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Economia da Argentina: Milei assume país com 40% da população na pobreza

Veja o momento econômico do país durante as eleições e os principais desafios para o novo presidente.

Economia da Argentina: Milei assume país com 40% da população na pobreza

(Atualização: O ultraliberal Javier Milei foi eleito presidente da Argentina neste domingo, 19, ao vencer no segundo turno o candidato peronista Sergio Massa. Com 94,7% dos votos apurados, Milei obteve 55,79% dos votos, enquanto Massa ficou com 44,20%).

Eleitores foram às urnas na Argentina para eleger o próximo presidente do país, na sucessão do atual governante, Alberto Fernández. Em outubro, o primeiro turno da eleição aconteceu em um momento em que a pobreza atingia mais de 40% da população, a inflação anual estava em 138% e a taxa de juros ultrapassava os 130% ao ano.

Javier Milei. Crédito: Bloomberg.

Entre os três principais candidatos ao cargo, disputaram: Javier Milei, do Libertad Avanza, Patrícia Bullrich, da Juntos por El Cambio, e Sérgio Massa, do União por la Patria.

O novo presidente da Argentina governará um país com quase 47 milhões de habitantes, sendo 29 milhões deles em 31 aglomerações urbanas, onde 15 milhões são economicamente ativos.

Segundo o Instituto Nacional de Estatísticas e Censo (Indec), a quantidade de pessoas vivendo na pobreza na Argentina alcançou 40,1% da população no primeiro semestre de 2023. Além disso, o instituto informou que 9,3% da população vive em situação de indigência, ou seja, quando as pessoas não têm rendimentos que são suficientes para cobrir os gastos alimentares básicos.

Hugo Garbe, professor de finanças e Economia da Universidade Presbiteriana Mackenzie, explica que a situação econômica da Argentina é ruim, pois houve uma série de tomadas de decisões erradas, principalmente por parte do Ministério da Economia nos últimos anos.

“O momento da economia da Argentina é muito ruim. Mesmo com emprego, as pessoas não conseguem comprar comida por causa da inflação e deterioração do poder de compra da população”, destaca Garbe.

Paulo Feldmann, professor da FIA Business School, avalia que as perspectivas são ruins para o país, independentemente de qual seja o candidato vencedor na disputa à presidência. 

“Nenhum (dos candidatos) empolga a população como um todo. A Argentina precisa de um governo no qual a população confie e acredito que isso não vai acontecer com nenhum dos candidatos”, defende Feldmann.

Desemprego

No segundo trimestre de 2023, a taxa de emprego da Argentina totalizava 44,6% da população, com 13,1 milhões de ocupados. Já a taxa de desemprego no período era de  6,2%, ou 900 mil desocupados.

Feldmann aponta que o desemprego é o único dado econômico positivo do país, embora o considere alto. Segundo o professor, o setor de pequenas empresas é muito ativo na Argentina e responsável por esse número não ser mais elevado.  

Já Rodrigo Leite, professor de finanças e Controle Gerencial do Coppead/UFRJ, destaca que a taxa de desemprego não é alta na Argentina, porém, devido à elevada inflação, o salário real para o trabalhador acaba caindo, o que diminui a qualidade de vida do argentino médio. 

PIB da Argentina

O Produto Interno Bruto (PIB) argentino recuou 4,9% no segundo trimestre de 2023 ante  o mesmo período do ano passado. Foi a contração mais forte da economia do país desde 2020.

Já no primeiro trimestre deste ano, a economia da Argentina registrou crescimento de 1,3%  em relação a igual período de 2022.

Segundo Feldmann, da FIA Business School, foram raros os bons momentos econômicos na Argentina nos últimos dez anos.

“O PIB caiu quase 5% nos últimos 12 meses e a principal razão está na carência total de investimentos, tanto governamentais como privados”, afirma o professor.

Para Leite, do Coppead/UFRJ, a Argentina precisa de políticas econômicas mais ortodoxas, que combatam a inflação, que gerem crescimento econômico, emprego e renda para a população.

“Isso leva tempo, são medidas duras, muitas vezes impopulares, mas que são importantes de serem feitas. É isso que a Argentina precisa fazer, independente do governo ser de esquerda ou direita”, defende Leite.

Em relatório divulgado em 10 de outubro, o Fundo Monetário Internacional (FMI) espera que o PIB da Argentina recue 2,5% em 2023, e que cresça 2,8% em 2024.

Dívidas e balança comercial

No segundo trimestre deste ano, a dívida externa da Argentina totalizava US$ 276,201 bilhões. Já a dívida do país com o FMI é de cerca de US$ 44 bilhões.

As reservas internacionais da Argentina, por sua vez, somavam US$ 25,646 bilhões em julho de 2023, segundo o Banco Central do país.

Em relação à balança comercial, de acordo com os dados mais recentes do Instituto Nacional de Estatísticas e Censo da Argentina, em agosto, o total de exportações do país totalizou US$ 5,8 bilhões.

Considerando os principais setores exportadores da Argentina, oleaginosas, cereais e automotivo e petroquímico se destacaram.

Já as importações somaram US$ 6, 8 bilhões em agosto.

Inflação

Em setembro de 2023, o Índice de Preços ao Consumidor do país acelerou para 12,7% na comparação com agosto. Com o resultado, a inflação da Argentina no acumulado de 12 meses é de 138,3%.

Feldmann defende que a causa principal para esse patamar de inflação na Argentina é a falta de confiança dos argentinos no futuro do país e no governo para resolver os problemas.

“A Argentina precisa de mudanças radicais na economia, mas, antes de tudo, precisa de um plano estratégico que defina o que o país quer ser no futuro”, diz Feldmann.

