A eleição de Donald Trump trouxe um grande ânimo para o mercado de criptomoedas, em especial o Bitcoin (BTC), que chegou a valer mais de US$ 99 mil, diante da postura pró-cripto do republicano e de diversas promessas feitas em sua campanha que podem favorecer a indústria de moedas digitais.
Desde 5 de novembro, dia da eleição, o Bitcoin saltou mais de 30%, em um movimento que também puxou o resto do mercado. Neste quase um mês, o valor de mercado de todas as criptomoedas juntas saltou 52%, passando de US$ 2,23 trilhões para US$ 3,39 trilhões.
“A vitória de Trump nas eleições sinaliza que estamos no meio de uma possível mudança de paradigma para a próxima fase de crescimento do mercado cripto”, avalia Hong Fang, presidente da exchange OKX.
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Par Fábio Plein, diretor regional para as Américas da Coinbase, o movimento é maior. Não se atém a Trump: “Independentemente de quem acabou como vitorioso, foi um pleito em que os eleitores pró-cripto conseguiram fazer suas vozes serem ouvidas”, avalia. “Ao longo do processo eleitoral, os dois lados tiveram posicionamentos mais favoráveis à indústria do que o governo atual vinha tendo”.
Diante de tudo isso, há quem avalie que o impacto maior pode nem ser tanto no Bitcoin, mas sim nas outras criptomoedas, as chamadas altcoins.
“Qualquer flexibilização regulatória que aconteça para as criptomoedas é mais benéfica para as altcoins do que para o próprio Bitcoin, porque para ele não há empecilhos regulatórios”, disse Alex Thorn, chefe de pesquisa da Galaxy Digital, empresa de serviços financeiros de criptomoedas, para o Wall Street Journal.
Não à toa, uma das criptomoedas que mais tem subido nas últimas semanas é a XRP, token da empresa de pagamentos transfronteiriços Ripple, e que foi uma das que mais sofreu com processos dos reguladores americanos no passado recente. Desde a eleição de Trump, o XRP já subiu 380% (US$ 2,41).
Mudança na SEC
Um dos primeiros – e mais importantes – passos para sustentar a melhora do mercado cripto foi o recente anúncio de Gary Gensler de que irá deixar a presidência da SEC (a CVM americana) em janeiro. Ainda durante a campanha, Trump disse que iria tirar Gensler do posto – apesar de ele não ter poder para fazer isso, sua pressão já deu certo.
Nos últimos anos, a autarquia que regula o mercado de capitais dos EUA processou exchanges e empresas ligadas ao mercado de criptomoedas, como a Binance, a Coinbase e a Kraken – pelo fato de as plataformas negociarem ativos não-regulados pela SEC. Ou seja: focou mais em bater de frente com o mercado cripto do que em buscar acordos.
“A mudança do presidente da SEC já é um ponto positivo, já que ele vinha tendo uma postura muito negativa, que ficou conhecida no mercado por uma abordagem de regulação por litígio em vez de ter uma abordagem de regulação por conversa e por construção”, resume Plein.
As propostas de Trump
Antes da campanha presidencial de 2024, Trump chegou a criticar o Bitcoin e outras criptomoedas, mas foi mudando de ideia e chegou até a lançar coleções de NFTs e um projeto de finanças descentralizadas (DeFi) chamado World Liberty Financial.
Nos últimos meses, o republicano decidiu abraçar o setor como uma arma para conseguir mais eleitores. E isso fez com que ele fizesse diversas propostas, passando desde ter nomes pró-cripto próximos ao governo até tomar medidas que impactam toda a economia, como ter bitcoins nas reservas do país e minerar a moeda digital.
Nem todas elas parecem ter força para avançar no Congresso e realmente se tornarem realidade, mas outras podem realmente ajudar no avanço da indústria, e, consequentemente, sustentar novos ralis de preços.
Confira as principais propostas de Trump para as criptomoedas:
Reserva nacional de Bitcoin: Trump propôs que os EUA pegassem tudo que já apreendeu de Bitcoin em casos de fraudes e golpes e nunca vendesse, criando uma reserva oficial da moeda digital. Até agosto deste ano, o governo americano tinha 213.297 bitcoins (o equivalente a US$ 96 bilhões).
