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Economia

Caged de fevereiro esquenta debate do Copom sobre o mercado de trabalho

Brasil cria mais vagas que o esperado em fevereiro, um dia após BC chamar a atenção para pressão dos salários

O Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) confirmou números “extraordinários”, como havia antecipado o ministro Rui Costa (Casa Civil), ao mostrar a criação de 306,1 mil vagas com carteira assinada em fevereiro. O número superou a mediana apurada pelo Broadcast, de 232,5 mil, ficando perto do teto das estimativas, e acrescenta ingredientes ao debate que o Banco Central trouxe ontem. 

O Comitê de Política Monetária (Copom) dedicou um parágrafo inteiro da ata para apresentar a discussão na reunião da semana passada em relação ao mercado de trabalho. Em linhas gerais, o colegiado do BC avalia que as pressões salariais podem ter um potencial impacto sobre a inflação de serviços.

Trata-se da medida sobre a variação de preços de itens menos voláteis, como alimentos e combustíveis, e sobre a qual a política monetária tem maior efeito. Por isso, essa medida de inflação é a que o Copom acompanha com mais atenção, pois servem de termômetro para o comportamento dos preços.

Fachada de prédio do Banco Central
Banco Central está atento ao impacto dos salários na inflação de serviços (REUTERS/Adriano Machado)

No entanto, a inflação de serviços pressionada pela maior renda da população e do nível de ocupação dos trabalhadores eleva a incerteza sobre o patamar neutro da taxa básica de juros. Ou seja, com o consumo aquecido, a atividade requer menos estímulos e, portanto, o nível terminal da Selic deve ser mais elevado. 

Aliás, a palavra “incerteza” e suas variações – como “incerto” ou “incertas” – aparece 17 vezes no documento da autoridade monetária divulgado na terça-feira (26). E os dados econômicos conhecidos desde então mostram um cenário doméstico mais nebuloso, fomentando o debate sobre o tamanho dos próximos cortes no juro básico.

Além do Caged, divulgado nesta quarta-feira (27), o IBGE informou ontem que a prévia deste mês do índice oficial de preços ao consumidor (IPCA-15) desacelerou a 0,36%, ante alta de 0,78% em fevereiro. O resultado ficou acima da expectativa do mercado, de 0,32% – e também joga contra a manutenção dos cortes na Selic. 

Serviços e mão de obra

A abertura do dado de inflação mostra uma surpresa altista nos serviços subjacentes (como hotéis e streaming), e intensivos em mão de obra (manicure, encanador…). Cálculos de diversas instituições indicam: enquanto a alta nos serviços subjacentes foi de 5,2% em 12 meses, a de mão de obra intensiva avança 6,40%. 

“Isso confirma o sinal de um mercado de trabalho ainda pujante”, afirma a estrategista de inflação da Warren Investimentos, Andréa Angelo. Ela ressalta que a projeção tanto dos serviços subjacentes quanto dos intensivos em mão de obra para o fim deste ano ronda níveis próximos a 6%, representando uma aceleração em relação a 2023..

“O problema é que ‘o diabo mora nos detalhes e, nesse caso, ‘o detalhe’ atende pelo nome de ‘serviços subjacentes’”, 

Luís Otávio Leal, economista-chefe na G5 Partners

O economista ressalta que esse item mensal desacelerou na base mensal, passando de 0,65% em fevereiro para 0,40% em março. Ainda assim, ficou acima da previsão do mercado, de alta de 0,33%. “Isso não reduz as dúvidas do BC sobre o comportamento desses itens externadas na ata”, diz Leal. 

No documento, o Copom ressalta que “a recorrência de surpresas na inflação de serviços suscita dúvidas sobre a velocidade da desinflação”. Em outras palavras, o que preocupa o BC é que a elevação da renda torne o processo de desinflação mais lento. 

“A inflação de serviços ainda não opera em valores condizentes com os objetivos do BC”, ressalta Luca Mercadante, economista da Rio Bravo. Daí porque a condução da política monetária requer cautela, uma vez que o Copom tem de lidar também com uma economia ainda aquecida, “com dados de atividade resilientes e um forte mercado de trabalho”.

Detalhes favoráveis

No entanto, há quem enxergue um copo meio cheio nessa história toda, completando o copo ‘meio vazio’ do Copom. Apesar de não ver o resultado como um todo do IPCA-15 tão favorável, o analista de estratégia macro da BGC Liquidez, Rafael Costa, enxerga alguns detalhes mais ‘favoráveis’ na composição do indicador.

Entre eles, a deflação nos preços industriais e a média dos núcleos. Todos, segundo Costa, não vieram muito acima do esperado. Na mesma linha, a economista-chefe de Brasil da Galápagos Capital, Tatiana Pinheiro, ressalta que a abertura dos números do IPCA-15 é “bastante benigna”.

Ela chama a atenção para o índice de difusão, que sugere o quanto a alta dos preços está disseminada por diferentes produtos e serviços. Quanto menor o índice, melhor. Em fevereiro, ele estava em 60,49%. Agora, em 54,50%.

“Esta abertura dos dados de inflação contribui para dirimir as dúvidas do Copom com relação à dinâmica de inflação à frente, explicitadas na ata da decisão de março como uma das fontes de incerteza”, afirma Tatiana. 

Bottom Line

É cedo, portanto, para afirmar que a o nível terminal da Selic será mais perto dos dois dígitos do que da última unidade. O que ficou claro, após os dados domésticos desta semana, é que o BC está mais dependente de dados, a começar pelos do mercado de mercado.

São os próximos números que vão determinar se virá um novo corte de meio ponto porcentual (pp) em junho. Porém, não se pode relegar os efeitos defasados da política monetária nem como os principais BCs do mundo – em especial o Federal Reserve – irá gerir a taxa de juros.

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