No final do mês de agosto, o ministro da Economia da Argentina, Sergio Massa, chegou a anunciar uma série de medidas econômicas em resposta à atual situação enfrentada pelo país. Segundo ele, o objetivo é  “cuidar das famílias argentinas”, em meio às consequências da falta de reserva de dólares no país, desvalorização do câmbio e a seca enfrentada.

Dentre as medidas estão benefícios destinados a assalariados, pequenas e médias empresas, aposentados, trabalhadores independentes, para o setor agrário e grupos que são dependentes de programas do Estado.

Taxa de juros

No dia 12 de outubro, o Banco Central da Argentina elevou a taxa básica de juros do país em 15 pontos percentuais, a 133% ao ano, com o “objetivo de reforçar o incentivo à poupança em pesos”.

A autoridade monetária do país apontou que os indicadores argentinos continuam a refletir uma “desaceleração no ritmo de aumento do nível geral de preços desde o pico da terceira semana de agosto”, sugerindo uma desaceleração significativa da inflação em outubro.

A decisão acontece após, na reunião anterior, em agosto, a autoridade monetária do país ter optado por manter a taxa de juros em 118% ao ano, justificando que os indicadores de alta frequência refletiam uma desaceleração do ritmo do crescimento do nível geral de preços.

Para  Rodrigo Leite, do Coppead/UFRJ, a decisão de agosto não foi acertada, pois a taxa deveria ser aumentada para tentar combater a inflação, o que não aconteceu, para evitar ter os efeitos no PIB, mas que, em compensação, a inflação acaba saindo do controle.

“O Banco Central é extremamente fraco do ponto de vista monetarista, ou seja, ele emite dinheiro, coloca a taxa de juros baixa, muitas vezes até ficou abaixo da inflação, mesmo durante a hiperinflação”, avalia Leite. 

Câmbio

Segundo a L4 Capital, nos últimos 10 anos até 16 de outubro de 2023, o peso argentino já tinha se desvalorizado 98,65% em relação ao dólar.

Dentre os motivos apontados por especialistas que justificam essa desvalorização está o fato de o governo da Argentina gastar mais do que pode, impactando em perda de credibilidade internacional. Além disso, a Argentina passou a fazer a emissão de mais moedas para financiamento de gastos públicos, o que leva ao aumento da inflação, se refletindo em crise econômica.

Como proteção, os argentinos começaram a realizar reservas em dólar, impactando, consequentemente, no preço da moeda norte-americana e derrubando o valor do peso.

Como a economia argentina convive há anos com crise financeirahiperinflação e câmbio desvalorizado, na tentativa de evitar uma desvalorização ainda maior e evitar a fuga de dólares do país, o governo argentino criou regras de câmbio.

Hugo Garbe, professor de finanças e Economia da Universidade Presbiteriana Mackenzie, explica que o peso argentino nunca conseguiu se firmar como moeda forte, pois o argentino não confia na moeda por causa das sucessivas mudanças de políticas econômicas nos últimos anos. Neste cenário, Garbe cita que o argentino que tem reserva, faz ela em dólar. 

”Essas múltiplas moedas tendem a deixar a economia cada vez mais dispersa, cada vez mais confusa”, afirma o professor.

Na mesma linha, Feldmann destaca que as várias taxas de câmbio só pioram a situação, pois diminuem a confiança no governo e contribuem para aumentar confusões sendo, segundo o professor, mais um dos erros do governo.

Já Rodrigo Leite, professor de finanças e Controle Gerencial do Coppead/UFRJ, avalia que ainda é cedo estimar o que pode acontecer com as taxas de câmbio na Argentina após a eleição de um novo presidente. 

Impactos no Brasil

Feldmann estima que é pouco provável que a Argentina saia das atuais dificuldades econômicas nos próximos dois anos e que isso é ruim para o Brasil, pois o país vizinho é um dos três principais parceiros comerciais do Brasil. 

“O perigo maior é a Argentina contaminar a economia do Brasil, o que deve merecer a atenção das autoridades brasileiras”, alerta Feldmann.

O professor da  FIA Business School diz ainda acreditar que as relações entre os dois países já foram melhores, mas pioraram por causa da crise Argentina. Para Feldmann, ambas nações deveriam se empenhar para transformar o Mercosul em algo importante. 

“A América do Sul está em crise há muito tempo, e uma das razões é nunca ter conseguido desenvolver um mercado comum para valer. Acho que Brasil e Argentina, por serem os dois maiores países da América do Sul, deveriam, juntos, trabalhar em um plano de longo prazo para a região”, avalia o professor.

Garbe, professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie, destaca que o Brasil faz empréstimos, tem ajudado a  Argentina neste momento econômico difícil, gerando muitas críticas, já que o Brasil tem necessidade de capital, não tem dinheiro sobrando para emprestar para outros países.

Além disso, segundo o professor  do Mackenzie, hoje, existe uma  aproximação entre Brasil e Argentina mais por causa da visão ideológica que o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o governo da Argentina têm. 

“Sabemos que existe um candidato de extrema direita muito próximo da filosofia política de Jair Bolsonaro. E, caso ele seja eleito, a tendência é que haja um distanciamento político e ideológico entre Argentina e Brasil”, diz o professor.

Já Rodrigo Leite, professor de finanças e Controle Gerencial do Coppead/UFRJ, aponta que o presidente do Brasil  vem tendo um movimento muito forte em apoio ao atual partido argentino e que isso gera riscos.

“Caso o governo continue, é excelente para o Brasil, porque mantém a relação com a Argentina, mas é apostar todas as fichas em um cavalo só. A partir do momento que você, ativamente, apoia um candidato no país e esse candidato perde, se a oposição ganhar, você vai estar numa situação muito mais fragilizada, que é o ponto do Brasil”, alerta Leite. 

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