Apoiadores do presidente Jair Bolsonaro (PL) tentaram invadir a sede da Polícia Federal em Brasília, na noite desta segunda-feira (12), após a prisão pela PF de um líder indígena ligado ao grupo e entraram em confronto com as forças de segurança, que usaram balas de borracha e gás lacrimogêneo para afastar manifestantes armados com bombas caseiras e que atearam fogo a veículos, no maior episódio de violência pós-eleitoral no país.
O confronto teve início com a tentativa de invasão do edifício-sede da PF pelos bolsonaristas depois que José Acácio Serere Xavante foi preso acusado de “envolvimento em protestos antidemocráticos” por ordem do Supremo Tribunal Federal (STF), e se espalhou para outros pontos da região central da capital federal.
Munidos de paus, pedras, fogos de artifício e até mesmo bombas caseiras, manifestantes quebraram vários carros e atearam fogo a pelo menos três deles nas proximidades do prédio da PF. Dois ônibus ficaram em chamas nos arredores, um deles pendurado na beira de um viaduto.
A polícia, que respondeu com bombas de efeito moral, gás lacrimogêneo e tiros de bala de borracha, reforçou o policiamento e isolou as imediações do local do conflito, na região central de Brasília, para controlar a situação.
A tentativa de invasão ao prédio da PF e os confrontos com a polícia ocorreram no dia em que o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva e seu vice, Geraldo Alckmin, foram diplomados pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), última formalidade antes da posse em 1º de janeiro.
O policiamento do hotel onde Lula está hospedado recebeu reforço de equipes táticas e da tropa de choque da Polícia Militar do Distrito Federal, mas o senador eleito Flávio Dino, indicado por Lula como ministro da Justiça do próximo governo, afirmou que “em nenhum momento” Lula foi exposto a qualquer risco.
“O presidente Lula neste momento está em absoluta segurança e assim seguirá ate o momento da posse e até, portanto, o pleno exercício das suas funções”, disse Dino em entrevista coletiva na sede do governo de transição em Brasília.
“Hoje houve a diplomação do presidente Lula. Nós não podemos neste momento achar que há a vitória daqueles que querem o caos. Há infelizmente pessoas desejando o caos antidemocrático, ilegal? Sim, há. Mas essas pessoas não venceram e não vencerão amanhã”, afirmou, acrescentando ter plena confiança nas garantias de segurança do governo do Distrito Federal.
Segundo Dino, o presidente acompanhou todos os fatos à distância e está “absolutamente tranquilo” por confiar no trabalho de sua segurança realizado pelo delegado Andrei Rodrigues, que será o próximo diretor-geral da PF.
Apesar das garantias de Dino, o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), um dos integrantes da equipe de transição de Lula, criticou o que considerou “tamanha tolerância” das forças policiais do DF com os manifestantes e fez um apelo ao governador Ibaneis Rocha para que tome medidas mais duras diante das ameaças “à integridade física de Lula e Alckmin”.
O incidente faz lembrar a invasão do Capitólio dos Estados Unidos em 6 de janeiro de 2021 por apoiadores do ex-presidente dos EUA Donald Trump, e também ressaltou as preocupações de segurança para a posse de Lula.
Bolsonaristas inconformados
A iniciativa dos bolsonaristas de forçar a entrada nas instalações da Polícia Federal ocorreu após tomarem conhecimento da prisão de Serere Xavante por ordem do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).
O tribunal informou, em nota, que a prisão temporária, por 10 dias, foi determinada após pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR) em razão de “indícios de prática dos crimes de ameaça, perseguição e abolição violenta do Estado Democrático de Direito”.
“Segundo a PGR, Serere Xavante vem se utilizando da sua posição de cacique para arregimentar indígenas e não indígenas para cometer crimes, mediante ameaça de agressão e perseguição do presidente eleito e de ministros do STF”, acrescentou a corte.
“Não posso aceitar os criminosos reinar no Brasil. Lula não poder ser diplomado”, disse Serere Xavante em postagem no Twitter no mês passado.
A Polícia Federal confirmou em nota que o mandado de prisão temporária foi cumprido na noite desta segunda e que o preso foi encaminhado à sede da Polícia Federal. “O preso encontra-se acompanhado de advogados e todas as formalidades relativas à prisão estão sendo adotadas nos termos da legislação, resguardando-se a integridade física e moral do detido”, disse.
A PF acrescentou que “distúrbios verificados nas imediações do edifício-sede da Polícia Federal estão sendo contidos com o apoio de outras forças de segurança pública do Distrito Federal.”
O atual ministro da Justiça, Anderson Torres, disse em uma postagem no Twitter que a PF manteve “estreito contato” com as forças de segurança do DF desde o início das manifestações, e acrescentou que a situação estava “normalizando no momento”.
Muitos apoiadores de Bolsonaro ainda inconformados com o resultado das eleições têm se aglomerado em frente a quartéis generais e também se reunido em frente ao Palácio da Alvorada, residência oficial do presidente, em defesa de uma “intervenção federal” –o que seria um golpe militar, já que não há previsão legal para isso– para impedir a posse de Lula.
De acordo com o secretário de Estado de Segurança Pública do DF, Júlio Ferreira, alguns manifestantes que se envolveram nos atos de vandalismo nesta segunda-feira estão acampados em frente ao comando do Exército.
“Quem tiver envolvido em ato de vandalismo, quem tiver cometido crime, será responsabilizado esteja onde estiver”, afirmou o secretário na mesma entrevista coletiva ao lado de Dino. “Não será admitido que continuem atos de vandalismo na cidade”.
Questionado sobre o número de prisões efetuadas nesta segunda-feira, no entanto, o secretário disse que não tinha conhecimento.
Os protestos inicialmente ocorreram com bloqueios de rodovias federais, que, no entanto, foram desfeitos após aplicação de multas e determinação de Moraes, do Supremo, para que as forças de segurança agissem. Alguns confrontos e incidentes violentos chegaram a ser registrados, mas sem maior gravidade.
Bolsonaro, que nunca reconheceu explicitamente a derrota para Lula, apesar de ter autorizado seu governo a realizar a transição, manteve-se praticamente recluso e em silêncio por mais de um mês após as eleições.
Na última sexta-feira, porém, disse em sua primeira aparição a apoiadores após um longo período que o Brasil está numa “encruzilhada”, e que são eles, os bolsonaristas, quem decidem para onde vão as Forças Armadas, instando-os a “fazer a coisa certa”.
Indicado por Lula para ser o futuro ministro da Defesa, José Múcio, disse na sexta-feira em entrevista à Globonews, que, com a aparição aos apoiadores naquele dia, Bolsonaro havia colocado “a digital” no estímulo aos atos antidemocráticos.
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