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Briga de petroleiras por um mega acordo de US$ 53 bi na Guiana envolve o legado de três CEOs

Os líderes da Exxon Mobil, Chevron e Hess disputam petróleo descoberto na Guiana

Por Benoît Morenne The wall street Journal
Publicado em
13 min
traduzido do inglês por investnews

Dias depois de fechar a compra da Hess por US$ 53 bilhões, o presidente-executivo da Chevron, Mike Wirth, ligou para seu colega da Exxon Mobil para discutir sua futura parceria em um megaprojeto petrolífero que a Chevron herdaria por meio do acordo. 

Darren Woods disse a Wirth que estava ansioso para colaborar na Guiana, onde a Exxon e a Hess possuem partes dos 11 bilhões de barris de petróleo e gás. A Chevron e a Exxon têm uma parceria de longa data em projetos em todo o mundo, que poderia ser expandida e incluir a costa do país sul-americano coberto de floresta tropical, indicou Woods no telefonema de outubro. 

Semanas depois, a Exxon ligou com uma mensagem totalmente diferente para a Chevron e a Hess: não tão rápido. 

Os executivos da Exxon alegaram que eles e a chinesa CNOOC, uma terceira parceira na Guiana, têm o direito contratual de igualar preventivamente a oferta da Chevron pela participação da Hess na Guiana. Pegas de surpresa, Chevron e Hess discordaram. Ambos os lados estavam irredutíveis e as conversas privadas fracassaram. Em meio a discussões de meses, a Exxon surpreendeu seus rivais novamente ao entrar com um pedido de arbitragem e encerrar as negociações em março. O processo pode afundar o maior negócio da Chevron. 

Baseada na interpretação de vários aspectos de um contrato confidencial, a disputa caiu como uma bomba em Houston, a capital da indústria petrolífera dos EUA, que não via empresas petrolíferas titânicas batalharem assim desde que uma briga judicial com a Pennzoil levou a Texaco à falência na década de 1980. 

O embate entre as duas maiores descendentes do monopólio da Standard Oil de John D. Rockefeller também incluiu alguns dos conselheiros mais influentes de Wall Street, como JPMorgan Chase, Morgan Stanley e Goldman Sachs. 

Agora, as fortunas das três empresas estão entrelaçadas, assim como os legados de Woods, Wirth e John Hess. 

Se a Exxon vencer a arbitragem, a aquisição da Hess pela Chevron seria efetivamente impossível. Para John Hess, isso significaria que sua empresa homônima provavelmente seria muito mais difícil de vender, e coloca em dúvida o que vem por aí para um CEO que estava prestes a completar seu legado com uma transação importante.

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Para Wirth, seria o segundo mega-acordo que perderia nos últimos cinco anos, o que aumentaria a pressão para garantir outro grande negócio de petróleo. Woods, por outro lado, teria a opção de comprar mais do precioso projeto da Guiana, caso Hess esteja disposto a vender.

Recentemente, as perfuradoras correram para garantir suas futuras reservas de petróleo. Muitos campos de petróleo estão se esgotando e novas explorações podem levar décadas para compensarem os investimentos. Wall Street está agora avessa a apostar bilhões em novos campos à medida que os países se afastam dos combustíveis fósseis. Isso tornou o prolífico bloco Stabroek da Guiana um dos mais cobiçados do mundo e uma joia da coroa para a Exxon e a Hess. 

Logo após o anúncio do acordo da Chevron, os advogados da Exxon, acreditando que a empresa tinha direito de preferência que se aplicava à transação, vasculharam todas as linhas do contrato de operação conjunta do projeto da Guiana, que foi escrito décadas atrás — documento visto por poucos.

Acordos de operação conjunta são indispensáveis na indústria do petróleo, onde as empresas muitas vezes se associam em megaprojetos para compartilhar riscos e investimentos. Os contratos geralmente contêm um direito de preferência para os parceiros existentes quando um deles quer vender. A Exxon acredita que o direito é estabelecido pela aquisição corporativa. A Chevron acredita que o direito se aplica apenas a uma venda de ativos.

Em meses de debates, a Exxon expôs uma série de preocupações que a Chevron acreditava que poderia resolver. Ambos os lados pareciam estar trabalhando em direção a uma resolução, embora não esteja claro o que isso implicaria, de acordo com pessoas familiarizadas com as discussões. As negociações terminaram repentinamente em março, quando Neil Chapman, vice-presidente sênior da Exxon, disse à audiência em uma conferência de investidores que sua empresa havia entrado com pedido de arbitragem na Câmara de Comércio Internacional em Paris. A Chevron soube da mudança apenas algumas horas antes, disseram essas pessoas. 

