O mercado de tokens não-fungíveis (NFT) tem passado por forte expansão e uma de suas vertentes são videogames que prometem recompensar os usuários com ativos digitais que podem ser resgatados em moeda tradicional, algo que tem chamado atenção de jogadores, inclusive no Brasil.
Os NFTs são títulos de propriedade sobre bens digitais que podem ser negociados por valores monetários e podem representar tudo desde desenhos de macacos a roupas para serem usadas por avatares em metaversos, um negócio que já movimenta bilhões de dólares mundo afora.
O mercado tem suscitado o surgimento de modelos de negócios como o da mineira Orbe888, que tem como atividade principal o gerenciamento de contas em videogames baseados em NFT que são acessadas por jogadores associados à empresa. A startup também monitora tendências de popularidade de games da categoria, fazendo análises sobre quais valem mais a pena serem jogados pelos usuários em termos de retorno.
Como os videogames NFT muitas vezes exigem que os usuários façam investimentos iniciais, “a Orbe888 assume esse risco e os jogadores associados à empresa recebem um percentual dos ganhos à medida que avançam neles”, disse o presidente-executivo da Orbe888, Juan Alcasar.
A empresa foi criada ano passado na cidade do interior mineiro de Conceição do Pará e já está de mudança para Belo Horizonte para conseguir infraestrutura mais estável após as fortes chuvas que atingiram o Estado.
O projeto da empresa, que ainda está sendo implementado, inclui a contratação de jogadores profissionais para representá-la em vários dos maiores criptogames que estão sendo lançados no modo “play-to-earn”.
Os tokens adquiridos através das contas da empresa permanecem sob sua propriedade. Os jogadores ficam com 60% do lucro das NFTs que minerarem nos games onde a empresa possui conta, enquanto estiverem sob a responsabilidade do jogador e seu contrato permanecer ativo, explicou o executivo.
Bruno Leite, 19, joga “Bombcrypto” e “Luna Rush” em Vitória (ES) para a Orbe888. O primeiro é semelhante ao videogame Bomberman e os jogadores precisam explodir baús para minerar a criptomoeda BCOIN. Ele afirma que chegou a receber R$ 2.500 (US$ 485,55) quando a BCOIN atingiu sua alta. Em Luna Rush, ele diz que recebeu R$ 3 mil (US$ 582,66), no pico da criptomoeda nativa do game, LUS.
Porém as retiradas monetárias acumuladas em cada conta variam conforme as regras de cada jogo e a carteira blockchain utilizada. “O Bombcrypto por exemplo, você só pode retirar quando acumular 40 BCOINS”, explica Leite.
Montanha-russa
Também chamadas de “altcoins”, as moedas digitais de videogames baseados em NFT são sujeitas a oscilações mais intensas que as de criptomoedas tradicionais como o bitcoin, que possui uma base muito maior de usuários.
A BCOIN, por exemplo, era negociada nesta sexta-feita a US$ 0,54, segundo a CoinMarketCap. Mas no final de novembro, ela atingiu um pico de US$ 8,46. Nas últimas 24 horas, a moeda mostrava queda de 24%, operando abaixo da cotação inicial de US$ 1,7 de janeiro do ano passado, quando começou a ser negociada, segundo a plataforma.
Além de Bombcrypto e Luna Rush o mercado tem uma série de títulos à disposição dos jogadores, incluindo Axie Infinity, o mais popular entre eles.
“Se você pegar países periféricos, principalmente nas Filipinas, tem gente que abandonou seus empregos para viver de Axie Infinity porque é muito mais rentável do que o cara trabalhar no mercado, numa lanchonete, por exemplo”, disse Bruno Milanello, executivo de novos negócios do Mercado Bitcoin, uma das maiores bolsas de criptomoedas do Brasil.
“Com concentração em poucos lugares, essas moedas ficam sensíveis às oscilações de preços. Mesmo no caso de Axie Infinity, que é mais popular, ela tem um volume substancialmente menor do que o bitcoin, por exemplo”, diz Milanello.
A Axie era cotada nesta sexta-feira a US$ 50,40. No auge, em junho do ano passado, atingiu US$ 160,4, representando um valor de mercado de US$ 9,8 bilhões, segundo a CoinMarketCap.
Riscos
Mas a euforia em torno desse mercado representa riscos, segundo especialistas em finanças digitais.
“Enquanto entrar novos jogadores, tem quem compre, mas pode chegar uma hora que a produtora pode desaparecer e sumir com seus criptoativos”, disse Isac Costa, professor de Direito, Tecnologia e Finanças do Ibmec/SP.
O golpe conhecido como “rug pull” (puxada de tapete) já foi aplicado em um projeto onde a Orbe88 possuía conta e ocorre quando desenvolvedores abandonam um projeto e fogem com o dinheiro dos investidores.
“É importante que nossos futuros jogadores sejam devidamente orientados quanto ao mercado NFT Games, isso porque é uma área de alto risco e que demanda investimentos de alto valor, e, dessa forma exige muita cautela”, disse a empresa, em comunicado.
Mas, para além do investimento, está o interesse de jogadores em aplicar melhor seu tempo de entretenimento. O metroviário João Barreiros, 45, joga MIR4, um RPG online para múltiplos jogadores (MMORPG) baseado em blockchain.
“Sempre gostei de jogos online então por que não tentar gastar o dinheiro que eu gastaria em jogos que não me trazem retorno nenhum, com algo que poderia dar algum retorno?”, disse Barreiros, que não é associado à Orbe888. “Unir a diversão com um provável ganho de capital”, acrescentou.
Barreiros conta que joga com duas contas no MIR4 e cada uma chegou a ser avaliada em cerca de R$ 3 mil. Ele ainda não tirou dinheiro do jogo, preferindo reinvestir os ganhos enquanto o mercado de criptomoedas se recupera de baixas recentes ocorridas em meio à fuga de investidores de ativos de risco que atingiu o bitcoin e o restante do mercado de criptoativos.
“Estamos vivendo a primeira geração, a pré-história da relação entre videogames e NFTs porque, com o conceito de metaverso, as produtoras de jogos ainda estão analisando como vão se posicionar no mercado”, disse Costa.