O ilustrador digital Gabriel Lima desconfiou da abordagem de um cliente que enviou mensagem pelo Instagram. O pedido era de 200 desenhos de girafas, com pequenas diferenças de adereços. Perguntou diretamente sobre o uso das artes e não teve resposta. Insistiu e confirmou sua suspeita: a encomenda era para produção de NFTs.
NFT é a sigla em inglês para “non-fungible tokens” (tokens não fungíveis, em tradução livre). São espécies de certificados que conferem autenticidade a arquivos digitais. Ao tornar uma arte digital em NFT, por exemplo, ela recebe um código capaz de diferenciá-la de reproduções e, assim, torna-se única, passível de venda e revenda.
Desenvolvidos a partir da tecnologia blockchain, os NFTs deram início a um mercado que movimentou cerca de US$ 25 bilhões em 2021, segundo a startup DappRadar. Gabriel Lima relata receber mensagens semanais em busca de encomendas para esse fim. A excepcionalidade deste caso foi o cliente não informar o propósito.
No entanto, não é um caso isolado. No começo de fevereiro, viralizou no Twitter um relato parecido. “Tentaram fazer isso comigo, e também estou vendo acontecer com outros artistas por aqui”, disse a ilustradora.
Porém, será que é legal comercializar como NFT o trabalho de artistas que não foram informados desse uso?
O que diz a lei dos direitos autorais
Doutor em direito autoral e conselheiro do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, Gustavo Martins de Almeida explica que a lei 9610/1998 estabelece que a reprodução de qualquer propriedade intelectual só pode acontecer com autorização prévia e expressa do autor, “salvo raríssimas exceções”.
“Se eu compro um quadro de Di Cavalcanti, da Tarsila do Amaral, da Adriana Varejão, não posso fazer uma gravura deste quadro”, explica Almeida. “Você pode, no máximo, disponibilizar para constar em catálogo de exposição. É um uso tolerável. Ou colocar em um website gratuito seu.”
Segundo o advogado, colocar um certificado de NFT sobre a obra sem autorização infringe a lei de direitos autorais. “Ao agregar àquela obra um código de blockchain e colocar no comércio, o que você está fazendo é reproduzir a obra”, explica.
No caso de Gabriel Lima, suas peças são vendidas exatamente para reprodução em jogos eletrônicos, campanhas publicitárias ou artigos físicos como camisetas e canecas. A solução encontrada foi delimitar em contrato os usos da reprodução.
Lima agora alerta colegas de profissão sobre como identificar pedidos de NFTs. “Eles buscam para criar algumas variações que sejam raras, então são sempre um determinado número de personagens, com pequenas variações, e sem muita especificação estética”, diz.
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