Ter uma fatia dos investimentos exposta ao dólar tem sido uma recomendação cada vez mais frequente dos especialistas. Se no passado era comum ouvir depoimentos de quem já guardou dólares no colchão em momentos turbulentos da economia, hoje há opções mais seguras para investir na moeda americana.
Paloma Brum, analista de Research na Toro Investimentos, explica que a exposição ao dólar serve como uma proteção, justamente por se tratar da moeda dos Estados Unidos, país com alto nível de segurança jurídica e que abriga a maior economia do mundo.
Outra vantagem é que o investimento em ativos dolarizados permite ampliar a diversificação geográfica, ao reduzir a concentração do capital em um único país – o que diminui o risco em relação a um portfólio exposto apenas a ativos brasileiros.
“A exposição à moeda forte traz também um excelente componente de descorrelação para a carteira do investidor, otimizando a relação retorno-risco, já que, historicamente, o dólar costuma se valorizar, enquanto o mercado acionário brasileiro está em queda”, afirma Paloma.
Na prática, a inflação do dólar costuma ser menor do que a inflação do real. Isto significa que, na maior parte dos períodos, o real perde valor mais rápido do que o dólar no decorrer do tempo.
“Por ser a moeda de uma economia emergente, suscetível a um maior grau de instabilidade quando comparada às economias desenvolvidas, o real tende a se depreciar mais rápido do que o dólar. Este descasamento de inflação entre o Brasil e os EUA já nos leva a concluir que o dólar irá subir no longo prazo e, portanto, ao se expor à moeda, há uma melhor proteção do poder de compra do dinheiro”, acrescenta Paloma.
Renda fixa em dólar
Um dos caminhos para ter um patrimônio exposto à moeda norte-americana é o investimento na renda fixa em dólar. Embora o Brasil historicamente seja conhecido por oferecer uma remuneração atrativa aos investidores, isso por ter uma das taxas mais elevadas do mundo (atualmente a Selic está em 13,75%), a especialista da Toro lembra que é possível encontrar boas oportunidades de investimentos no exterior, com a vantagem de ter uma remuneração em dólar.
Além de comprar diretamente os bonds, que são títulos de dívida de empresas e governos, normalmente emitidos em dólar, o investidor pode optar pelo investimento em fundos de renda fixa que compram esses títulos ou ainda por ETFs (Exchange Traded Fund) – fundos de investimentos que têm cotas negociadas em bolsa e que acompanham a performance de algum indicador.
O Investnews conversou com especialistas que deram mais detalhes sobre essas modalidades. Confira abaixo:
Como investir lá fora?
Uma das opções é abrir uma conta em uma corretora internacional. Atualmente, existem corretoras atuantes no Brasil que facilitam o acesso a investimentos nos Estados Unidos.
Em maio do ano passado, a XP anunciou o lançamento de uma conta internacional de investimentos, por meio da XP Internacional, a corretora americana do grupo. Outra corretora que oferece o serviço é a Avenue, fundada em 2018, e que no ano passado teve 35% de sua participação comprada pelo Itaú.
Por meio dessas plataforma, é possível escolher diretamente os ativos. Para isso, é preciso fazer uma transferência do valor em reais que posteriormente é convertido em dólar – na prática, o investidor pode fazer operações como costuma fazer na conta de uma corretora nacional. Os custos também são parecidos – taxa de custódia e corretagem são os principais.
“O objetivo é dar esse acesso e mudar a mentalidade, para que o cliente entenda que não é arriscado investir no exterior, o arriscado é você não investir no exterior e manter o seu investimento 100% concentrado no Brasil”, diz Sabrina Loureira, head de desenvolvimento e aprendizagem da Avenue.
Quanto investir?
Por mais que ter uma parte da carteira dolarizada seja importante, na visão de Paloma Brum, o investidor deve refletir o percentual da carteira faz sentido investir no exterior. “O ideal é que seja um montante do qual ele não deve precisar no mercado local a qualquer momento”.
Segundo a especialista, a exposição ao dólar não é recomendada para investidores conservadores e moderados. Já para balanceados e arrojados, a fatia deve ser de no máximo 7,5%.
Para Jenni Almeida, estrategista financeira e CEO da Invest4U e da Invest4Business, o ideal é a alocação não passe de 10%.
Investimento direto em bonds
Outra opção mencionada por especialistas é o investimento direto em bonds, que são títulos de dívida emitidos, normalmente em dólar, por empresas e por governos. O instrumento é bastante parecido com as debêntures que temos no Brasil (no caso dos títulos privados) e com o Tesouro Direito (dívida pública).
“Devido à aceleração da inflação, que tem forçado os bancos centrais a elevar rapidamente as taxas de juros ao redor do mundo, o investidor pode encontrar opções muito atrativas”, explica Jenni da Invest4U, ao lembrar que os bonds costumam distribuir juros a cada seis meses (os chamados cupons semestrais).
Paloma, da Toro, lembra que atualmente, diante da inflação persistentemente elevada na economia americana, os rendimentos dos títulos de renda fixa dos Estados Unidos estão mais altos, como não se observava há muito tempo.
Na ultima reunião, o banco central dos Estados Unidos (FED) elevou os juros referenciais do país para uma faixa entre 4,25% a 4,5% ao ano. A expectativa majoritária do mercado é por um novo aumento para a faixa de 4,5% a 4,75% ao ano na próxima reunião no inicio de fevereiro.
