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Finanças

‘É melhor eu quitar o financiamento do imóvel ou deixar o dinheiro investido?’

Às vezes parece ideal deixar uma fatia maior do seu dinheiro rendendo. Mas essas situações são raras. Vamos às contas

Você pegou um financiamento a 9,5% ao ano, quando os juros estavam mais baixos. Hoje, um fundo que pague 100% do CDI vai render 10,5% por ano. Parece óbvio, então. Melhor usar as suas economias para ganhar 10,5% do que para se livrar de uma dívida de 9,5%. A diferença, o spread, fica na sua mão. É assim, com spread, que os bancos ganham dinheiro. Então porque não a gente? 

Mas não é tão simples. Seu rendimento no CDI vai pagar, no mínimo, 15% de imposto. Nisso, o rendimento de 10,5% cai automaticamente para 9%. E isso se você estiver num fundo de taxa zero (algo que praticamente não existe mais). Num fundo DI relativamente barato, você vai pagar 0,3% ao ano de taxa sobre o montante inteiro (não só sobre o ganho). Isso diminui o rendimento líquido para 8,6% ao ano. 

Além disso, a taxa de juros do financiamento imobiliário não vai ficar só em 9,5%. Nos contratos de financiamento, além da taxa fixa, entra a Taxa Referencial (TR), que no ano passado somou 1,76%. No fim das contas: você pode ter um rendimento de 8,7% ao ano, mas vai pagar para o banco 11,26% ao ano pelo financiamento. Acabou seu spread. Melhor quitar, ou diminuir o seu saldo devedor. E pronto.

Claro: se o juro do seu financiamento imobiliário, colocando em cima os quase 2% de TR, der menos do que 8,7%, vale o contrário. Mas certamente há poucas pessoas nessa situação. 

Outro caso. Você ganha R$ 30 mil, vendeu um apartamento de R$ 1 milhão, tem mais R$ 1 milhão em investimentos e quer comprar um apartamento de R$ 2 milhões.

Vamos lá. Na letra fria da matemática, um investimento seguro, em CDI/Selic, não vai render o tanto que um financiamento imobiliário cobra neste momento. Hoje, os juros mais TR vão dar cerca de 12%.

Você pode dar R$ 1 milhão de entrada, ir pagando o financiamento com o seu salário e colocar o outro milhão na nova Nvidia. Parabéns. Em um ano seu milhão terá se multiplicado por três. Mas, claro, isso não vai acontecer. 

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E vale lembrar que, mesmo se acontecesse, seria temerário. Se você tem uma dívida de R$ 1 milhão com o banco, apostar em renda variável (ou qualquer outra coisa que traga mais risco do que CDI/Selic) equivale a operar alavancado – quando se investe com dinheiro emprestado. “Gosto de ter como referência a taxa Selic. Tudo que possa entregar uma rentabilidade maior do que isso representa riscos adicionais”, diz Luciana Ikedo, planejadora financeira CFP. 

Pela matemática pura, então, o mais rentável seria quitar o apartamento e pronto. Na comparação com o “seu eu alternativo”, que em algum universo paralelo financiou o imóvel, você está ganhando 12% ao ano – 114% do CDI. Não há CDB de liquidez diária que pague isso, ou qualquer outra coisa que dê para chamar de segura. Parabéns, então, para o seu eu deste universo. 

Ou não. 

“Vale a pena quitar, mas só se o pagamento não acabar com a sua liquidez”, diz Silvye Ane Massaini, professora da área de finanças do curso de administração da Faap.

Claro. Sempre vale a pena bater na tecla da reserva de emergência – ter de seis meses a um ano do tanto que você ganha hoje guardados, para tempos de vacas magras. Essa a liquidez necessária para uma vida segura. 

E fechamos aí o exemplo 2. R$ 30 mil X 12 = R$ 360 mil. Vale, então, dar R$ 1,640 milhão de entrada e financiar o resto. (Lembrando do apartamento de R$ 2 milhões que você quer comprar).

Os R$ 360 mil vão ficar rendendo o CDI. Pelos rendimentos que a gente viu lá no começo – isso vai dar R$ 2,6 mil líquidos por mês. Mas não fique tentado a usar tudo para amortizar as parcelas do financiamento. 

Esses R$ 2,6 mil mensais equivalem a 8,6% por ano, certo? Bom, a inflação está ao redor de 4%. Para manter o poder de compra da sua reserva de emergência, você só vai poder tirar 55% disso (R$ 1,4 mil). E conforme a Selic for caindo no longo prazo, essa proporção diminui. É a vida.

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