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A produção global de grãos vai bem. Mas as cotações de soja, milho e trigo nem tanto

Preços dos grãos estão em queda livre desde o fim do boom das commodities provocado pela Covid

Por Kirk Maltais The wall street Journal
Publicado em
6 min
traduzido do inglês por investnews

O cinturão agrícola dos Estados Unidos está caminhando para uma safra abundante. Porém, poucos agricultores estão comemorando.

Os preços dos grãos negociados na Bolsa de Chicago (CBOT, em inglês), sob pressão desde o pico do boom das commodities da Covid, caíram ainda mais em 2024. As chuvas foram amplas em toda a região agrícola pela primeira vez em anos, evitando a seca que assolou o centro dos EUA e prometendo recordes nas colheitas de milho e soja do Meio-Oeste. 

Isso está intensificando o que já se configurava como um ano financeiramente sombrio para os agricultores. Os orçamentos elaborados em meados do primeiro semestre já não são viáveis. Os custos persistentemente altos de itens essenciais para o cultivo, como sementes e fertilizantes, estão consumindo a receita.

É um retorno aos tempos anteriores à pandemia, mais magros para muitos agricultores. Os preços do milho e da soja estavam limitados na segunda metade da década de 2010, pesando sobre os retornos agrícolas. Os preços recordes em 2021 e 2022 foram de grande ajuda para os agricultores, mas a situação mais uma vez se voltou contra eles.

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Agora, alguns estão tendo de considerar ações que prefeririam evitar. Uma delas pode ser usar menos fungicidas e fertilizantes — e aceitar mais problemas com pragas e menor rendimento das colheitas. A outra seria atrasar investimentos de capital que aumentariam a produtividade e os lucros ao longo do tempo.

“Do jeito que o mercado está agora, isso está deixando muita gente nervosa”, disse Steve Nightingale, que cultiva 850 hectares de milho e soja no condado de Henry, em Illinois. 

O milho e a soja estão sendo negociados em níveis vistos pela última vez em 2020. O índice de preços ao produtor para o milho, que reflete a variação da quantia recebida pelos produtores domésticos com a venda de sua produção, caiu pela metade desde que atingiu uma alta recente há dois anos, graças em parte à forte produção no Brasil. 

Nightingale está vendendo sobras de safras do ano passado para abrir espaço para o que espera ser uma colheita abundante. Mas em seu silo de grãos local, ele recentemente conseguiu US$ 3,69 por bushel (25,4 kg) pelo milho do ano passado — 14% abaixo dos US$ 4,30 que precisa para atingir o ponto de equilíbrio. 

Ele não está sozinho. O declínio acentuado nos preços dos grãos é a principal razão pela qual os orçamentos elaborados pelos agricultores no início da temporada de plantio da primavera não se aplicam mais agora, pois essa baixa não compensa os maiores gastos na produção. 

O preço dos fertilizantes disparou, chegando a níveis recordes após a guerra Rússia-Ucrânia e um grande aumento no preço do gás natural. Outros custos incluem a contratação de trabalhadores, a compra de sementes e os gastos com combustível. 

“Estamos usando as reservas que temos”, revelou Mat Muirheid, que cultiva 800 hectares de milho e soja no condado de Macon, em Illinois. Muirheid disse que planeja apertar o orçamento para o plantio do próximo ano, limitando os suprimentos que compra e plantando mais soja do que milho, porque ela necessita de menos fertilizante.

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E também vai adiar a compra de novas máquinas. Muirheid disse que continuará a usar sua colheitadeira de 15 anos e sua plantadeira de 20 anos. A Deere & Co, dona da marca John Deere, informou este mês que as vendas de equipamentos no terceiro trimestre em sua divisão de produção e agricultura de precisão caíram 25% em relação ao ano anterior. 

O custo do aluguel de terras para o plantio também aumentou nos últimos anos, tornando-se uma parcela maior das despesas agrícolas. “O aluguel sobe todos os anos há muito tempo”, disse Muirheid.

Em fevereiro, o Departamento de Agricultura dos EUA (USDA, em inglês) previu que a renda agrícola líquida cairia um quarto este ano. Economistas da Universidade de Illinois afirmam que os agricultores do estado provavelmente perderão até US$ 118 por acre (meio hectare) de milho e US$ 81 por acre de soja. A crise pode ser ainda pior se os preços não se recuperarem.

Com certeza, o clima é imprevisível e qualquer grande evento pode redefinir a economia dos agricultores. Qualquer volatilidade geopolítica que afete os EUA ou um grande parceiro comercial como a China — que cada vez mais parece estar se dissociando da dependência das exportações agrícolas dos EUA — pode desencadear um aumento no preço dos grãos.

Além disso, espera-se que a crescente presença do Brasil no mercado agrícola mundial e a produção estável da Rússia mantenham a pressão sobre os preços e sobre os agricultores americanos. 

“Brasil e Rússia estão produzindo grãos a uma taxa maior do que o mundo precisará”, disse Rob Fox, economista-chefe do departamento de pesquisa do credor agrícola CoBank. “O cenário de longo prazo não parece muito bom.”

A crise enfrentada pelos agricultores é irônica, porque poucos viram condições de cultivo tão perfeitas em uma época que está se tornando sinônimo de eventos climáticos extremos e outros desastres.

Observadores do Pro Farmer’s Midwest Crop Tour esta semana também relataram safras de aparência saudável em sete estados — Dakota do Sul, Nebraska, Iowa, Illinois, Minnesota, Indiana e Ohio.

“Estou aqui há 42 anos e nunca tive um ano com uma safra sem estresse”, disse Kim Craig, comerciante da Danvers Farmers Elevator Co. em Deer Creek, em Illinois, que opera silos de grãos em quatro locais na zona rural do estado. 

Escreva para Kirk Maltais em [email protected]

traduzido do inglês por investnews