Se um aumento da cotação do petróleo em meio à guerra na Ucrânia deve impulsionar papéis de petroleiras na bolsa de maneira geral, a tendência para a ação da Petrobras (PETR3 e PETR4) é mais incerta. É o que disseram especialistas ouvidos pelo InvestNews, que se dividem entre a boa posição da empresa no mercado na comparação com as demais e riscos como interferências políticas e até uma possível desaceleração do desempenho.
Um dia depois de divulgar resultados anuais fortes no balanço do 4º trimestre de 2021, a Petrobras viu suas ações fecharem em queda na bolsa de valores, com desempenho inferior ao de outras do mesmo setor, como PetroRio (PRIO3) e 3R Petroleum (RRRP3).
Além da repercussão do balanço, investidores acompanhavam também os desdobramentos da invasão russa à Ucrânia, em um conflito que tem potencial para puxar para cima a cotação do petróleo. Nesta quinta-feira (24), o petróleo Brent fechou em US$ 99,08 o barril, após tocar a máxima de US$ 105,79 (maior cotação desde 2014), com preocupações de cortes no fornecimento da Rússia – terceiro maior produtor de petróleo e o segundo maior exportador do mundo.
“À primeira vista, o aumento do petróleo seria muito benéfico. Mas nada é tão simples quando o assunto é Petrobras”, afirma Rob Correa, analista de investimentos CNPI.
“A Petrobras entregou seus excelentes e sólidos resultados anuais de 2021. E um dos grandes propulsores deste resultado foi exatamente o preço do petróleo. Ao longo deste último ano, o Brent esteve na média de US$ 70,73. Você pode imaginar agora, com o preço na casa dos US$ 103, como este movimento seria extremamente positivo para a Petrobras. Seria. Porque na prática a teoria é outra”, complementa.
Dúvidas sobre a política de preços
Um dos motivos de incerteza apontados por Correa é a possibilidade de a Petrobras não conseguir subir seus preços para acompanhar a alta internacional do petróleo por interferência política – especialmente em ano eleitoral.
Outros analistas também levantam a questão. “Essa alta do petróleo acaba pressionando a gestão da Petrobras a subir o preço aqui no Brasil para buscar a paridade com o preço internacional, e essa possibilidade de aumento sempre traz à tona essa discussão de mudanças na política de preços”, diz Bruno Komura, analista da Ouro Preto Investimentos.
“Se tem um petróleo mais caro, tem que repassar esse preço para o consumidor final. E isso gera uma pressão política sobre esses preços, vai haver uma questão econômica do país. Isso vai gerar bastante burburinho. Por isso que fica no ar essa extrema incerteza. Os investidores não gostaram disso”, concorda Fabrício Gonçalvez, CEO da Box Asset Management.
Balanço não agradou?
O lucro de R$ 106 bilhões registrado pela Petrobras em 2021 foi o maior já registrado por uma companhia de capital aberto no Brasil, e representa um aumento de 1.400% na comparação com o ano anterior. No terceiro trimestre, no entanto, o resultado recuou 47%.
Especialistas apontam que os resultados foram fortes, e vieram em linha com as expectativas. Alguns detalhes do balanço, no entanto, levantaram dúvidas e podem ter ajudado a puxar a queda da ação da Petrobras no dia seguinte à divulgação.
“Apesar do ano de 2021 ter sido sólido e robusto, especificamente o quarto trimestre foi fraco comparada às expectativas do mercado. Apesar da empresa ter gerado um bom fluxo de caixa e anunciado polpudos dividendos aos acionistas, o mercado esperava um lucro trimestral melhor”, afirma Correa.
“O fraco resultado trimestral, somado à invasão na Ucrânia que derreteu as bolsas globais, é o motivo para a ação da Petrobras apresentarem queda”, diz o analista sobre o pregão desta quinta.
“O resultado da Petrobras, para variar, veio muito bom. Já era a expectativa dos analistas. Só que a gente teve alguns dados, como Ebitda, que não agradaram tanto em algumas ramificações de receita que a Petrobras tem. Deixou muito a desejar. E isso a deixou suscetível a um pouquinho de correção”, complementa Sidney Lima, analista da Top Gain.
