Depois de a Americanas (AMER3) divulgar que foram encontradas “inconsistências contábeis” de R$ 20 bilhões, que resultou no pedido de recuperação judicial da empresa, investidores passaram a ficar receosos com outras companhias que também possuem participação dos acionistas de referência da varejista, que são Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Sicupira. E uma delas é a Ambev (ABEV3). Essas dúvidas dividiram opiniões de analistas.
O trio de bilionários detém participação na AB-Inbev, que é controladora da Ambev. Com isso, o caso da Americanas fez com que fossem geradas incertezas de investidores em relação à fabricante de bebidas, o que chegou a refletir negativamente nas ações da Ambev.
O trio de acionistas se manifestou sobre o caso da Americanas. Eles disseram, em nota ao mercado, que jamais tiveram conhecimento e que nunca admitiriam quaisquer manobras ou dissimulações contábeis na varejista.
Entre as principais preocupações que são apontadas em relação à Ambev estão o risco dos controladores venderem ações da fabricante de bebidas e o risco da Ambev ter o mesmo tipo de problema contábil que a Americanas.
Impactos na Ambev?
Para a Guide Investimentos, os três bilionários possuem diversos ativos e, por isso, vender ações da Ambev não parece ser uma grande necessidade.
A corretora destaca ainda que os resultados da fabricante de bebidas têm sido mais robustos que os da Americanas em diversos critérios, com a Ambev apresentando lucros recorrentes nos últimos anos, o que não ocorria na Americanas.
Outro ponto relevante, segundo a Guide Investimentos, é que o fluxo de caixa operacional da Ambev é elevado e maior que o lucro e o ebtida, e que, normalmente, o fluxo de caixa é mais difícil de se mascarar do que medidas como lucro ou ebtida.
Eles lembram que, no caso da Americanas, e até do IRB Brasil (IRBR3) em 2019, que também passou por problemas contábeis, o fluxo de caixa foi negativo a maior parte do tempo, apesar do ebtida ou lucro serem positivos em alguns momentos.
Para a Guide, apesar de ser um evento de baixa probabilidade, uma possível revisão contábil nos balanços da Ambev poderia ter um impacto muito grande nas ações.
Considerando isto, analistas da corretora recomendam aos investidores ter alguma proteção, particularmente, nos próximos três a seis meses. Além disso, eles também destacam que as contas da Ambev e seus administradores vão ser mais cuidadosamente avaliados nos próximos meses e que, caso haja algo errado, é provável que isto se torne público em breve.
O Credit Suisse também segue na mesma linha, avaliando que as preocupações são injustificadas, pelo fato de a Ambev não ter exposição a operações de financiamento de fornecedores, como acontece com a Americanas.
O banco suíço de investimento destaca também que, ao contrário da Americanas, a Ambev é uma forte geradora de fluxo de caixa livre, com dinâmica robusta de capital de giro. E que, além disso, a fabricante de bebidas vem passando por uma transformação cultural significativa após as mudanças na gestão em 2020, em direção a um ecossistema triplo saudável e sustentável, com foco em consumidor, cliente e fornecedor.
Outro ponto de vista
Já Nord Research avalia o caso de uma maneira um pouco diferente, apontando que o problema da Americanas é muito maior, e que existe a possibilidade de os três controladores – Jorge Paulo Lemann, Alberto Sicupira e Marcel Telles – venderem parte das suas ações para apoiar a reestruturação pela qual a Americanas passará. E que soma-se a isso um consenso de mercado pouco positivo para os resultados da Ambev nos próximos trimestres.
A casa de análise lembra que, no terceiro trimestre de 2022, a Ambev conseguiu uma precificação melhor dos seus produtos, o que ajudou a receita da companhia. E que, por outro lado, os custos das commodities e a inflação continuam pressionando as margens da empresa.
Relembre o caso Americanas
No dia 11 de janeiro, a Americanas anunciou inconsistências contábeis da ordem de R$ 20 bilhões, o que resultou na renúncia dos então CEO e CFO da empresa.
Dois dias depois, credores pediram o vencimento antecipado das dívidas da companhia e notícias indicaram que os acionistas de referência propuseram um aumento de capital de R$ 6 bilhões, enquanto bancos credores exigiram um mínimo de R$ 10 bilhões. Na mesma data, a companhia conseguiu uma tutela de urgência na Justiça, suspendendo por 30 dias o vencimento antecipado das dívidas e quaisquer obrigações.
Posteriormente, o BTG Pacutal realizou um pedido para derrubar a medida, que foi indeferido pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro.
Em meio aos desdobramentos, a companhia teve sua nota de crédito rebaixada por agências de classificação de risco.
No dia 19 de janeiro, a Americanas divulgou um comunicado informando que entrou com o pedido de recuperação judicial, que foi aceito pela Justiça horas depois. A varejista informou uma dívida junto aos credores que soma R$ 43 bilhões.
Após a notícia, a B3 informou que excluiu a varejista de todos os seus índices de referência, incluindo o Ibovespa, principal indicador da bolsa brasileira. Já a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) anunciou a criação de uma força-tarefa com várias superintendências para analisar o caso. O órgão disse que buscava cooperação com a Polícia Federal e o Ministério Público Federal.
O bloqueio de valores a pedido do BTG foi derrubado em decisão judicial dias após o pedido de recuperação judicial ter sido aceito pela Justiça.
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