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Investimento é igual sabonete: quanto mais você mexe, mais ele encolhe

Excesso de tomada de decisão parece exercer efeitos negativos sobre o desempenho de investimentos.

Peter Lynch administrou o fundo Fidelity Magellan entre os anos de 1977 e 1990. Durante esse período, o Magellan entregou um retorno anual médio de 29% – o que o coloca, sem sombra de dúvidas, entre os melhores fundos de todos os tempos.

É de se imaginar que a maioria dos investidores do Magellan tenha ficado extremamente satisfeitos com o resultado, não é mesmo?

Mas, na verdade, a maioria dos quotistas da história do fundo perdeu dinheiro. E podemos aprender muito com a razão por trás disso.

Como é fácil de imaginar, o desempenho do Magellan não se deu em linha reta. O fundo teve períodos de forte desempenho e, por outro lado, fases de perdas. Consequentemente, investidores que analisassem diferentes janelas de tempo (como, por exemplo, a famigerada performance dos últimos doze meses) viam fotografias bastante distintas de trajetórias recentes da carteira de Lynch.

E, como também é fácil de imaginar, tais desempenhos influenciaram aportes e retiradas do fundo. Aparentemente aquela tática de investir nos fundos com melhor desempenho recente e resgatar recursos dos que estão performando mal não é exatamente uma novidade.

Em resumo: um enorme contingente de investidores perdeu a oportunidade de auferir um dos melhores track records de todos os tempos porque, ao invés de ficarem quietos, tentaram fazer market timing investindo e resgatando.

Era muito melhor não fazer absolutamente nada…

Outra história ronda a Fidelity – que, em outra ocasião, já tomei como verdadeira, mas aparentemente tem autenticidade questionada: supostamente, um levantamento da gestora entre os anos de 2003 e 2013 concluiu que as contas de investimento sob sua gestão com melhores desempenhos pertenciam a clientes mortos ou inativos.

Seja totalmente verdadeira ou não, a história traz um insight interessante: o excesso de tomada de decisão parece exercer efeitos negativos sobre o desempenho de investimentos.

E, paradoxalmente, é justamente o comportamento que grande parte dos pequenos investidores se vê inclinado a adotar: o acompanhamento diário das idas e vindas do mercado, e do noticiário político e econômico; o consumo desenfreado de “informação” (aspas merecidas porque, frequentemente, a qualidade dos conteúdos é francamente duvidosa); a atenção desmedida a rumores, boatos, dicas quentes… tudo parece contribuir justamente para que façamos qualquer coisa – menos ficarmos quietos.

O momento desse artigo não é coincidência: ao longo dos últimos dias, o desempenho da bolsa brasileira vem sendo fortemente impactado por uma piora de percepção a respeito das condições macroeconômicas futuras. Em meio a isso, as cotações têm caído e, a julgar por minhas interações com investidores via redes sociais e consultorias, muitos participantes do mercado têm se sentido impelidos a rever seus investimentos.

Veja bem: reavaliar investimentos é sempre bom. A questão são as motivações e o modo.

Se as quedas recentes abriram oportunidades de trocar posições por outras que se tornaram relativamente mais atrativas, muito provavelmente isso deva ser feito. É oportunidade das boas. Eu próprio tenho olhado para algumas alternativas nesse sentido, mas sempre estabelecendo critérios muito claros para tal.

Por outro lado, se você se sente inclinado a tomar alguma medida pura e simplesmente por conta de um “sentimento” de que não é hora, saiba que você pode simplesmente estar enviesado (a) pelo passado recente; muito provavelmente incorrendo no mesmo tipo de erro que fez com que a maioria dos quotistas de Lynch não obtivesse o mesmo desempenho que o fundo, como um todo, atingiu.

Eu sou um grande entusiasta do estabelecimento de um processo formal de investimento, ao qual você efetivamente se submeta para tomar decisões. Evita, em grande parte, movimentações impensadas e inspiradas pelo calor do momento.

Como ouvi certa vez, uma carteira de investimentos se comporta igual a um sabonete: quanto mais você mexe, mais encolhe. À luz da história do Magellan, a analogia parece fazer bastante sentido.

Até a próxima.

*Ricardo Schweitzer é analista CNPI, consultor CVM e investidor profissional. 
Twitter: @_rschweitzer; Instagram: @ricardoschweitzer

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