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Economia

IGP-M e IPCA: por que os dois índices de inflação se descolaram tanto

Índices se distanciaram em 2020 da mesma maneira em 1999 e em 2002. Veja o que está por trás deste movimento.

A crescente diferença entre dois dos principais índices de inflação do Brasil vem chamando a atenção nos últimos meses. Um deles é o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), e o outro, o Índice Geral de Preços ao Mercado (IGP-M). Nos 9 primeiros meses de 2020, enquanto o primeiro acumulou variação de 1,34%, o segundo teve alta de 13,63%. Além da composição diferente de cada índice, a disparada do dólar sobre o real ajuda a explicar esse descolamento.

A diferença entre os resultados dos dois índices acontece em meio a um movimento de desvalorização da moeda brasileira, diante da pandemia do novo coronavírus e das incertezas sobre as contas públicas. Como a composição do IGP-M conta com indicadores que medem os preços ao consumidor e também ao produtor, a variação cambial acaba pesando mais sobre ele.

Historicamente, houve descolamento entre IPCA e IGPM em outras duas ocasiões: 1999 e 2002. As duas também tiveram relação com a alta do dólar. Em 1999, a moeda norte-americana registrou um salto em relação ao real logo após a taxa de câmbio passar a ser flutuante no Brasil. Já em 2002, a cotação da moeda foi impactada por incertezas eleitorais. Passados os picos, no entanto, os índices de inflação voltaram a se aproximar.

Mas, para 2020, os fatores de incertezas dificultam as previsões de quanto tempo ainda vai durar esse distanciamento, já que as dúvidas sobre a situação fiscal devem permanecer no radar do mercado e seguir impactando a taxa de câmbio. É o que explica André Braz, coordenador do Índice de Preços ao Consumidor (IPC) do Ibre.

“Uma parte desse impacto pode ser até mitigada se houver um equilíbrio das contas públicas, que estão trazendo aumento de incerteza e reflexo na taxa de câmbio. A covid trouxe incerteza para o mundo inteiro. O Brasil já tinha uma economia um pouco mais fragilizada e sofreu uma desvalorização mais intensa do que outras moedas de países com o mesmo porte econômico.”

Qual a diferença entre IPCA e IGP-M?

Enquanto o IPCA mede a variação de preços dos produtos para o consumidor final, nas prateleiras das lojas e supermercados, o IGP-M busca medir a flutuação de custos da atividade econômica – o que inclui os preços aos produtores, ou “o custo na porta da fábrica”.

O IPCA é considerado a inflação oficial do país, e monitorado pelo Banco Central para definir a taxa básica de juros da economia, a Selic. É calculado pelo Instituto Brasileiro de Geografia Estatística (IBGE), e tem o objetivo de medir a variação dos preços de forma geral para as famílias com rendimentos de 1 a 40 salários mínimos, qualquer que seja a fonte, residentes em diferentes áreas urbanas.

Já o IGPM tem o objetivo de medir a variação de preços dos principais setores da atividade econômica do país, levando em conta os cursos para o produtor, consumidor e construção. É medido pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV/IBRE).

Por trás da disparada do IGP-M em 2020

A formação do IGP-M, que é dividido em três componentes, ajuda a explicar o forte avanço recente. Isso porque o maior peso do índice, com 60% de sua composição, é o Índice de Preços ao Produtor Amplo (IPA).

Antes conhecido como a “inflação do atacado”, o IPA é a “variação do preço na porta da fábrica ou do agronegócio”, como explica Braz. “Sem impostos, sem frete, sem nada. Então, é uma inflação ao produtor mesmo”, resume o economista.

Os demais componentes do IGP-M são o Índice de Preços ao Consumidor (IPC), com 30%, e o Índice Nacional de Custo da Construção (INCC), com 10%.

Essa divisão do peso de cada índice sobre o IGP-M considera as contas nacionais, e, neste momento, ajudam a explicar o movimento de alta – já que, com o dólar em alta, o valor de matérias-primas e insumos sobem e pressionam os custos ao produtor.

“Boa parte das commodities, que o IPA leva em conta, como soja, milho, trigo, minério de ferro, cobre, carnes e todas as proteínas, tudo isso sofre influência cambial, direta ou indireta”, acrescenta Braz.

Preocupação para o aluguel

Um dos usos conhecidos do IGP-M é o reajuste de contratos de aluguel de imóveis – motivo pelo qual o índice é frequentemente chamado de “inflação do aluguel”. Por isso, nos últimos meses, sua disparada vem preocupando proprietários de imóveis.

O receio é de que o reajuste pelo IGP-M eleve demais os valores. Tanto que a plataforma imobiliária QuintoAndar iniciou uma força-tarefa para auxiliar inquilinos a negociar com proprietários o valor do aluguel e a própria aplicação do IGP-M. Desde o começo da pandemia, mais de 6 mil proprietários aceitaram negociar mudanças na aplicação do índice para inquilinos, segundo a empresa.

Braz explica que, apesar de ser frequentemente utilizado para reajustes de contratos como os de aluguel, o IGP-M, que existe desde 1989, “não foi criado com essa finalidade”.

“Na maioria das vezes, ele se posicionava acima dos outros índices. Então, naquela expectativa de melhor defender o interesse econômico e financeiro dos proprietários, ele passou a ser muito citado em contratos de aluguel. Era um período ainda de hiperinflação. Então, para proteger a questão dos aluguéis, acabavam escolhendo o índice que o maior reajuste acumulava naquele período”, explica.

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