A ideia, inclusive, já levou à apresentação de um projeto no Congresso pela senadora Cynthia Lummis, em que os EUA comprariam 200 mil bitcoins por ano ao longo de cinco anos. O debate sobre reservas de Bitcoin têm crescido ao redor do mundo, inclusive o Brasil já tem uma proposta do tipo no Congresso.
Fato é que não se trata de uma proposta realista, seja para o Brasil, seja para os EUA. Nenhum banco central minimamente relevante jamais cogitou usar o Bitcoin como reserva de valor. O que se discute, e, no caso do Brasil se testa, são as “moedas digitais de banco central” (CBDC, na sigla em inglês). São versões do dinheiro comum que rodam em redes de blockchain, mas seguem emitidas pelos BCs.
Conselho de criptomoedas: O presidente eleito dos EUA também propôs a criação de um conselho voltado para criptomoedas, que ajudaria na criação de propostas e no avanço do setor. Nenhum detalhe sobre o projeto foi dado ainda, mas diversos executivos já estão tentando obter uma vaga, com rumores sobre o envolvimento de pessoas de companhias como Ripple, Kraken, Coinbase e Circle tendo conversado com Trump.
Especialistas consideram essa uma das promessas mais positivas, já que mostra que o setor terá mais espaço para debater avanços da tecnologia.
Mineração de Bitcoin: Após uma reunião durante sua campanha Trump foi às redes sociais para defender que os EUA minerem Bitcoins, exagerando ao nível de dizer que todo BTC do mundo seja minerado no país: “O ódio de Biden pelo Bitcoin só ajuda a China, a Rússia e a Esquerda Comunista Radical. Queremos que todo o Bitcoin restante seja feito nos EUA!” disse ele.
Capital cripto do mundo: Ao divulgar seu projeto World Liberty Financial, Trump afirmou, sem dar nenhum detalhe, que os EUA seriam a “capital cripto do mundo”. “Eles querem sufocar você [dirigindo-se ao mercado cripto]. Eles querem te sufocar e te deixar fora dos negócios. Não vamos deixar isso acontecer”, disse.
O que mais importa não são as propostas
Apesar de tantas propostas e discursos pró-cripto, especialistas defendem que o mais importante é os EUA terem maior clareza regulatória, caminho que passa principalmente pelo fato de o governo estar cercado de pessoas mais favoráveis ao setor a partir de agora. Não só a saída de Gensler da SEC ajuda, mas um Congresso com muito mais parlamentares dispostos a ajudar a indústria.
“É sobre essa clareza regulatória, que é fundamental para empresas”, diz Plein, lembrando que um debate importante dos últimos anos é a falta de definição sobre quais ativos são commodities [caso do Bitcoin, que ganhou esse status por ter um suprimento limitado – a 21 milhões de unidades] e quais são valores mobiliários [caso do Ethereum, que pode ser produzido infinitamente]. Essa indefinição que levou a processos e ao fim de projetos dentro do setor.
O risco para quem aposta agora
Apesar do recente rali e toda euforia dos investidores desde a eleição de Trump, não faltam riscos com a nova administração. E mais do que medidas concretas ou anúncios, o que mais importa para o mercado é uma mudança de postura sobre como as coisas acontecem hoje.
Por mais que os EUA agora tenham um Congresso menos resistente à criptos, nada garante que todas as propostas sobre o tema serão aprovadas. Mesmo que reguladores tenham mais propensão ao debate, seus executivos terão que avaliar riscos e decidir sobre as regras que serão feitas, o que pode demorar e até mesmo nem se realizar.
“O risco seria algumas das expectativas não se concretizarem por algum motivo. Então, independentemente de quem assumir a presidência da SEC, por exemplo, nessa próxima gestão é preciso uma liderança que entenda que os eleitores querem regras claras, justas, e que também incentivem o crescimento do mercado cripto”, diz o executivo da Coinbase.
“O risco, de fato, é ter uma mudança de liderança sem uma mudança de postura”, conclui.
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