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Finanças

Tesouro Selic fica negativo e não é mais o preferido do investidor. O que fazer?

Quando um dos títulos mais seguros do mercado ficou no vermelho, muita gente quis saber se é melhor colocar a reserva de emergência em outro lugar. Entenda por que não é bem assim.

queda investimentos

Um dos papéis mais procurados na renda fixa por sua segurança, o Tesouro Selic ficou no vermelho pela primeira vez em setembro e acabou contagiando outros investimentos conservadores. Entre eles, os fundos DI, que aplicam a maior parte da carteira nestes papéis. O “prejuízo” pegou investidores de surpresa, já que este título público, também chamado de LFT, costuma ser um dos mais estáveis e, portanto, um dos preferidos para formar a reserva de emergência. Mas por que a queda aconteceu? Ela é motivo para tirar o sono do investidor?


O que derrubou o papel


Aos fatos: pressionado pelo aumento dos gastos públicos durante a pandemia, o Tesouro Nacional (que é a “caixa registradora” do governo) precisou aumentar a oferta de títulos públicos em setembro para conseguir financiar a sua dívida. Ele estava tão apertado que chegou a pedir um repasse de emergência ao Banco Central. Mas a procura pelo Tesouro Selic vem caindo tanto que isso gerou um desequilíbrio entre oferta e demanda, a ponto de afetar o preço e fazer a rentabilidade ficar negativa. O IMA-S, índice da Anbima que mede o desempenho deste título pós-fixado que acompanha a Selic, chegou a cair 0,5% no mês até o dia 21. Até o dia 28, recuava 0,11%.

LEIA MAIS: O Tesouro Direto pode dar calote durante a crise? Entenda

“O Tesouro fez um leilão grande de LFTs porque precisava captar mais, mas o mercado ficou reativo”, explica Sérgio Machado, sócio-gestor da Trópico Investimentos. Segundo ele, “não adianta vender gelo para esquimó”. A gota d’água foi a última reunião do Copom, em 16 de setembro, quando ele não comunicou mudanças de postura diante da deterioração fiscal e da pressão inflacionária sobre os alimentos. O mercado esperava um Copom mais hawkish (favorável ao aumento nos juros), mas não foi o que aconteceu”. “Minha percepção é de que o mercado entendeu que o BC reduziu demais os juros e que eles estão em um patamar incompatível com a realidade”, afirma Machado.


Tesouro IPCA+ saiu na frente


Não é de hoje que o investidor vem perdendo o interesse no Tesouro Selic. O movimento só aumentou desde que o Banco Central cortou gradualmente a taxa de juros básicos ao menor patamar da história, tirando a atratividade destes papéis. Para se ter uma ideia, em agosto, o Tesouro IPCA+ (que paga uma taxa fixa mais a variação da inflação) desbancou o Tesouro Selic na preferência do investidor: o primeiro atingiu 38,9% de participação nas vendas, enquanto o segundo alcançou 37,1%. Em julho, ele era o campeão, com uma fatia bem maior, de 48,2%.

De olho nesta tendência, o Tesouro e a B3 anunciaram em julho que zeraram a taxa de custódia do Tesouro Selic para aplicações de até R$ 10 mil, na tentativa de aumentar o apetite do investidor pelo papel, visto como estratégico para o Tesouro conseguir rolar sua dívida. Mas nem isso foi suficiente para evitar uma migração do investidor, sempre em busca de maiores retornos, para aplicações consideradas mais atrativas, diante de uma Selic tão fraca.

Foi então que, na última quinta-feira, o Tesouro precisou ceder e reduziu a oferta de LFTs na praça, de 500 mil para 100 mil papéis. O movimento ajudou a deixar a situação menos crítica, tanto que o IMA-S passou a acumular perdas menores em setembro. Foi um movimento considerado “inteligente”, na avaliação de Jason Vieira, economista-chefe da Infinity Asset, em relatório divulgado na sexta-feira.


Desconfiança fiscal pesou


Já não estava fácil para o Tesouro conseguir rolar sua dívida diante do aumento dos gastos públicos gerados pela pandemia. E só piorou após o aumento de casos da covid-19 na Europa elevar o risco de uma segunda onda de contágio no mundo. Além disso, a percepção de piora do cenário fiscal no Brasil cresceu com o impasse sobre a criação do Renda Brasil e as incertezas quanto ao cumprimento do teto de gastos. O mercado cobrou um preço e o mau humor apareceu nos juros com prazos mais longos.

Traduzindo: de olho na piora do cenário interno e externo, as taxas dos contratos de DI (Depósito Interfinanceiro) com vencimento em 2027 chegaram a bater a máxima de 7,40% no último dia 23 de setembro. Isso acontece porque os juros de prazos mais longos tendem a subir em cenários de maior incerteza, já que o investidor passa a exigir um “prêmio” maior para financiar a dívida do Tesouro ao perceber que o risco aumentou.


Por que o papel desvaloriza?


Ao entrar no site do Tesouro Direto ou em sua corretora, o investidor já deve ter reparado que os papéis do Tesouro Selic sempre mostram uma rentabilidade que paga a Selic mais uma taxa bem pequena (veja abaixo), que pode ser positiva ou negativa. Quando ela sobe, significa que houve um deságio e o papel desvalorizou, afetando a rentabilidade. Até 28 de setembro, o título mais conservador do mercado acumulava perda de 0,32% em 30 dias.

