O mundo vem batendo recordes de contaminações pela variante ômicron do coronavírus nos últimos dias. No entanto, ao contrário do que aconteceu quando a nova mutação surgiu no final do ano passado, a elevação do contágio não deve fazer preços na bolsa de valores nem no mercado de câmbio – a não ser que a taxa de mortalidade comece a dar sinais de alta também.
O boletim epidemiológico semanal da Organização Mundial da Saúde (OMS) divulgado na sexta-feira (7) mostra que as infecções no mundo pelo coronavírus aumentaram 70% na semana anterior, índice inédito. Ao mesmo tempo, as mortes baixaram 10%.
Especialistas apontam que a avaliação de que a nova variante seja menos letal, embora mais transmissível, é o que está precificado pelo mercado. “A variante ômicron já fez preço no mercado lá em meados de dezembro. Neste momento, com o mercado absorvendo a notícia de que a ômicron é definitivamente bem contagiosa, porém não tão letal, faz com que o mercado se preocupe com outras questões”, diz Fabrício Gonçalvez, CEO da Box Asset Management, citando, por exemplo, as expectativas de aumento nos juros dos Estados Unidos.
Bruno Madruga, Sócio e Head de Renda Variável da Monte Bravo Investimentos, acrescenta que “praticamente tudo referente à ômicron está no preço”, e agora “os mercados estão aguardando o início da divulgação dos resultados do último trimestre, iniciando pelas empresas dos Estados Unidos”.
Embora exista essa percepção de que a ômicron é “menos letal”, a OMS tem alertado que a situação exige cautela. O diretor-geral da organização alertou para o risco de se desvalorizar a nova variante, afirmando que embora ela se mostre menos grave, especialmente entre as pessoas vacinadas, “isso não significa que possa ser classificada como leve”.
Quais os riscos no radar?
Movimentos mais bruscos na bolsa e no câmbio devem acontecer se a situação se desdobrar para um cenário diferente do que o precificado pelo mercado: ou seja, se houver aumento no número de óbitos.
“Se a mortalidade subir significativamente, é possível que o mercado reaja mal porque vai exigir medidas de restrição por parte dos governos para conter o vírus”, comenta Bruno Komura, analista da Ouro Preto Investimentos.
“Aí sim o nosso mercado pode ser extremamente atingido com isso. Por quê? Pode levar a um novo lockdown, fechamento de economias pelo mundo”, concorda Gonçalvez, da Box Asset Management.
Komura acrescenta que “o principal problema é a política de tolerância zero da China para conter qualquer disseminação”. “Parar todas as atividades na China atrapalha ainda mais a cadeia de suprimentos global que ainda não se recuperou”, diz o analista, em referência ao desajuste que causou inflação em diversos países pelo mundo durante a pandemia – incluindo o Brasil.
Luis Nuin, analista da Levante, também comenta esse risco, mas vê um potencial menor de “estrago” na comparação com os anos anteriores. “Eu acho que teremos efeitos mais pontuais em função de, por exemplo, algum problema em cadeias de produção. Se um determinado país resolve fechar para evitar o contágio, isso afeta muita gente. Como as medidas estão sendo tomadas são menos ‘coordenadas’ do que antes (antes, muita gente fechando tudo e hoje, menos gente fechando tudo), acho que teremos efeitos, mas menos pesados”, analisa.
De qualquer maneira, Madruga, da Monte Bravo, afirma que a expectativa do mercado no geral é de que o número de mortes por covid-19 não deve acompanhar a disparada de novos casos da doença. “Se a gente está falando da ômicron há mais de 30 dias e o número de mortalidade não se elevou nesse período, acredita-se que isso não vá acontecer daqui para frente”, afirma.
Mas, nesse sentido, um risco no radar é o avanço da taxa de vacinação pelo mundo. “Pode ter um aumento (da mortalidade)? Sim. Principalmente entre pessoas não vacinadas. E aí a gente está falando mais de outros países do que propriamente o Brasil, que tem um percentual super relevante de vacinados. Agora, se mundo afora aumentar muito forte o número de mortalidade, que não é o que se acredita, aí sim deve afetar o preço das bolsas.”
Os últimos dados da OMS mostram que o avanço da covid-19 tem sido desigual entre os continentes. Na semana retrasada:
Variação do número de casos (%) | Variação do número de mortes | |
América | +100% | -18% |
Europa | +65% | -6% |
Ásia | +78% | -7% |
África | +7% | +22% |
A diferença tem relação com a vacinação. Na África, onde foi detectada inicialmente a variante ômicron, a maioria da população continua sem se vacinar. Enquanto no mundo cerca de 59% da população recebeu ao menos uma dose do imunizante contra a covid-19, no continente africano esse percentual é de 8,8%.
As vacinas contra covid-19 em circulação previnem a doença grave e a morte, mas não evitam totalmente a infecção e transmissão do vírus.