Um cais na Guiana serve como área de preparação para um grande desenvolvimento petrolífero offshore. Foto: Oscar B. Castillo – WSJ

Se o argumento da Exxon prevalecer, as participações da Hess na Guiana — avaliadas em US$ 40 bilhões ou mais, segundo algumas estimativas — se transformariam em uma espécie de poison pill (traduzido: pílula de veneno – um mecanismo que protege os acionistas). Isso não apenas explodiria a fusão com a Chevron, de acordo com os termos de seu acordo com a Hess, mas provavelmente assustaria quaisquer futuros pretendentes — exceto a própria Exxon.  

Woods e Chapman afirmam que seu interesse é preservar a “santidade” dos contratos e seu objetivo é entender como a Chevron avaliou a Guiana — e então decidir quais opções explorar. Woods disse que não está interessado em comprar a Hess definitivamente, mas não descartou comprar a parte da empresa no projeto ou outras opções.

“Temos um recurso muito atraente que, francamente, nos esforçamos muito para desenvolver”, disse Woods em entrevista. “Temos a opção de entender como seria uma possível transação para nós e avaliá-la para nossos acionistas.” 

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A disputa pela Guiana é um golpe para John Hess, que dirige a última grande empresa de petróleo dos EUA controlada por uma única família. O magnata ficou frustrado com o que vê como uma situação altamente incomum, e está perplexo com o que a Exxon quer, de acordo com pessoas familiarizadas com sua opinião.  

Hess e Wirth lideraram pessoalmente as negociações, depois que tiveram a ideia de um acordo Chevron-Hess durante um jantar em meados de 2021. Os dois discordaram sobre o preço na época, mas iniciaram conversas a sério no ano passado. O negócio foi visto como um golpe para a Chevron, pois lhe deu uma parte do ativo mais importante de sua rival Exxon.

Durante anos, a Exxon e a Chevron foram amigas e inimigas. Elas são parceiras em projetos multibilionários em lugares como Cazaquistão e Austrália. Mas as gigantes do petróleo também competiram ferozmente por um grupo cada vez menor de investidores dispostos a estacionar seu dinheiro em empresas de combustíveis fósseis. 

Apesar da competição, Woods e Wirth desfrutam de relações cordiais — ocasionalmente jantando juntos — desde que seus mandatos começaram em 2017 e 2018, respectivamente, dizem pessoas familiarizadas com o assunto.

Aos olhos de muitos investidores, a Exxon há muito tempo ocupa o papel de irmão mais velho da Chevron, com maior produção de petróleo e lucros superiores. Mas a rivalidade mudou em meados da década de 2010, quando os retornos dos acionistas da Chevron em alguns anos começaram a superar os da indústria, incluindo os da Exxon. 

Wall Street creditou a mudança à abordagem consciente de custos de Wirth, alinhada com a pressão dos investidores por austeridade e foco na redução das emissões de carbono. Os investidores favoreceram o movimento de Wirth de desistir de uma oferta pela gigante de xisto Anadarko Petroleum em 2019, depois que a Occidental Petroleum superou a Chevron com uma oferta bem-sucedida de US$ 38 bilhões. A Chevron embolsou uma taxa de quebra de acordo de US$ 1 bilhão.

“A Chevron, sob a liderança de Mike, navegou muito bem em águas bastante tempestuosas, e é inegável que a empresa está melhor hoje do que em 2018″, disse Dan Pickering, diretor de investimentos da Pickering Energy Partners.

Com a ascensão da Chevron, a Exxon sofreu reveses. O plano de Woods de gastar pesado para aumentar a produção afastou investidores. Em 2020, a Chevron ultrapassou a Exxon como a maior petroleira dos EUA em valor de mercado. Em 2021, a Exxon perdeu um desafio para um investidor ativista pouco conhecido, que colocou três diretores no conselho da empresa pressionando-a por um melhor engajamento na transição energética e por cortes gastos. 

Mas, nos últimos anos, a sorte da Exxon melhorou. Ela obteve lucros recordes em 2022 e pagou dividendos recordes aos acionistas no ano passado. Os investimentos anticíclicos de Woods, impopulares entre alguns investidores na época, valeram a pena quando os preços da energia voltaram a subir após a pandemia. Ele ganhou o apoio total de seu conselho para a compra de US$ 60 bilhões da Pioneer Natural Resources, empresa texana de fratura hidráulica, um negócio bem visto em Wall Street. 

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Woods usou o momento para perseguir agressivamente os interesses da Exxon, de acordo com pessoas familiarizadas com o assunto. Embora a Exxon, que emprega um exército de advogados, seja famosa por sua disposição de lutar, o desafio ao acordo da Hess chamou a atenção em Houston.

Embora a disputa arrisque algum golpe reputacional para a Exxon, o destino do negócio acarretará maiores consequências para Wirth do que para Woods, dizem investidores e analistas. 