TítuloRentabilidade anual*Preço UnitárioVencimento
TESOURO SELIC 2021SELIC + 0,0583%R$ 10.706,0501/03/2021
TESOURO SELIC 2023SELIC + 0,1051%R$ 10.681,5401/03/2023
TESOURO SELIC 2025SELIC + 0,1413%R$ 10.642,0901/03/2025

* Taxas válidas em 28/09/2020, às 14h21

Para se ter uma ideia, no começo de 2020, essa taxa do Tesouro Selic estava em 0,02% e foi subindo gradualmente, quase que de forma imperceptível. Mas no último mês, houve uma alta bem forte desta taxa, passando 0,035% para 0,075% em uma única semana. A analista de renda fixa da Nord Research, Marília Fontes, explica para cada alta de 0,01% (1 base point) dessa taxa, o papel que vale R$ 10.668, cai R$ 4,71, ou 0,044%.

“Esse efeito, quando isolado e espaçado no tempo, não faz nem cócegas”, afirmou em relatório. Mas como a mudança foi de 3 basis points em apenas uma semana, o preço do título caiu 0,17%, mais do que o retorno da Selic em um mês, que hoje é de 0,165% (2% ao ano). “Ou seja, a alta da taxa do Tesouro Selic acabou por comer a rentabilidade do mês inteiro”, explica.

Papéis como o Tesouro IPCA+ costumam ser mais voláteis, com oscilações mais bruscas no curto prazo. O que assustou foi o fato de o Tesouro Selic ser um papel mais estável. Quando um investimento considerado como “porto-seguro” fica negativo, o mercado sente o desconforto e a tendência é gerar uma “reação em cadeia”.

O resultado costuma ser a saída de mais investidores, o que tende a desvalorizar ainda mais o papel e outros investimentos atrelados a ele. É a chamada “marcação a mercado”, um fenômeno bastante temido pelo investidor mais conservador. Segundo Machado, este movimento já vem afetando não só os fundos DI, mas também os de crédito privado, que investem em títulos de dívida das empresas.


Fugir para as montanhas?


O que é motivo de pânico para uns é oportunidade para outros. Na avaliação de Marília Fontes, da Nord Research, apesar de o Tesouro Selic ter tido um movimento técnico ruim no curto prazo, ele continua interessante para formar a reserva de emergência. A tendência é que as taxas voltem a normalizar após o Tesouro ter reduzido os leilões das LFTs no final do mês. Ela defende, inclusive, que o título público ficou mais interessante após esse movimento.

Na prática, o “desagio” nas taxas do papel fez ele render, a grosso modo, perto de 105% do CDI. “Está com um preço bom. Se fosse uma ação, estaria muito barata”, compara. “É bom para a reserva de emergência, mesmo após um mês com retorno negativo. E no longo prazo, essa variação deve ser pequena perto do todo”, afirma Marília. 


Ela lembra que os papéis prefixados acabaram dando prejuízos muito maiores, por sua natureza mais volátil. “Teve IPCA+ de prazo mais longo com prejuízo de mais de 5%, então o Tesouro Selic segue sendo o melhor dos títulos”, defende. Nunca é demais lembrar que, para o investidor que pretende segurar os papéis até a data do vencimento, nada muda na rentabilidade combinada no dia da compra. A variação negativa só vale para quem resgatar o papel antes da hora.

Veja abaixo a rentabilidade acumulada dos títulos do Tesouro Direto até o dia 28 de setembro de 2020:

TítulosVencimentoÚlt. 30 diasMêsanteriorNo ano12 meses
Tesouro Prefixado01/01/20210,090,093,935,63
Tesouro Prefixado01/01/20220,17-0,256,828,85
Tesouro Prefixado01/01/2023-0,26-0,97,419,76
Tesouro Prefixado01/01/2025-1,12-2,724,887,59
Tesouro Prefixado01/01/2026-1,45-3,52
Tesouro Prefixado com Juros Semestrais01/01/20210,170,093,945,59
Tesouro Prefixado com Juros Semestrais01/01/2023-0,17-0,787,089,1
Tesouro Prefixado com Juros Semestrais01/01/2025-0,6-2,265,918,12
Tesouro Prefixado com Juros Semestrais01/01/2027-1,03-2,963,96,28
Tesouro Prefixado com Juros Semestrais01/01/2029-0,68-3,343,16,21
Tesouro Prefixado com Juros Semestrais01/01/2031-1,17-3,77
Tesouro Selic01/03/20210,140,162,243,52
Tesouro Selic01/03/2023-0,030,142,033,32
Tesouro Selic01/03/2025-0,320,121,733,02
Tesouro IGPM+ com Juros Semestrais01/04/20214,142,9515,6320,72
Tesouro IGPM+ com Juros Semestrais01/01/20311,75-0,0214,7518,94
Tesouro IPCA+15/08/2024-0,35-0,845,518,71
Tesouro IPCA+15/08/2026-1,16-2,51
Tesouro IPCA+15/05/2035-4,58-5,53-5,35-2,84
Tesouro IPCA+15/05/2045-8-9,45-11,25-8,55
Tesouro IPCA+ com Juros Semestrais15/08/2024-0,25-0,655,278,34
Tesouro IPCA+ com Juros Semestrais15/08/2026-0,9-1,946,59
Tesouro IPCA+ com Juros Semestrais15/08/2030-2,03-2,64
Tesouro IPCA+ com Juros Semestrais15/05/2035-2,93-3,69-1,271,25
Tesouro IPCA+ com Juros Semestrais15/08/2040-3,61-4,29
Tesouro IPCA+ com Juros Semestrais15/05/2045-3,82-5,22-6,07-3,5
Tesouro IPCA+ com Juros Semestrais15/08/2050-4,37-5,65-7,4-4,86
Tesouro IPCA+ com Juros Semestrais15/05/2055-4,85-6,52

Fonte: Tesouro Nacional

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