O sucesso do Brasil no agronegócio pode ser observado na importância que o setor também tem para a economia nacional. De acordo com os últimos dados do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), o PIB do agro cresceu 9,4% em 2021. Com isso, a participação do agronegócio no PIB total do Brasil fica em aproximadamente 28%.
Para dar mais uma ideia da dimensão do setor, as exportações do agronegócio bateram, em 2021, quase US$ 121 bilhões nas vendas externas. Já nas importações, o setor gastou US$ 15,5 bilhões, o que levou a um saldo positivo na balança comercial do agro, com mais de US$ 105 bilhões. Este foi o maior valor da história, de acordo com o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.
Os resultados do agro brasileiro são impressionantes, mas quais são as perspectivas para o setor? Segundo um estudo divulgado pelo Ministério da Agricultura, a produção brasileira de grãos, por exemplo, deve crescer 27% nos próximos 10 anos, alcançando 333 milhões de toneladas.
Por outro lado, há grandes desafios por causa da sensibilidade da demanda e oferta de produtos agro e seus derivados diante de variáveis externas e internas, como econômica, política, naturais e tecnológicas. Dessa maneira, tende a ser mais difícil neste setor, do que em muitos outros, fazer o planejamento estratégico de empresas nas quais a atividade agrícola é predominante. Este é um ponto de atenção importante para quem investe.
Para mencionar algumas dessas variáveis e desafios, podemos falar de adversidades climáticas, como a seca, que trouxe dor de cabeça em várias culturas no agro. No ano passado, as geadas também afetaram as produções de café, cana, hortifrutis, citrus e até a pecuária. Somado a isso, em 2021, os produtores tiveram que lidar com alta nos preços e custos de produção, puxada principalmente pelos insumos e combustível. Houve ainda desafios logísticos com aumento no frete rodoviário e aumento nos custos de transporte.
Como se já não bastassem essas variáveis, 2022 começou com mais desafios no setor, considerando os reflexos do conflito entre Rússia e Ucrânia, países que são grandes exportadores de fertilizantes e trigo.
Esses exemplos mostram a complexidade que está por trás da dinâmica de um dos principais motores da economia brasileira.
A estratégia de empresas de atividades agrícolas na bolsa
Com uma operação mais verticalizada desde o plantio da cana-de-açúcar até a produção de açúcar, etanol e energia pela queima do bagaço da cana, o Grupo São Martinho, um dos destaques do Brasil no setor, reportou perda de produtividade de 11% na safra 21/22, afetada pela estiagem durante o plantio.
Neste caso, a dúvida do mercado é até que ponto os altos preços de etanol e açúcar vão continuar sustentando pioras nos números de produtividade e volume, que mesmo na safra 22/23 podem não se recuperar. De toda forma, a empresa tem uma boa estratégia de comercialização, e apresentou recentemente boa rentabilidade e capacidade de geração de caixa mesmo diante da volatilidade dos preços.
Uma empresa que tem conseguido níveis bons de eficiência é a SLC Agrícola (SLCE3), um dos maiores produtores mundiais de grãos e fibras. Mesmo diante de várias adversidades no mercado, no quarto trimestre de 2021, obteve aumento da receita líquida de quase 12% em relação ao mesmo período do ano anterior. O lucro líquido da SLC atingiu R$ 193 milhões, um aumento de quase 30% em comparação com o ano anterior.
Além de ter conseguido agilizar a colheita de soja e algodão, a companhia também tem sido ágil na fixação de preços e ao fazer toda a compra de insumos necessários no período, protegendo a empresa contra o aumento dos preços dos insumos em virtude de uma série de fatores, incluindo a guerra entre Rússia e Ucrânia. Além disso, a empresa projetou um aumento de quase 50% na área plantada, para próximo de 675 mil hectares ao incorporar alguns negócios.
Ainda assim, os riscos climáticos e volatilidade no preço de commodities relacionadas à produção da SLC são consideráveis.
Quem está aparentemente em um bom momento no setor é a BrasilAgro (AGRO3), empresa tradicional na bolsa, que abriu capital em 2006. Ela atua na produção agrícola, e na compra e venda de terras, ou seja, combina dois modelos de negócios: de produção de commodities e o imobiliário. Isso significa que, de um lado, ela compra terras que não são tão produtivas, mas que têm potencial. Depois, desenvolvem a terra, valorizam e vendem.
Uma vez que a aptidão da BrasilAgro é agregar valor às terras adquiridas, ela tem sido beneficiada pela valorização de suas terras em virtude do cenário favorável para as commodities agrícolas. Ao mesmo tempo, combina estratégias de vendas e de arrendamentos para ter rápidas gerações de caixa. De toda forma, o custo da terra está atrelado à rentabilidade das commodities agrícolas, então, também fica condicionada às variáveis já apresentadas.
As questões urgentes que investidores e executivos precisam responder
Além de considerar os vários aspectos do agro já mencionados, há três grandes questões que o investidor precisa tentar responder.
A primeira é se as empresas mostram práticas de gestão e níveis de eficiência que minimizam os riscos futuros da atividade agrícola e rápidas variações de preços e custos.
A segunda questão é entender quais as vantagens e desvantagens de investir em empresas altamente especializadas e verticalizadas no agro. E em empresas que diversificam seus modelos de negócios? O que tende a ser melhor no curto e no longo prazo?
Por fim, as projeções e planos de crescimento reportados por empresas do agro são compatíveis com acontecimentos nas variáveis do ambiente econômico, político, de clima e tecnológico?
Empresas como a SLC Agrícola tem apresentado uma gestão que permite mitigar os riscos de mudanças rápidas nas receitas e nos custos. Mas a BrasilAgro pode também atrair atenção por trabalhar com dois modelos de negócios complementares. Sobre a São Martinho, entre prós e contras, é altamente verticalizada e focada no mercado de açúcar e etanol.
*Leandro Guissoni é Ph.D., professor de estratégia no Brasil e Estados Unidos, empresário, palestrante e autor de livros, artigos e casos de empresas por Harvard. Assessora grandes empresas em inovação digital e analytics. |
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