Na década de 70, voltou a ser de empresários brasileiros. Por meio de fusões e aquisições, transformou-se em um colosso da indústria bélica. Hoje, controlada pela CBC (Companhia Brasileira de Cartuchos), produz mais de 2 mil armas por dia e exporta para mais de 100 países.
Em sua vasta história, enfrentou altos e baixos. Desde 2018 é comandada com pulso firme pelo catarinense Salesio Nuhs, de 65 anos, que assumiu a empresa com objetivo de reorganizar as finanças. Foi exitoso ao trazer a Taurus de volta para a rentabilidade. Mas a companhia, que ganhou uma atenção especial do investidor durante o governo de Jair Bolsonaro, enfrenta hoje um novo desafio: sobreviver frente ao tarifaço de 50% a produtos brasileiros promovido pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump.
Com 77,2% de sua receita atrelada ao mercado americano (frente a 11,4% de faturamento no Brasil), onde há uma cultura voltada à caça e o porte de armas é algo protegido pela Constituição, a fabricante de revólveres correu para ampliar os embarques de peças e produtos feitos em sua unidade fabril de São Leopoldo, no Rio Grande do Sul, no último trimestre. A ideia era se esquivar dos efeitos adicionais do tarifaço, que começaram a valer em agosto. Formou-se então um estoque que deve durar pelos próximos 90 dias.
“Eu tenho estoque para 90 dias nos Estados Unidos. Uma grande parte disso é sem nenhum efeito de taxa, e uma parte menor já está sob efeito de 10%”, afirma o CEO da Taurus. “Estou enviando desde abril para os EUA com 10% de taxa, mas não repassei nenhum preço dentro do trimestre no ponto de venda. Até fiz um aumento a partir de julho de 7% para tentar amenizar o efeito da taxação lá.”
Para reduzir os efeitos do tarifaço, a Taurus antecipou a exportação de carregadores e peças para os EUA e, a partir de setembro, começará a montar parte da sua principal linha de armas, a família G, no país. “Hoje, a minha produção diária para os EUA é 2,1 mil armas aproximadamente. Eu vou continuar montando aqui as 1,2 mil armas e 900 nos EUA. A única coisa que vai sair do Brasil é parte da montagem final”, exemplifica ele.
“Mesmo considerando que isso [o tarifaço] perdure até o final do ano, essa estratégia de montar nos EUA a família G nos garante a entrega de um ano sem prejuízo, dentro desse cenário atual. A gente desenhou uma operação aqui para não fazer prejuízo, garantindo o resultado para a companhia”, complementa.
Efeito dólar
Um efeito perverso desse movimento foi ver o endividamento líquido da companhia crescer exponencialmente (78%) no segundo trimestre deste ano em comparação com igual período de 2024. Nesse sentido, o fluxo de caixa foi impactado no primeiro semestre do ano por um aumento de R$ 76 milhões em contas a receber e um avanço de R$ 73 milhões em custos de estoque. Mas isso não preocupa Nuhs: “O perfil da nossa dívida não mudou. É uma dívida a longo prazo espaçada, o que é bom de ter.”
Para o analista da Eleven Research, Malek Zein, a volatilidade do dólar também impactou o balanço da companhia. “Simplesmente os estoques da empresa aumentaram e a dívida subiu, mas ela geraria lucro mesmo sem a variação cambial.”
Lobby legal
A fim de reduzir os efeitos do imposto inserido por Trump, a Taurus contratou a Ballard Partners, um escritório de advocacy dos Estados Unidos que também presta serviços para outras empresas nacionais, como a Embraer. Por meio da Ballard, a empresa conseguiu uma agenda com a equipe do vice-presidente dos EUA, J.D. Vance.
Em 30 de julho, os EUA anunciaram um conjunto de exceções para os produtos importados pelo Brasil. A lista não reconhecia armas no hall de itens essenciais. O CEO da Taurus, no entanto, acredita que uma nova rodada de exceções será publicada pelo governo americano em breve, levando em consideração os interesses regionais do país.
A empresa mantém diálogo constante com o governador da Geórgia, o republicano Brian Kemp, onde mantém uma fábrica no país. Inaugurada em 2019, o complexo fabril da Geórgia demandou um investimento de US$ 42 milhões – esse montante inclui a concessão de incentivos estaduais. Antes, a operação da empresa no país era na Flórida. Com a transferência de estado, a empresa dobrou sua capacidade de produção, de 400 mil para até 800 mil armas por ano.
“Foi uma ação do governo da Geórgia nos tirar da Flórida. Eles fizeram um investimento na Taurus. Então, eles também não querem perder isso. Nós somos importantes para eles”, afirma o CEO da Taurus. O executivo tem uma reunião marcada com o governador da Geórgia, em 26 de agosto.
No Brasil, Nuhs já se encontrou com pessoas ligadas ao BNDES, o vice-presidente, Geraldo Alckmin; e o ministro da Defesa, José Mucio. Mas tem obtido maior atenção por parte do governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite. “A gente tem créditos de ICMS comprovados, que ele [Leite] já está liberando para a gente”, apontou.
Para o executivo, o nível de imposto dos EUA contra o Brasil misturou uma “questão econômica, política e ideológica”. “Mas eu tenho esperança de que esse tarifaço vai ser melhor olhado”, afirmou ele.