Wall Street vê o acordo pela Hess como fundamental para garantir as reservas de petróleo e os lucros de longo prazo da Chevron. Investidores e analistas disseram que, se o acordo da Hess fracassar, e a Chevron não adquirir outra grande empresa ou ativo, eles se preocupam que o portfólio de produção de petróleo da empresa possa diminuir nos próximos anos. Ao mesmo tempo, muitas das maiores e mais atraentes empresas foram arrematadas em uma enxurrada de negócios no ano passado.

Os executivos da Chevron tentaram tranquilizar os investidores acenando com muitas outras perspectivas, incluindo a promissora exploração de fronteira na Namíbia, o potencial do gás natural liquefeito no Mediterrâneo Oriental, seu megaprojeto no Cazaquistão e suas operações no Golfo do México e na Bacia do Permiano, no oeste do Texas e Novo México. 

Mas a participação da Hess na Guiana representa a melhor opção da Chevron para crescer aos olhos de muitos. O consórcio da Guiana deve produzir 1,2 milhão de barris por dia até 2027 e continuar bombeando grandes quantidades de petróleo por anos, tendo aprovado mais de US$ 50 bilhões em gastos com projetos até agora. 

“Se eles perderem, acho que será um golpe substancial em sua reputação”, disse Paul Cheng, analista do Scotiabank. 

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Os conselheiros da Chevron e da Hess detectaram o direito de preferência durante diligência prévia do negócio, mas acreditaram que não se aplicaria à transação e acharam improvável que a Exxon a perseguisse, disseram pessoas familiarizadas com o assunto. Os consultores financeiros da Chevron incluíam Morgan Stanley e Evercore, enquanto Paul, Weiss, Rifkind, Wharton e Garrison atuavam como seus consultores jurídicos. Os consultores financeiros da Hess foram Goldman Sachs e JPMorgan Chase.

Os acionistas da Hess devem decidir se aprovam ou não o negócio na terça-feira. Vários investidores disseram que se absteriam de votar devido à rivalidade com a Exxon. 

A venda para a Chevron deveria ser uma despedida real para John Hess, de 70 anos, permitindo-lhe fundir a empresa que assumiu de seu pai, Leon Hess, com a segunda maior empresa de petróleo ocidental. O acordo de fusão prevê que John Hess se junte ao conselho da Chevron, papel que lhe permitiria opinar sobre o futuro da entidade combinada. 

O lendário advogado de Wall Street Martin Lipton, sócio-fundador do escritório de advocacia Wachtell, Lipton, Rosen e Katz, assessorou Hess no negócio. Pouco depois de ser anunciado, ele disse em uma entrevista que John Hess havia concluído que a Chevron era o melhor comprador possível para a empresa de sua família.

“Não se tratou de forçar um acordo”, disse Lipton.

John Hess e sua família possuem uma participação de cerca de 9% na Hess, no valor de cerca de US$ 4,3 bilhões, e o CEO deve lucrar cerca de US$ 50 milhões em dinheiro e ações apenas com a mudança de controle, de acordo com documentos da empresa. 

Com a transação no limbo, a incerteza chegou à força de trabalho, com funcionários da Hess preocupados com o que vem pela frente, de acordo com vários funcionários.

Uma vitória da Exxon na arbitragem essencialmente daria a essa empresa poder de veto sobre para quem a Hess é vendida — ou mesmo se pode ser vendida. Isso significa que a Hess pode ter que continuar operando como uma empresa independente, o que levanta a questão de se John Hess permaneceria no comando — e, se não, quem o sucederia. Antes do acordo com a Chevron, ele não havia indicado um sucessor e estava preparado para permanecer na cadeira de CEO por anos. 

Agravando a irritação de John Hess com a Exxon está sua visão de que a Hess foi fundamental para ajudar a mudar a sorte do projeto da Guiana. 

Sua empresa comprou a participação da Shell lá em 2014, depois que a Exxon e a Shell registraram dezenas de poços sem petróleo. Executivos da Exxon disseram a John Hess que sua empresa era essencial para o sucesso do empreendimento, de acordo com pessoas familiarizadas com o assunto. O CEO sente que seus geólogos desempenharam um papel importante nos esforços de exploração que levaram a uma descoberta prodigiosa. Woods elogiou publicamente o trabalho da Hess na Guiana.

O preço das ações da Hess disparou nos últimos anos, à medida que o petróleo jorrava da descoberta sul-americana. Alguns grandes investidores da Hess estão esperançosos de que a empresa acabe sendo adquirida pela Chevron ou pela Exxon. 

“Se John Hess quiser vender, alguém vai comprá-la”, disse John Levin, fundador da gestora de ativos Levin Capital Strategies e acionista da Hess.

Escreva para Collin Eaton em [email protected] e Benoît Morenne em [email protected]

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