O primeiro corte desde 2020 da taxa básica de juros, a Selic, está previsto para começar em agosto, na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom). Daí para frente, espera-se uma queda gradual que vai afetar a rentabilidade dos investimentos em renda fixa, incluindo os títulos públicos do Tesouro Direto.
O último boletim Focus, relatório publicado semanalmente com uma média das expectativas de instituições do mercado financeiro, aponta para uma taxa de 12% no fim de 2023 e de 9,5% no fim de 2024. Hoje, a Selic está em 13,75% ao ano.
Se de um lado os títulos pós-fixados (que remuneram de acordo com a taxa de juros do momento) devem oferecer uma rentabilidade menor, à medida que a Selic cai, os preços dos prefixados (quando o retorno é definido no momento da compra do título) já valorizaram – mesmo antes do início dos cortes – acompanhando as expectativas do mercado.
Para entender melhor o cenário para o Tesouro Direto diante do esperado corte de juros, o Investnews conversou com especialistas sobre o que o investidor pode esperar para a modalidade daqui para frente. Confira abaixo:
Pós-fixado é mau negócio com Selic em queda?
Quando a Selic é reduzida, é natural que a rentabilidade do Tesouro Selic caia, afinal o título remunera o investidor de acordo com os juros vigentes no país.
“É importante lembrar que [o corte da Selic] não se traduz em prejuízos para os investidores [de pós-fixados como o Tesouro Selic], apenas uma freada nos rendimentos”.
Vinicius Romano, head de Renda Fixa na Suno Research
Neste sentido, Virginia Prestes, assessora de investimentos e professora da Faap, explica que o títulos pós-fixados não sofrem o chamado deságio (que é quando o preço do título comprado fica mais barato).
Portanto, se o investidor comprou o Tesouro Selic por R$ 500, ele continuará valendo os mesmos R$ 500 em 2024, por exemplo, mesmo diante do corte de juros. O que vai diminuir é o ganho obtido com a aplicação.
“Ou seja, o investidor não tem uma perda patrimonial mesmo com a queda da Selic”, reitera Virgínia.
Prefixados e indexados à inflação
Diferentemente dos pós-fixados, os preços dos papéis prefixados – que remuneram a uma taxa predefinida no momento da compra do título – e o chamado Tesouro IPCA+ (cuja rentabilidade está atrelada à variação da inflação, além do pagamento de um prêmio de juros prefixado), podem sofrer oscilações tanto para cima ou para baixo.
Desde abril, especialmente, esses ativos têm registrado ágio – ou seja, seu preço tem se apreciado diante da expectativa de queda dos juros.
Isso porque, de acordo com Samuel Ferrarezi, estrategista de investimentos do Santander, os juros futuros (que é uma espécie de previsão de como vai ficar a Selic no futuro e que servem como referência para remunerar os títulos públicos) já incorporaram as expectativa de cortes.
Em simulação feita no próprio site do Tesouro, é possível verificar que um título prefixado com vencimento em 2029, que custava R$ 440,08 em julho do ano passado, é vendido atualmente por R$ 576,50 (simulação feita no dia 19 de julho).
A lógica é a seguinte: a remuneração desses títulos, que já é pré-definida, está travada em um momento de juros mais altos. Isso os torna mais caros na hora da venda, já que o cenário previsto é de queda nos juros – e o papel terá remuneração mais atrativa do que novos títulos no mercado.
A professora da Faap cita como exemplo um investidor que adquire hoje um título prefixado com uma remuneração de 12% ao ano e que decide vendê-lo em 2024, quando a expectativa é de uma Selic próxima de 10%.
“Provavelmente ele terá um ágio, porque enquanto o mercado está pagando 10%, o papel que ele tem em mãos remunera a uma taxa de 12%”, explica. Entretanto, é preciso lembrar que os títulos prefixados são bastante voláteis.
“Com certeza, se a gente for comparar com um ano atrás (quando não se sabia o horizonte de queda para os juros), hoje vale mais a pena ter um percentual maior de títulos prefixados do que antes. Mas tudo pode acontecer, como em 2021, quando a inflação e a taxa de juros ficaram em patamares complemente diferentes ao esperado”, alerta a docente da Faap.
Na ocasião, os prefixados foram afetados pelas incertezas relacionadas à covid-19 e ao ambiente doméstico, o que levou a um aumento dos juros e, consequentemente, a uma depreciação dos preços desses títulos.
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Qual título comprar?
Embora os títulos da dívida pública sejam afetados de formas diferentes pela redução dos juros, os especialistas recomendam a manutenção em carteira dos três tipos de papéis (pós, prefixados e indexados à inflação) por preencherem lacunas distintas.
“Justamente a frequência e intensidade dos cortes nos juros é que podem fazer com que um dos ativos se torne mais rentável que o outro – por isso reforçamos sempre a nossa percepção de complementariedade entre eles”, explica o especialista do Santander.
Já os títulos indexados ao IPCA, por exemplo, ajudam a proteger o patrimônio de uma futura elevação de preços, que poderá corroer o ganho real da aplicação.
“Quando adquire esse título, o investidor está comprando juro real. Isso é muito interessante porque protege o investidor, principalmente quando o investidor está olhando para um prazo mais longo, como a aposentadoria. Nunca se sabe o que vai acontecer em 2030, 2040 ou 2050”, explica a professora da Faap.
Como equilibrar a carteira?
Virginia aconselha que, ao montar a carteira de títulos públicos, o investidor mais conservador direcione a maior parte dos recursos aos pós-fixados, independentemente do cenário econômico.
“Sempre há oscilação. Ainda que o cenário seja de queda de taxa de juros, tem momentos de aversão à risco em que as curvas de juros abrem (quando as expectativa para os juros futuros se elevam). Isso pode impactar a carteira e para o investidor conservador não seria adequado”.
Na mesma linha, Vinicius Romano, da Suno Research, aconselha ao investidor conservador priorizar os títulos pós-fixados, seguidos dos indexados à inflação e, por último, os prefixados.
“Um exemplo de divisão percentual dessas três classes seria: 70% em pós-fixados, 20% em indexados à inflação e 10% em prefixados. Entretanto, não existe uma regra fixa a ser seguida”, diz.
Além disso, o Tesouro Selic se mantém como uma opção interessante para a formação da reserva de uma emergência.
Romano reitera que os investimentos usados para destinar recursos de emergência devem levar em conta alta segurança, liquidez e baixa volatilidade. “Os ativos de renda fixa pós-fixados são os mais indicados para essa estratégia, e o Tesouro Selic possui essas três características”, explica.
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