Adivinhar o futuro da cotação do dólar é o mais conhecido túmulo dos economistas. São tantos os fatores envolvidos que a possibilidade de erro é gigantesca. Mas acertar as previsões do PIB não fica atrás. Todos os anos as expectativas de um começo de ano raramente batem com o final.
Importa para os investidores porque há setores, como o varejo, que são afetados diretamente pelas condições da economia interna. Preços de ações do Magazine Luiza (MGLU3) ou BDRs do Mercado Livre (MELI34), para ficar em dois exemplos, são influenciados pelas expectativas para o PIB. Não vamos sacrificar os economistas. Projeções levam em conta as informações de momento, mas chama atenção quanto podem variar.
Nas últimas semanas, as previsões do mercado chegaram a subir 700%, indo de uma alta 0,2% previstos antes para 1,4% em 2022. Na média, ficaram 500% maiores, com o PIB crescendo um ponto percentual. Mesmo o Fundo Monetário Internacional (FMI), para não ficar só no mercado, tinha elevado de 0,2% para 0,8% a taxa de crescimento. Alta de 300%.
O setor de serviços foi melhor do que o esperado no primeiro trimestre. Dado que, combinado com a liberação do FGTS, que deve injetar R$ 30 bilhões na economia, sustenta a elevação das projeções dos economistas. Todavia, explica uma variação tão grande nas expectativas? É hora de recorrermos ao ganhador do Nobel de Economia e frequentador mais ilustre deste espaço, Daniel Kahneman.
Ao longo de décadas, ele tem demonstrado que tendemos a ser otimistas demais com o futuro. Esta tendência humana a achar que tudo vai dar certo é uma das chaves da Teoria da Perspectiva ou Teoria Prospectiva, que tem como um dos enunciados a constatação de que constantemente confundimos alta probabilidade com certeza.
Humanos, o que certamente inclui economistas encarregados das projeções sobre o PIB, só são capazes até certo ponto de compreender e avaliar probabilidades, segundo Kahneman e Amos Tversky, outro pesquisador brilhante, já falecido, que foi seu colega nos estudos mais importantes.
Tendemos a perceber pequenas probabilidades como se fossem grandes e também o contrário, grandes probabilidades como pequenas. Um exemplo é a falência do banco Lehman Brothers, que causou um terremoto nos mercados financeiros em 2008.
Seis semanas antes da falência do banco, em agosto daquele ano, tanto a posição do Federal Reserve, banco central americano, como a totalidade das previsões no mercado financeiro eram de que a economia dos Estados Unidos estava saudável. Todos garantiam que o pior da crise, que vinha em banho-maria desde 2007, havia passado.
Como é mostrado no filme “A Grande Aposta”, pouquíssimas pessoas no mercado tinham ideia do que realmente estava acontecendo. Com suas equipes formadas por economistas de ponta, os bancos não sabiam mais do que as pessoas comuns sobre a bolha imobiliária. Quando estourou, foram pegos de surpresa, como todo mundo.
Analistas de risco, investidores, economistas e autoridades não eram incapazes. Apenas supervalorizaram a possibilidade de que o desempenho positivo da economia nos anos anteriores voltasse a se repetir, negando os riscos do presente. É o que Vojtěch Zíka e Petr Koblovsky, dois economistas tchecos, chamam de “a maldição do especialista”.
Se estamos acostumados a determinadas tarefas, acabamos não dando a atenção devida a alguns detalhes. Se temos a chance de comparar nossos resultados com o trabalho de outras pessoas, tendemos a seguir a manada, procurando que as diferenças não sejam gritantes. No fim, os acertos são parecidos e se um erra, todos ou quase todos erram juntos.
Para evitar disparidades, os modelos de probabilidades devem incorporar diferentes expectativas e fatores, demonstrando que aquele é apenas um cenário, mas existem outros. Assim, seria possível incorporar às projeções um devido desconto sobre nossas emoções.
*Samy Dana é Ph.D em Business, apresentador do Cafeína/InvestNews no YouTube e comentarista econômico. |
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