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Economia

Preços subindo: o Brasil pode ter problemas com a inflação no curto prazo?

IPCA em 12 meses já passou do centro da meta do BC; economistas avaliam o cenário.

Supermercado no Rio de Janeiro 10/05/2019 REUTERS/Pilar Olivares

A inflação está ganhando força nos últimos meses. E, em meio ao aumento de preços, a preocupação voltou a ser tema de discussões entre os economistas. Afinal, existe o risco de essa preocupação se tornar um problema já em 2021 e prejudicar a retomada da economia?

Considerado a inflação oficial do país, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) teve em novembro a maior alta do ano, de 0,89%, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). No acumulado em 12 meses, o índice teve alta de 4,31%, acima da meta central da inflação para o ano do Banco Central, que é de 4%.

A inflação vem ganhando força nos últimos meses puxada por fatores como a alta do preço dos alimentos. Há ainda o aumento da demanda interna por conta da elevação da renda no Brasil com o Auxílio Emergencial. Além disso, a alta do dólar também tem seu papel no aumento de preços. Com o real valendo menos, fica mais vantajoso ao produtor de alimentos exportar seus produtos, o que reduz a oferta no mercado interno. Outro ponto é que o dólar alto aumenta o preço de produtos importados ou o custo dos fabricados com insumos de fora. 

Todos esses fatores combinados levantaram a discussão sobre a durabilidade do ciclo de alta de preços, com economistas discutindo se ele é temporário e conjuntural ou se é estrutural e tem força para persistir 2021 adentro. 

O Banco Central tem apontado que o aumento da inflação é significativo, mas temporário. “Apesar da pressão inflacionária mais forte no curto prazo, o Comitê mantém o diagnóstico de que os choques atuais são temporários, mas segue monitorando sua evolução com atenção”, disse o Comitê de Política Monetária (Copom) no comunicado de sua última reunião, em que decidiu manter a Selic, taxa básica de juros da economia, na mínima histórica de 2% ao ano.

Para Alex Agostini, economista-chefe da Austin Rating, o cenário atual de inflação mais alta “não é um problema, e sim uma preocupação”. “Se torna um problema quando passa a ser estrutural. Preocupação é com algo conjuntural”, diferencia. 

João Beck, economista e sócio da BRA Investimentos, também diz que os últimos números do IPCA não são sinais de problema. “A característica transitória da alta dos preços de alimentos e o fato de a Aneel ter antecipado para dezembro o reajuste da bandeira tarifária são fatores que trazem uma perspectiva um pouco mais benigna para a inflação de 2021.”

A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) aprovou a retomada do sistema de bandeiras tarifárias na conta de luz em dezembro. Com isso, as contas vão ficar mais caras ainda no final de 2020, e não no começo de 2021, como se previa. Isso, então, antecipa uma alta de preços que era esperada para o ano que vem, piorando os números de inflação de 2020, mas aliviando o ano seguinte. “Se preços se mantiverem caros porém estáticos e sem crescimento, a inflação é nula”, explica Beck.

Produzir está mais caro, e a conta chegou

Agostini comenta que a alta de preços para o consumidor chegou com atraso em relação aos custos para o produtor, que vêm pressionados há mais tempo. É o que motivou o distanciamento entre o IPCA, que mede apenas a variação de preços para o consumidor final, e o Índice Geral de Preços do Mercado (IGPM), que tem um peso importante dos custos ao produtor em sua composição. 

“De julho para cá, o IPG tem ficado muito acima de 2%. Na média, de julho até novembro, ficou em torno de 3,2% mensal. Isso é um absurdo”, diz Agostini, apontando o aumento da chamada “inflação do atacado” ou “inflação na porta da fábrica”. Essa pressão vem, principalmente, da alta do dólar nos últimos meses. 

“No caso dos IPCs (índices de preços ao consumidor), o aumento é mais recente. (…) Vamos ter uma inflação amarga em 2020, que estava muito bem comportada até agosto”, diz Agostini, comentando que a inflação concentrada no último quadrimestre do ano ocorreu “justamente, em parte, porque houve uma necessidade dos produtores de recuperar parte das margens de produção”.

“Quando aumenta o dólar, em um primeiro momento, não tem repasse (dos custos do produtor ao preço final da mercadoria). O produtor tem estoque que comprou antes, com um dólar mais baixo, e mantém a margem. Num segundo momento, já começou a ter impacto mais forte na inflação, porque foi consumindo os estoques de março, abril. Repassaram fortemente nos IGPs, mas nos IPCs ainda tinha margem para segurar. Em setembro, a gente começou a ver um repasse forte. Demorou, mas chegou. A gente tem uma certa onda de recomposição de margem.”

Perspectivas para 2021

Os economistas apontam que as perspectivas de atividade econômica fraca por causa do fim do auxílio emergencial e do desemprego ainda alto devem reduzir a pressão sobre os preços em 2021. “Não enxergo que essa alta tenha um suporte para se manter”, diz Agostini. “Você não deve ter continuidade no próximo ano da alta de preços no nível deste último quadrimestre. Se tiver, vai ser um mês ou outro.”

Beck também aponta que “existem fatores poderão contribuir para a inflação mais comportada em 2021”. “Continuidade de atividade fraca, taxa de desemprego alta, fim do auxílio emergencial. Há ainda a baixa previsibilidade da pandemia, que deve manter a parcimônia de empresários e consumidores, e alta capacidade ociosa da indústria”, lista ele.

O Boletim Focus, que reúne as previsões do mercado financeiro para a economia e é divulgado pelo Banco Central, prevê que o IPCA termine 2020 em 4,21%, acima do centro da meta do BC, passando para 3,34% em 2021. 

No entanto, apesar das projeções de que a inflação não deva seguir ganhando força em 2021, o problema das contas públicas é um sinal de alerta. Isso porque, se o governo não conseguir apresentar um plano para solucionar o problema fiscal, a desconfiança do mercado pode acabar motivando um novo movimento de subida do dólar em relação ao real – o que poderia ser um fator de impulso para a inflação. 

Todos holofotes devem estar voltados para a questão fiscal. É o governo que ditará os principais temas para a inflação de longo prazo que é contenção de gastos e reforma. Se a sinalização for positiva, o fluxo estrangeiro também será. E ajuda a apreciar o câmbio”, comenta Beck.

“Será que o dólar vai chegar a R$ 4? A chance disso é muito baixa hoje em dia. A gente tem um movimento de valorização do real, mas tem o risco fiscal. O risco fiscal é o freio, e hoje acaba limitando essa valorização”, diz Agostini. 

 O que vai ser dos juros?

As preocupações sobre o aumento da inflação também levantaram dúvidas sobre os rumos da Selic. A taxa básica de juros é um dos instrumentos do BC para controlar a inflação. Se os preços sobem, uma alternativa é elevar os juros para desestimular o consumo, como forma de aliviar a pressão sobre os preços. 

No comunicado da reunião de dezembro, o Copom destacou que, em função do quadro inflacionário, as condições para seu compromisso de não elevar os juros básicos podem em breve não estar mais satisfeitas. O mercado financeiro entendeu como um sinal de que o ciclo de corte de juros parece ter terminado e o BC deixou a porta aberta para subir a Selic nos próximos meses. 

Agostini é um dos que projetam alta de juros. O economista lembra que o centro da meta de inflação do BC vai cair de 4% em 2020 para 3,75% em 2021 e 3,5% em 2022. “Percebe-se que vai afunilando. E isso, obviamente, exige do BC decisões mais cirúrgicas.”

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