O agravamento da crise entre Rússia e Ucrânia nos últimos dias pode elevar o preço das commodities, o que pode beneficiar o mercado brasileiro no curto prazo, mas ao mesmo tempo acende o alerta sobre a inflação.
É o que disseram especialistas ouvidos pelo InvestNews após a Rússia intensificar os ataques contra a Ucrânia. O exército russo lançou mísseis em diversas cidades ucranianas nesta segunda-feira (10), inclusive a capital, Kiev, com os ataques aéreos mais generalizados desde o início da guerra.
O presidente ucraniano, Volodymyr Zelenskiy, disse que pelo menos 12 pessoas morreram e dezenas ficaram feridas. Já o presidente russo, Vladimir Putin, disse que ordenou as ofensivas após um ataque no fim de semana à ponte que liga a Rússia à península anexada da Crimeia, e ameaçou mais ataques no futuro se a Ucrânia atingir o território russo.
Em meio ao aumento das tensões, os preços das commodities agrícolas subiram nesta segunda, em um movimento que foi seguido pelas ações do setor na bolsa de valores brasileira. A ação da SLC Agrícola (SLCE3), por exemplo, subiu 6,1%, a R$ 44,73, enquanto São Martinho (SMTO3) ganhou 5,5%, a R$ 27,67.
Embora esse avanço possa beneficiar as empresas produtoras exportadoras de commodities e, assim, a economia do Brasil de forma geral, especialistas alertam para o risco de a inflação voltar a ganhar força.
“Só nesta segunda-feira, o trigo, por exemplo, subiu mais de 6%. A inflação é medida por vários setores, seja transportes, alimentos, saúde. E os alimentos acabam puxando um pouco mais a nossa inflação. O milho, por exemplo, subiu 2,63% na bolsa de Chicago”, afirma Fabrício Gonçalvez CEO da Box Asset Management, citando dados de segunda-feira.
“Caso o conflito se estenda, podemos ter uma falta de produção dessas commodities, fazendo com que a inflação, especialmente na parte de alimentos, suba de uma maneira bem efetiva e, consequentemente, as outras pontas de inflação que estão tendo deflação, como transportes, saúde, acabem não suprindo a inflação em relação aos nossos alimentos”, continua o especialista.
Além do risco pela via da inflação, especialistas apontam ainda as incertezas trazidas pela própria situação de guerra. “A gente se dá bem por ter que exportar comida, mas guerra é guerra. O mundo foge de risco. Com os juros americanos nesses níveis, vai todo mundo comprar dólar e sentar em juros americanos, que vai ser a coisa mais segura que vai ter”, comenta Fabio Fares, especialista em análise macro da Quantzed.
Outros riscos
Apesar de os riscos de agravamento da situação geopolítica e da inflação estarem no radar, o novo escalonamento no conflito entre Rússia e Ucrânia ainda não chegou a impactar o mercado brasileiro de maneira tão direta, segundo especialistas.
“A gente viu uma escalada, a Rússia bombardeou o dia inteiro praticamente, lugares de civis na Ucrânia, inclusive pegando a embaixada da Alemanha, reunião emergencial do G7, todo esse barulho e o mercado não deu a mínima bola. O meu entender é que o mercado está mais com medo da velocidade da alta de juros global, medo de recessão”, diz Fares.
O que poderia mudar essa percepção, para ele, é a continuidade desse aumento das tensões, “com bombardeios constantes e invasões. Aí o mercado inteiro azeda e vai ficar ruim para todo mundo. O Brasil vai sofrer de tabela”.
Um dos principais receios é que a guerra chegue ao nível nuclear. “Ninguém está colocando no preço ainda o risco de alguma tensão nuclear mais forte. Isso, se acontecer, fica até difícil argumentar muito bem o que pode acontecer. Com certeza deve prejudicar todo mundo”, comenta Gabriel Maksoud, CEO da DOM Investimentos.
No domingo (9), o chanceler alemão, Olaf Scholz, e o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, falaram por telefone e concordaram que as mais recentes ameaças nucleares do governo russo são “irresponsáveis” e disseram que “tal medida teria consequências excepcionalmente sérias”, segundo comunicado do governo alemão.
A preocupação até agora tem sido com a perspectiva de a Rússia implantar uma chamada arma nuclear “tática” – um dispositivo de curto alcance para uso no campo de batalha – em vez das armas “estratégicas” em mísseis de longo alcance que os Estados Unidos e Rússia armazenam desde a Guerra Fria.
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