Moeda local fraca, inflação elevada, limite de compra de dólares, crise econômica e incertezas advindas dos cenários político e econômico fizeram a busca pelo dólar paralelo crescer e bater nível recorde na Argentina no mês passado. Eram necessários mais de 340 pesos para comprar um dólar, bem acima do câmbio oficial, que é de cerca de 130 pesos por dólar.
Caio de Souza, sócio-fundador da Elev Investimentos, explica que, em momentos de economia fraca, o investidor e consumidor tendem a aportar seu capital em uma moeda mais forte.
“Então, houve uma corrida muito grande para a compra de dólar além da limitação imposta pelo governo, fazendo aumentar a procura pelo dólar paralelo. Por isso, essa oscilação e diferença tão grande entre a cotação oficial e a do paralelo”, explica Souza.
O dólar americano é uma referência monetária internacional, reconhecido por sua estabilidade, segurança e liquidez, sendo a principal moeda do mercado cambial. Apesar disso, não deixa de correr o risco de ser negociado de forma não oficial, por meio do chamado dólar paralelo.
Este câmbio informal pode se tornar uma grande “dor de cabeça” para quem compra e para o controle de moedas estrangeiras em uma nação, já que trata-se de uma transação irregular, ou seja, operações de compra e venda são feitas fora do mercado formal.
O que é dólar paralelo ou ‘dólar azul’ na Argentina
O dólar paralelo nada mais é do que a negociação de câmbio de forma extraoficial, ou seja, sem reconhecimento e autorização do Banco Central de um país.
João Victor Patrocinio, especialista Internacional da Blue3 Investimentos, diz que trata-se de um dólar que anda em paralelo à economia oficial, ou seja, que não é contabilizado pelo Banco Central, e, por esse motivo, costuma ser usado sem fiscalização.
Souza, da Elev Investimentos, explica que o dólar, legalmente, tem duas cotações principais: a comercial, usada em transações pelo comércio exterior, e turismo, usada em viagem ou compra de algum item importado, e quem comercializa a moeda é oficializado pelo Banco Central. Do contrário, são casas de câmbios e doleiros não autorizados.
No caso da Argentina, o dólar paralelo recebeu o nome de “dólar azul” (ou “dólar blue”), ou seja, trata-se de uma taxa de câmbio informal.
O sócio-fundador da Elev Investimentos alerta para riscos ao uma pessoa física fazer a compra deste tipo de dólar: possibilidade de acabar adquirindo moeda falsa, além da chance de estar envolvido em crime de lavagem de dinheiro e sonegação, já que trata-se de um mercado ilegal e as pessoas estão sujeitas às punições previstas em lei.
Altas e baixas do dólar paralelo
Como o dólar paralelo não tem fiscalização do Banco Central, sua cotação varia de acordo com a negociação de doleiros e casas de câmbio não regulamentadas. Dessa forma, por não ter regras e leis, a cotação pode sofrer quaisquer oscilações e chegar a variados valores.
Segundo Souza, a escalada do dólar na Argentina está relacionada, principalmente, pelo cenário econômico desfavorável na Argentina, incertezas após a renúncia de Martín Guzmán do cargo de ministro da Economia, além das restrições temporárias ao mercado de câmbio impostas pelo país, limitando a compra de dólares tanto pelos cidadãos quanto empresas.
Os argentinos podem comprar até US$ 200 por mês em dinheiro. Já as empresas só têm acesso a volume de divisas equivalente ao importado no ano passado mais 5%. Caso seja necessário mais dólares, precisarão fazer o levantamento de recursos via crédito. A intenção das medidas pelo governo é frear a elevada fuga de dólares e a perda de reservas da Argentina.
Para Souza, o cenário econômico da Argentina não é favorável, pois a moeda local está fraca, o país sofre com elevada inflação, além das incertezas advindas do cenário político.
O banco central argentino elevou no último dia 28 sua taxa básica de juros em 8 pontos percentuais, para 60%, marcando a sétima alta neste ano, em meio a um cenário de inflação que chegou a 64% no acumulado de 12 meses, com perspectivas de analistas que alcance os 80% ainda em 2022.
Em janeiro, a Argentina fechou um acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI) sobre a dívida de mais de US$ 40 bilhões que o país possui com a entidade. Este acordo permite a rolagem da dívida contraída pela Argentina no ano de 2018, durante a gestão de Mauricio Macri, começando a ser paga em 2026, se estendendo até 2034.
Por lá, o Produto Interno Bruto (PIB) registrou alta de 6% no 1º trimestre de 2022 em relação ao mesmo período do ano anterior, sendo o 5º trimestre consecutivo de crescimento. A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) projeta que o país terá crescimento de 3,6% neste ano.
Além disso, estima-se que 40% da população da Argentina vive em situação de pobreza, e o desemprego atingiu 7% no primeiro trimestre desse ano.
No último dia 6, o nível do risco-país da Argentina subiu para um pico recorde intradiário de 2.654 pontos-base, segundo o banco JPMorgan, por causa do aumento da desconfiança em relação à economia doméstica e às consequências de tensões no cenário político.
“Trata-se de um cenário bem catastrófico e a subida do dólar paralelo só informa e faz preocupar do que está acontecendo com a economia argentina, que corre um grande risco”, destaca Souza.
Impactos da circulação do dólar paralelo
Souza, sócio-fundador da Elev Investimentos, pontua que, quanto mais dólar paralelo em circulação em um país, mais o sistema fica fragilizado, ou seja, mais suscetível a crimes, operações de lavagem de dinheiro, bem como sonegação fiscal, fragilizando a economia.
Patrocínio acrescenta que os impactos do dólar paralelo são graves, pois, ao não ser negociado de forma correta, trazendo complexidade para a economia, ainda não se tem um controle oficial do quanto entra e sai da moeda estrangeira no país.
Câmbio informal
João Victor Patrocinio, da Blue3 Investimentos, explica que não é só a Argentina que possui câmbio informal e utiliza várias cotações cambiais, mas que isso é, usualmente, visto em outros países, principalmente os emergentes, pois o dólar paralelo acaba se tornando uma realidade para a população em meio a cenários de crises econômicas, por exemplo.
Além disso, Patrocínio aponta que as principais formas deste câmbio irregular ser utilizado é no caso de quando, por exemplo, um investidor tem algum empecilho de continuar utilizando o dólar comercial em alguma transação; impedimentos da lei fiscal; além de quando pessoas são politicamente expostas e que não conseguem operar de forma legal no mercado através do dólar comercial.
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