Diferente
do que ocorre na maior parte das ações humanitárias, os recursos doados podiam
ser monitorados em tempo real. Além disso, não havia uma entidade central
gerindo a campanha, os apoiadores se organizaram de forma distribuída, em um
modelo conhecido como Decentralized
Autonomous Organization (DAO).
Neste
artigo, exploraremos o conceito de DAO e alguns exemplos de destaque, apontando
aprendizados que podemos extrair de cada um desses casos.
O
que são as DAOs?
As DAOs são a forma nativa da Web3 de organizarem estruturas sociais, como empresas, ONGs e até governos. Baseadas na tecnologia blockchain, distribuem o poder de decisão entre os seus participantes para alcançar objetivos específicos, permitindo maior inclusão e transparência do que as estruturas tradicionais.
Como não há
autoridades em uma DAO, as decisões são tomadas pelos detentores de um
criptoativo específico: o poder de voto de cada participante depende da
quantidade desses tokens em sua
carteira, o que incentiva os interessados na governança a converter parte da
sua riqueza para esse ativo.
Para
entender melhor como surgem essas organizações e o seu potencial, vejamos
alguns exemplos interessantes.
ConstitutionDAO
Em novembro
de 2021, a famosa Sotheby’s anunciou que leiloaria uma das 13 cópias da
primeira constituição dos EUA. A oferta virou tema de fóruns online, em que um grupo de pessoas
decidiu comprar coletivamente a obra. Em apenas uma semana, os interessados
montaram a ConstitutionDAO e captaram recursos online, tendo juntado impressionantes US$ 47 milhões para concorrer
no leilão.
Apesar de
não ter arrematado a obra, a ConstitutionDAO pode ser considerada um caso de
sucesso: mobilizou um grande número de entidades – mais de 7 mil endereços da
rede Ethereum -, demonstrando como a transparência e a segurança das blockchains podem escalar a cooperação
entre pessoas de diferentes países, mesmo que elas não se conheçam, de forma
rápida e barata.
No mundo da arte e dos colecionadores, em especial, o episódio poderá servir de exemplo para novas estruturas organizacionais e novos modelos de negócios, podendo aumentar a participação de pequenos investidores nesse mercado e impactar diretamente as economias dos produtores e consumidores de arte, dos museus e dos curadores…
UkraineDAO
Com o início dos ataques russos na Ucrânia, em fevereiro de 2022, pessoas e instituições de todo o mundo se articularam para apoiar a população local.
Nesse
contexto, artistas e empreendedores engajados na causa e no ecossistema de DAOs
perceberam que muita gente não sabia a quem doar. Decidiram, então, fundar a
UkraineDAO: um fundo na rede Ethereum que encaminharia recursos para os
ucranianos e para ações humanitárias no país.
Mais uma
vez, a tecnologia blockchain permitiu
celeridade: entre 27 de fevereiro e 2 de março, a iniciativa coletou cerca de
US$ 7 milhões de mais de 3 mil doadores, com todas as entradas e saídas de
recursos sendo monitoradas em tempo real.
A
UkraineDAO demonstrou, além das grandes vantagens técnicas das blockchains, a existência de um grande
grupo de pessoas ao redor do mundo buscando formas confiáveis de cooperar online. Podemos esperar que, em breve,
se desenvolva ainda mais o potencial das DAOs como facilitadoras em iniciativas
sem fins lucrativos, abrindo espaço para mais ações humanitárias e ambientais
em grande escala.
MakerDAO
A MakerDAO
é uma das maiores e mais antigas DAOs em operação. Foi criada ainda em 2015,
durante os primeiros meses de existência do Ethereum, e conseguiu se
estabelecer como um dos pilares do ecossistema de finanças descentralizadas
(DeFi).
Sua função é equilibrar um mercado de crédito em que seus usuários colocam criptoativos como garantia para pegar empréstimos em uma criptomoeda chamada DAI. O sistema é regulado pelos detentores do token MKR, que votam para ajustar a taxa dos empréstimos, regulando, assim, a oferta e demanda por crédito na plataforma.
O longo histórico, a escala e a estabilidade da MakerDAO são impressionantes. A plataforma detém cerca de US$ 15 bilhões em garantias de empréstimos e a sua moeda DAI é usada em negociações que somam mais de US$ 300 milhões por dia, sendo uma das maiores e mais estáveis stablecoins disponíveis no mercado.
A MakerDAO
é um grande exemplo do potencial das DAOs nas finanças. Substitui estruturas
centralizadas, como os bancos que conhecemos, por um modelo participativo e
transparente em que os próprios usuários podem cooperar para manter o sistema
operante. Além disso, demonstra que as DAOs podem se sustentar por períodos
longos, se tornando cada vez mais descentralizadas e eficientes.
Qual é o
futuro das DAOs?
As DAOs são uma experiência recente, mas já contam com uma extensa base para aprendizado a partir do histórico de acertos e fracassos.
Os fundadores de hoje precisam olhar com atenção para as práticas que maximizaram a eficiência e reduziram os riscos das DAOs até aqui, isso tudo para desenvolver sistemas alinhados com os interesses dos usuários. Também será preciso ter criatividade para que os benefícios das DAOs sejam vistos em cada vez mais aplicações, expandindo o impacto positivo da tecnologia blockchain.
Christian Gazzetta é economista formado pela UFRJ e redator da Hashdex, se dedica a aprender e ensinar sobre cripto desde 2017. Estuda métodos de valoração de criptoativos e os setores de DeFi e NFTs. |
As informações desta coluna são de inteira responsabilidade do autor e não do InvestNews e das instituições com as quais ele possui ligação.
Veja também
- Instituições e a Web3: como as empresas estão participando da criptoeconomia?
- Blockchain e o Metaverso: água e óleo ou café com leite?
- DeFi: o ‘Lego’ das finanças descentralizadas
- Como investir no metaverso? Veja 4 formas de faturar com o ambiente virtual
- Entenda a correlação entre os ativos do mercado cripto
- 2021: o ano do investimento institucional em cripto