“Na minha visão, a economia estadunidense está bem próxima do fim do ciclo de alta nos juros que vem sendo implementado desde março de 2022. A proximidade deste pico nos juros nos EUA configura um momento de entrada bastante promissor em títulos públicos federais do governo americano”, avaliou.
Duas estratégias para comprar bonds
Para a especialista da Toro, o investidor pode seguir duas estratégias. A primeira consiste em comprar títulos públicos americanos e mantê-los no longo prazo para receber juros relativamente altos em uma moeda forte e de risco baixo, uma vez que os papéis do governo americano são considerados os mais seguros do mundo.
A outra estratégia é se posicionar neste momento com o foco em aguardar a valorização nos preços dos títulos à medida que as taxas de juros norte-americanas passem a cair.
“Uma vez que se trata de investimentos em títulos prefixados (quando a rentabilidade é previamente informada), quando os juros caem, o valor presente destes títulos sobe, ou seja, ocorre a valorização nos preços, gerando ganhos para os investidores que tiverem se posicionado com antecedência, quando os juros estavam num patamar mais elevado. Vale lembrar que o investidor pode adotar ambos tipos de estratégias dentro no portfólio”.
Entretanto, a operação é custosa. O investidor que opta pela compra direto dos títulos, precisa desembolsar pelo menos US$ 50 mil.
Fundo de renda fixa em dólar: como funciona?
Os fundos de renda fixa americanos compram bonds, que são títulos de renda fixa, normalmente negociados em dólar, e emitidos por empresas brasileiras e estrangeiras. O funcionamento é bem semelhante aos fundos brasileiros.
“O investidor não precisa escolher os ativos, tem um gestor capacitado que vai fazer a seleção dos melhores e comprar”, explica Sabrina Loureiro, da Avenue.
Segundo a especialista, o investidor precisa arcar com uma taxa de administração, que pode variar entre de 0,5 a 2%.
Em contrapartida, não há cobrança da taxa de performance como ocorre no Brasil. E há outra vantagem: por lá, o investidor não precisa se preocupar com o famoso come-cotas, que cobra do investidor tributos sobre os rendimentos a cada 6 meses.
Outra vantagem apontada por Sabrina é o prazo de liquidação. Em caso de pedido de resgate, o investidor embolsa o dinheiro em três dias, enquanto no Brasil o prazo pode chegar a 60 dias.
“O mercado americano tem muito mais liquidez e é muito mais forte e maduro. Os gestores brasileiros não fazem de sacanagem, porque querem ficar com o seu dinheiro por 60 dias. É simplesmente porque, se liquidarem uma posição muito grande, eles derrubam o valor da cota”, alerta.
Para investir em fundos de renda fixa que compram bonds, é necessário um investimento mínimo de US$ 2 mil.
ETFs internacionais
Outro caminho para investir na renda fixa em dólar é por meio de ETFs (Exchange Traded Fund) – fundos de investimentos que têm cotas negociadas em bolsa. A modalidade tem avançado bruscamente nos últimos anos. Em 2022, os fundos de índice atingiram um novo recorde anual com US$ 40 trilhões em volume de negociação, segundo a Bloomberg Finance.
“Diferentemente do fundo que só tem a cota de fechamento e preço no final do dia, nos ETFs o preço é dinâmico, tem liquidez diária e não tem carência para resgate”, explica Sabrina.
Entretanto, vale lembrar que o investidor corre riscos atrelados às oscilações da bolsa de valores.
A especialista da Avenue explica que, no Brasil, os investidores podem comprar ETFs que compram outros ETFs americanos, como o IVVB11, negociado na B3 que replica a performance do S&P500 — o índice americano que reúne as 500 maiores companhias de capital aberto dos EUA. Entretanto, a especialista afirma que não é vantajoso, já que o investidor vai arcar com duas taxas de administração.
“É a mesma coisa que pagar para alguém comprar algo que você poderia comprar diretamente, é uma uma taxa de conveniência. Ao investir em um ETF global é muito mais fácil e rápido. Tem taxa de corretagem e taxa de administração baixas”.
Segundo Sabrina, a taxa de administração para os ETFs varia de 0,03% a 0,95% ao ano e não há valor mínimo para compra das cotas.
Qual é a tributação ao investir no exterior?
O primeiro imposto a pagar ao investir no exterior é o IOF do câmbio. Quando a transferencia do dinheiro que será aplicado é feita para a conta de investimentos (ou seja, para a corretora), a alíquota é de 0,38%.
Além disso, ao vender algum ativo e obter ganho de capital (lucro), o investidor deve pagar uma tributação para a Receita Federal brasileira, que vai de 15% (para quem embolsou até R$ 5 milhões) a 22,5% (acima de R$ 30 milhões).
Entretanto, ao vender até R$ 35 mil em ativos no exterior no mês, o investidor é isento do recolhimento.
Já os dividendos recebidos nos Estados Unidos, como os pagos aos investidores de ações e ETFs, são tributados na fonte com alíquota de 30%. Significa que o valor cai líquido na conta do investidor. “Neste caso, o único dever que o investidor brasileiro tem é comunicar a Receita Federal Brasileira que recebeu dividendos e teve uma retenção na conta de 30%, para não pagar de novo”, alerta Sabrina.
Se o investidor receber cupons, sejam trimestrais ou anuais, referente aos bonds, não há retenção na fonte nos Estados Unidos, mas o cliente deve prestar contas à Receita Federal do Brasil e arcar com uma alíquota que vai 15% a 22,5%, se necessário.
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