Ação da Petrobras segue o fluxo?
Bruno Madruga, sócio e Head de Renda Variável da Monte Bravo Investimentos, aponta outro fator para explicar a queda da ação da Petrobras: fluxo estrangeiro.
Ele explica que o mercado financeiro no Brasil tem recebido grande volume de capital estrangeiro nos últimos meses, e ações mais líquidas acabam sentido mais o efeito desse fenômeno – para o bem e para o mal.
“O Brasil recebeu muito capital estrangeiro, principalmente nos ativos mais líquidos. Com a alta do petróleo, a Petrobras recebeu um belo valor financeiro alocado. Neste momento em que alocações em renda variável, incluindo bolsa de valores, perdem atratividade devido aos riscos geopolíticos, é natural esse capital, de certa forma, sair dessas empresas mais líquidas – e uma delas foi Petrobras. É fluxo”, diz Madruga.
Nem tudo é pessimismo
Mas nem todos os analistas apontam uma tendência negativa para a ação da Petrobras em meio ao cenário atual.
Mencionando a guerra na Ucrânia, Lima, da Top Gain, afirma que a perspectiva é de que a Petrobras ganhe mais espaço no mercado estrangeiro. “A Rússia é o segundo maior exportador de petróleo no mundo. Quando ela diminui a sua exportação, fica basicamente o mercado liberado para que a Petrobras possa comercializar muito mais petróleo.”
Sobre outras companhias do mesmo setor, ele afirma que o impacto tende a ser menor na comparação com a Petrobras. “As outras acabam também se beneficiando, como PetroRio, 3R Petroleum. Só que, no Brasil, a Petrobras é o maior destaque, é a responsável pela maior produção e pelo maior volume enviado para o mercado internacional.”
E as outras empresas de petróleo?
A despeito das incertezas envolvendo a ação da Petrobras, os especialistas afirmam que, de maneira geral, um aumento da cotação do petróleo diante da crise na Ucrânia pode ser preocupante do ponto de vista econômico pela pressão inflacionária, mas o esperado é que ações de empresas do setor acabem subindo.
“Essa alta do petróleo por causa do conflito na Ucrânia normalmente é positiva para a maioria das empresas, porque quer dizer aumento de receita”, explica Komura, da Ouro Preto.
“Normalmente, as petroleiras tendem a ir exatamente na mesma direção da oscilação do petróleo”, complementa Madruga, da Monte Bravo, que acredita que ações de empesas como PetroRio, Enauta (ENAT3) e R3 Petroleum devem se beneficiar mais do que os papéis da Petrobras de uma alta do petróleo neste momento.
O analista Rob Correa explica que, “em síntese, a alta do petróleo, desde que com o bom gerenciamento dos custos, é benéfico para as empresas deste setor”. Isso porque”, via de regra, os custos destas companhias são fixos. Portanto, toda vez que o preço do petróleo sobe, essas empresas ganham margem (diferença entre receitas e custos).”
“Desde que a guerra na Ucrânia não se irradie para outros países e a economia global não desacelere seu consumo de petróleo, essas pequenas companhias de petróleo da bolsa brasileira têm um potencial de valorização relevante”, afirma ele, e complementa: “em minha opinião, os melhores investimentos são exatamente nestas pequenas empresas.”
“Como a Petrobras vem se desfazendo de blocos de produção para reduzir seu endividamento e gerar caixa, focando apenas em empreendimentos grandiosos, estas empresas pequenas compram esses ativos. Esses ativos, embora já tenham passado do seu auge de produção, ainda têm muitas reservas e não exigem das pequenas companhias investimentos para começar a operação do zero. Em outras palavras, elas compram poços que já estavam em produção e utilizam técnicas eficientes para extrair petróleo a um custo competitivo.”
Entre as petroleiras da bolsa, Correa diz que sua “preferida é a PetroRio, que entregou resultados sólidos em 2021 e tem grande potencial para continuar aproveitando a escalada dos preços do petróleo.”
“No último trimestre de 2021, a PetroRio produziu 32.300 barris por dia, com um custo de extração de US$ 11,80 por barril. Com o preço do petróleo acima da casa dos US$ 100, o cenário é promissor para companhia”, acredita o analista.