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Finanças

Ouro e bitcoin: máximas históricas reforçam tese de reserva de valor 

Ativo físico e criptoativo têm sim tudo a ver, embora possa parecer estranho; entenda

Ouro e bitcoin têm sim tudo a ver. À primeira vista, pode até parecer estranho. Afinal, enquanto o metal precioso é um ativo físico, que já foi usado como dinheiro na antiguidade e é tido como uma proteção em momentos de tensão geopolítica ou de inflação elevada, a criptomoeda supostamente criada por Satoshi Nakamoto surgiu depois da crise financeira global de 2008 como uma moeda digital descentralizada. 

Mas a semelhança entre os dois ativos existe. A começar pelos níveis recordes neste início de semana. Na segunda-feira (4), o ouro renovou sua máxima histórica de fechamento, com o contrato mais líquido, com entrega para abril, encerrando em US$ 2.126,30 por onça-troy, na divisão de metais da Bolsa Mercantil de Nova York (Nymex). 

No dia seguinte (5), foi a vez do bitcoin (BTC) atingir o maior valor desde sua criação, aos US$ 69,2 mil. Aliás, segundo a Bloomberg, a dobradinha de picos históricos da criptomoeda e do metal precioso foi a primeira já registrada desde que o bitcoin “emergiu das sombras” há mais de uma década.

Ouro (Foto: PublicDomainPictures por Pixabay)
Parece que o ouro recebeu um impulso do bitcoin, na visão de especialistas (Foto: PublicDomainPictures por Pixabay)

“Parece que o ouro recebeu um impulso do bitcoin, que estava se aproximando da sua máxima histórica, alimentado por um clima cada vez mais otimista, que parece estar se espalhando também para o metal precioso, embora o cenário base de cada um seja muito diferente”, observa Carsten Menke, chefe de pesquisa do Julius Baer, em comentário

Na visão de especialistas, ambos os movimentos aconteceram porque tanto o ouro quanto o bitcoin são considerados uma reserva de valor. Isso se dá, basicamente, por causa da escassez. Ou seja, é a quantidade limitada desses recursos no mundo que torna ambos valiosos no mercado financeiro. Por isso, são vistos por investidores como ativos seguros.

“O preço do Bitcoin e do ouro derivam da escassez. Ambos compartilham essa valiosa característica, posicionando-os como ativos de refúgio ideais em períodos de incerteza econômica”

Theodoro Fleury, gestor e diretor de investimentos da QR Asset

O gestor explica que tanto o ouro quanto o bitcoin são um hedge natural para períodos de alta da inflação e também tendem a ter bom desempenho em épocas de recessão. Dados do The Block mostram que no dia em que o ouro atingiu a máxima histórica, a correlação com o bitcoin estava em 0,46. Um dia depois, quando o bitcoin renovou recorde, foi a 0,54.

Nessa escala, uma correlação de 1 significa que há uma correspondência perfeita e positiva entre duas variáveis, refletida no preço tanto do ouro quanto do bitcoin. Já um valor de -1 significaria uma correlação perfeita e negativa. Além do ouro, o mercado também mensura a correlação com os índices S&P 500 e Nasdaq da bolsa de Nova York

De fato, a correlação do Bitcoin com o ouro oscilou muito desde o surgimento do ativo digital, com cada um se movimentando de forma independente. Porém, desde a crise nos mercados em 2020, por causa do início da pandemia, houve uma aproximação. Ao final de 2023, a correlação estava em cerca de 75%, de acordo com a Long Term Trends. 

Tese polêmica

Porém, nem todos concordam com essa tese. Enquanto não há dúvidas de que o ouro é tido como reserva de valor, qualquer movimento do bitcoin é visto como especulação, típico dos ativos de risco. Aliás, a criptomoeda foi destaque de alta em fevereiro, subindo mais de 45% apenas no mês passado. Em 2023, foi líder entre os investimentos, disparando 134%

Para o diretor de câmbio da Ourominas, Mauriciano Cavalcante, não há nenhuma relação entre o ouro e o bitcoin. Já em relação à direção, ele afirma que ambos seguem, normalmente, no mesmo viés de baixa ou de alta, a depender dos fatores globais que os cercam.

“O ouro é um porto seguro do capital investido com a segurança de uma aplicação legal, diferentemente das moedas virtuais, em que não sabemos onde está o dinheiro”

Mauriciano Cavalcante, diretor de câmbio da Ourominas

Segundo ele, o patamar recorde do ouro reflete o ambiente de guerras e conflitos na Europa e no Oriente Médio, além da chance cada vez maior do ex-presidente Donald Trump ser novamente o candidato republicano para as próximas eleições presidenciais dos Estados Unidos. “Isso também provocou a alta do preço do grama de ouro aqui no Brasil”, completa.

Aliás, vale lembrar que a negociação com os contratos do ouro à vista na B3 (OZ1D; OZ2D e OZ3D) acaba em março. Inicialmente, a previsão era de que o ativo deixaria de ser negociado na volta do Carnaval, mas o prazo para encerramento foi adiado para 29/03 pela própria operadora da bolsa.

Levando-se em conta o comportamento do metal precioso negociado no exterior e à corrida dos agentes de custódia para que seus clientes tenham mais tempo para encerrar suas posições em ouro ou retirar as barras físicas, fica a dúvida: será que o ouro vai continuar brilhando em março antes de ser descontinuado?

Investimento em ouro
B3 prorrogou para o fim deste mês as negociações com o ouro à vista. Crédito: hamiltonleen/Pixabay

Para Cavalcante, da Ourominas, tampouco há qualquer relação, com este evento local podendo provocar certo descolamento. “Os negócios na B3 de ouro à vista no Brasil se encerram neste mês de março. Com esse encerramento das atividades à vista, haverá uma maior oferta no mercado interno de balcão, espaço de atuação das DTVMs”, explica.

Ouro digital

Apesar de certa desconfiança, a substituição do ouro pelo bitcoin é uma tese há muito já esperada por entusiastas da moeda digital. Tanto que a criptomoeda é, muitas vezes, chamada de ouro digital. Isso se dá porque o bitcoin tem características de escassez mais fortes até que o ouro.

Para o analista de ativos digitais do Julius Baer, Manuel Villegas, a recuperação do bitcoin neste início de ano já ultrapassa 50%, em meio ao receio quanto ao aperto iminente de oferta da criptomoeda. “O medo de perder começa a aparecer”, afirma, em nota, referindo-se à próxima redução à metade, o chamado halving, previsto para 22 de abril. 

Ao mesmo tempo, o gestor da QR Asset avalia que o bitcoin oferece vantagens únicas, como a divisibilidade, a facilidade de transação, inclusive para transferir o ativo fisicamente. Para ele, são essas características que fazem a criptomoeda ser vista como reserva de valor e se destacar em uma carteira de investimentos.

“Conforme o entendimento sobre a tese do bitcoin avança, pode-se esperar que cada vez mais o comportamento entre ambos seja mais parecido”

Theodoro Fleury, gestor e diretor de investimentos da QR Asset

O especialista lembra que, até recentemente, o ouro vinha prevalecendo como objeto dessa tese de reserva de valor. Porém, desde o lançamento dos fundos negociados em bolsa (ETFs) de bitcoin nos Estados Unidos, em janeiro deste ano, há um fluxo positivo constante, acompanhado de resgates nos ETFs de ouro. “Isso indica que pode estar havendo uma substituição entre os ativos”, pondera.

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