagens no LinkedIn.

A Binance, há muito tempo, afirma que não é uma empresa chinesa, dizendo que deixou Xangai logo após seu lançamento em 2017. Zhao, também conhecido como CZ, afirmou que não é mais cidadão chinês e possui cidadania canadense e dos Emirados Árabes Unidos. A empresa, que tem funcionários em todo o mundo, não tem uma sede oficial.

Eric Trump, filho do presidente e cofundador da World Liberty, planeja se encontrar com mais parceiros em potencial em Hong Kong em agosto, durante uma conferência sobre bitcoin, de acordo com pessoas familiarizadas com seus planos.

Nos últimos meses, a World Liberty discutiu a possibilidade de receber um investimento da provedora de serviços de criptomoedas de Hong Kong, HashKey, cujo principal acionista é o conglomerado chinês Wanxiang Group, segundo pessoas familiarizadas com as negociações.

O presidente da Wanxiang faz parte do Congresso Nacional da República Popular da China. Um porta-voz da HashKey afirmou que as discussões com a World Liberty foram exploratórias e que nenhum compromisso foi assumido.

Criando um mercado

Empresas de criptomoedas lançam milhares de novas moedas todos os anos. A maioria prospera. Para atrair seguidores entre os traders, as novas moedas precisam apresentar um grande volume de negociação.

Foi aí que a PancakeSwap entrou em cena. A PancakeSwap não divulga sua propriedade e afirma que é administrada por uma equipe de “chefes” anônimos com uma “predileção por cafés da manhã”. Ela compara a negociação de criptomoedas a “fritar panquecas”.

De acordo com ex-funcionários da Binance, a equipe da empresa criou a PancakeSwap internamente em 2020 porque a corretora queria se firmar na chamada febre das finanças descentralizadas (Defi) das criptomoedas. A plataforma permanece sob a supervisão da Binance, disseram os ex-funcionários.

A plataforma de negociação da PancakeSwap é baseada na rede blockchain da Binance, um tipo de ecossistema de software no qual desenvolvedores criam novos programas.

Desde o final de maio, as negociações de USD1 dispararam na PancakeSwap, saltando de algumas dezenas de milhões de dólares por dia para, regularmente, mais de US$ 1 bilhão.

Mais de 90% das negociações de USD1 ocorreram na PancakeSwap, de acordo com dados da plataforma e do rastreador de dados CoinMarketCap.

A World Liberty se gabou da crescente demanda dos clientes por USD1, afirmando em junho que seus volumes de negociação ultrapassaram brevemente os de outra stablecoin maior.

“Estou muito orgulhoso desta conquista”, tuitou Eric Trump.

A demanda por USD1 não aconteceu porque os clientes o usaram para pagamentos ou para armazenar seus ativos em criptomoedas, que é o propósito típico das stablecoins.

Mas sim porque os investidores em criptomoedas buscavam prêmios de até US$ 1 milhão por gerar o máximo possível de negociações com USD1 como parte de uma “motivação de liquidez”, de acordo com pessoas que participaram da campanha e pesquisadores que monitoram dados de negociação.

“A narrativa principal no ecossistema é que a Binance está apoiando o USD1”, disse Trevor Xu, fundador da empresa de cripto-IA Tagger, sediada em Melbourne, Austrália, que competiu pela recompensa.

A Binance ajudou o USD1 de outras maneiras. Cerca de uma dúzia de tokens que são negociados com o USD1 aderiram recentemente a um programa da Binance chamado Binance Alpha, que promove entre seus usuários um grupo seleto de projetos de tokens em estágio inicial. O Binance Alpha incentiva criptomoedas em destaque a serem negociadas na PancakeSwap, disseram pessoas familiarizadas com o programa.

“Bom trabalho, CZ! O USD1 está tomando conta da Binance”, diz o site Eagles Landing, que exibe uma tirinha de um Trump ensanguentado dando um soco.

Não foi possível descobrir quem está por trás do Eagles Landing. As linhas de código do site Eagles Landing contêm caracteres chineses, e a maioria dos administradores do canal do Telegram fala chinês. Eles não responderam aos pedidos de comentário.

Eagles Landing, Torch of Liberty, Tagger e outro token foram nomeados vencedores do concurso em meados de julho, dividindo a recompensa de US$ 1 milhão. Eles pagaram suas próprias recompensas aos usuários que mais negociaram USD1.

Traduzido do inglês por InvestNews

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