Investidores estrangeiros estão com alocação acima da média do mercado na dívida do Brasil em moeda local, incapazes de resistir à alta taxa de juros do país, mesmo quando se aproximam de uma eleição profundamente divisiva que provavelmente fará o governo voltar para a esquerda.
Investidores de Neuberger Berman a Aberdeen Asset Management aumentaram a exposição aos títulos locais brasileiros, pois eles oferecem um dos maiores retornos do mundo. Os rendimentos de um ano atualmente estão em 13,23%, representando um retorno de 8,14% acima da previsão de inflação para os próximos 12 meses. E não apenas as taxas estão altas, como a inflação também começou a desacelerar, o que abre caminho para o Banco Central começar a cortar os custos dos empréstimos no próximo ano e elevar os preços dos títulos.
Ao todo, isso é suficiente para superar as preocupações com o aumento dos gastos do governo e a provável guinada para a esquerda, com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva como o firme favorito para ganhar a eleição, possivelmente no primeiro turno, em 2 de outubro. Até mesmo ofusca as preocupações de que o presidente Jair Bolsonaro não respeite o resultado da eleição.
“Você teve essa coincidência de que o pico da inflação ocorreu na época da eleição”, disse Richard Hall, analista de dívida soberana da T. Rowe Price, que tem US$ 13 bilhões em ativos de renda fixa emergente sob gestão. “Se você é um investidor focado em títulos, quer comprar quando eles pararem de subir juros.”
A inflação no Brasil subiu 8,73% em agosto em relação ao ano anterior, após atingir um pico de 12,13% em abril. Isso foi o suficiente para o Banco Central interromper seu ciclo de aperto em setembro, depois de entregar mais de 1.000 pontos-base em aumentos de juros desde março do ano passado.
Tendência regional
O apelo dos títulos brasileiros se destaca em uma região que viu um deslocamento para a esquerda em uma série de eleições nos últimos dois anos. Nos poucos meses que antecederam as votações na Colômbia, Chile e Peru, os ativos locais foram vendidos porque os gestores de recursos temiam que os novos governos minassem a disciplina fiscal.
E embora o real brasileiro tenha reduzido parte do avanço deste ano nos últimos meses em meio à turbulência global, ele continua sendo a principal moeda com o melhor desempenho em relação ao dólar entre 16 pares monitorados pela Bloomberg. Quem tiver coragem de trocar a segurança do dólar pelo real e segurá-lo por um mês está recebendo quase 12,5% de retorno anualizado.
Além de oferecer melhores retornos para os investidores, o Brasil também está se beneficiando do aumento dos preços das commodities e de sua distância da guerra na Ucrânia. O PIB deverá crescer 2,6% em 2022, superando as previsões do início do ano.
“Não é um porto seguro, mas no contexto do que está disponível lá fora ou do que está acontecendo no resto do mundo”, o Brasil parece atraente, disse Gorky Urquieta, gestor da Neuberger Berman, que tem cerca de US$ 25 bilhões em ativos de mercados emergentes sob gestão e está overweight nos títulos locais do Brasil. A resposta imediata do BC foi “mais poderosa do que a incerteza política e o risco que é inevitável quando você tem uma eleição presidencial em um mercado emergente”.
Os rendimentos dos títulos de 10 anos do Brasil em moeda local atingiram um pico seis anos de 13,75% em junho, antes de caírem 171 pontos-base com os primeiros sinais do BC de que o ciclo de aperto estava próximo do fim.
“O Brasil tem se comportado bem e é visto como relativo ‘porto seguro’”, disse Kieran Curtis, diretor de investimentos da Aberdeen em Londres, que está overweight na dívida em moeda local. “Os rendimentos e o momento do ciclo monetário são o que torna esses títulos atraentes.”
Os mercados já estão se posicionando para cortes de juros em 2023, precificando em 280 pontos base em reduções para todo o ano a partir do primeiro trimestre.
“O Brasil tem sido uma de nossas principais preferências”, disse Elina Theodorakopoulou, diretora-executiva da Manulife Investment Management. “A verdade é que o Banco Central agiu de forma decisiva e liderou o ciclo de alta, abrindo caminho não só para a América Latina, mas para os mercados emergentes e desenvolvidos.”
Veja também
- Com a explosão dos juros, títulos IPCA+ tombam até 31% no ano
- O que Trump e Lula têm em comum: a queda de braço com o Banco Central
- Bancos brasileiros batem gringos e solidificam liderança no mercado de crédito privado local
- Banco Central confirma expectativa e sobe Selic para 11,25% ao ano
- Promessas de Trump devem levar Fed a fazer cortes de juros mais brandos