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Economia

PEC dos Auxílios deve ajudar PIB em 2022, mas gera desafios para próximo ano

Segundo especialistas, a injeção de R$ 41,25 bilhões na economia pode manter inflação e juros elevados no ano que vem.

A partir de agosto, o governo dá início ao pagamento dos benefícios que foram aprovados na PEC dos Auxílios. Para economistas consultados pelo InvestNews, a entrada de R$ 41,25 bilhões previstos pelo governo na economia deve beneficiar o crescimento do país no curto prazo, mas gera desafios para o ano que vem, como inflação elevada e a necessidade de manutenção da taxa básica de juros em patamar alto.

No dia 14 de julho, o Congresso Nacional promulgou a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que institui estado de emergência no país até o fim de 2022 e permite a ampliação de benefícios sociais e econômicos para a população.

Com esse reconhecimento do estado de emergência, em função da crise econômica mundial provocada pela pandemia e pela guerra na Ucrânia, os valores orçamentários disponibilizados pela PEC não precisam estar no limite do teto de gastos, ou seja, dentro da chamada “regra de ouro”, mecanismo que evita que o governo se endivide para pagar despesas correntes, ou de dispositivos da Lei de Responsabilidade Fiscal.

Gustavo Sung, economista-chefe da Suno Research, defende que, de forma geral, a PEC dos Auxílios traz alívio no curto prazo, mas vai gerar impactos negativos sobre a economia, pois, segundo ele, toda essa mudança no arcabouço fiscal brasileiro afeta negativamente a inflação, juros, câmbio e o crescimento do país no médio e longo prazo.

“No curto prazo, teremos algum alívio na inflação e melhora da atividade. No médio prazo, a economia e a população irão sofrer com preços e juros altos, além de menor crescimento”, explica Sung.

O que muda até dezembro de 2022

Até 31 de dezembro deste ano, do total de recursos aprovados, R$ 26 bilhões serão destinados ao programa Auxílio Brasil (antigo Bolsa Família), que terá, a partir do mês de agosto, um acréscimo de R$ 200 no valor mínimo pago a cada família, passando de R$ 400 para R$ 600. 

Para o auxílio à compra do gás de cozinha, serão destinados R$ 1,05 bilhão para complementar o valor pago a cada dois meses aos cidadãos que são contemplados com o benefício. Com isso, a família passa a receber 100% do valor da média nacional do botijão de 13 quilos de Gás Liquefeito de Petróleo (GLP), e não mais os 50% que eram pagos desde o início do ano.

O programa Alimenta Brasil, por sua vez, que faz a compra da produção da agricultura familiar e destina a entidades sócio assistenciais, escolas e creches, receberá um reforço de R$ 500 milhões. 

No caso dos caminhoneiros cadastrados no Registro Nacional de Transportadores Rodoviários de Cargas (RNTRC), haverá o pagamento de R$ 1 mil mensais.

Os motoristas de táxi cadastrados até 31 de maio de 2022, mediante apresentação do documento de permissão, terão direito a R$ 200 mensais após regulamentação da forma de pagamento.

Além disso, a proposta também prevê transferências para estados e municípios custearem gratuidade no transporte público para cidadãos acima de 65 anos e auxílio para estados que outorgarem créditos tributários do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) para produtores e distribuidores de etanol hidratado.

Impactos na inflação

Pessoas caminham em rua de comércio popular em São Paulo
Pessoas caminham em rua de comércio popular em São Paulo. Crédito: REUTERS/Amanda Perobelli

O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) acumulava alta de 11,89% em 12 meses até junho deste ano. Segundo o último Boletim Focus, do dia 25 de julho, a expectativa do mercado financeiro é que a inflação encerre 2022 em 7,30%.

Com a entrada de mais de R$ 40 bilhões na economia brasileira, Sung avalia que pioram as perspectivas para o cenário inflacionário brasileiro. Segundo o economista, apesar da expectativa de deflação do IPCA em julho e, consequentemente, queda do índice em 2022, o IPCA em 2023 deverá ficar acima do limite superior da meta estipulada pelo Banco Central, de 3,25%, com intervalo de tolerância de 1,5 ponto percentual. 

“A PEC dos Auxílios é mais um fator altista para a escalada de preços, pois incentiva o consumo das famílias. Esse cenário corrobora com uma expectativa para inflação maior no médio e longo prazo. No fim, o Banco Central terá que subir e manter a Selic elevada por mais tempo, impactando negativamente a atividade econômica no ano que vem”, alerta o economista-chefe da Suno Research. 

O economista projeta que o IPCA encerre 2022 em 7,7%. Para 2023, Sung estima uma inflação de 5,2%. Essa elevação, segundo ele, ocorreria por duas razões: os tributos cortados em 2022 voltam em janeiro de 2023 e as medidas fiscais que sustentam a demanda pressionam os preços de diversos setores da economia.

“Somam-se a isso, o aumento da inércia inflacionária deste para o próximo ano, o aumento das expectativas dos agentes com a inflação a médio e longo prazos e a piora do risco fiscal”, destaca Sung. 

Piter Carvalho, economista da Valor Investimentos, alerta que, em meio a esse cenário, o principal a se considerar é que as variáveis que têm elevado a inflação pelo mundo ainda estão em “jogo”, como a guerra na Ucrânia, que encareceu as commodities, além da politica de covid zero na China, atrasando as produções pelo mundo, fator que ainda pressiona a inflação. 

Carvalho acrescenta também que o risco fiscal sobe com a PEC dos Auxílios, elevando a cotação do dólar, deixando produtos mais caros, principalmente os importados.

Já Rodrigo Leite, professor de finanças e controle gerencial do Coppead/UFRJ, diz não acreditar que a inflação possa sofrer impactos neste semestre com a PEC dos Auxílios, pois o efeito dessa expansão monetária na inflação tem um certo atraso, tendo reflexos, assim, no ano que vem.  

“Em 2023 poderia acontecer uma continuidade da inflação acima dos parâmetros que o Banco Central determinou, seguindo na casa dos 9% a 10%, fazendo com que a taxa de juros continue elevada. Tem tanto um arrefecimento da economia pela elevação dos juros, quanto uma diminuição do poder de compra por causa da inflação”, diz Leite.

E o PIB?

A economia brasileira deu sinais de melhora no começo do ano, enquanto a PEC promete dar um novo impulso no crescimento do consumo no segundo semestre.

O Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil cresceu 1% no 1º trimestre, ante os três meses anteriores, chegando a R$ 2,249 trilhões. Foi o terceiro resultado positivo seguido, depois do recuo de 0,2% no segundo trimestre de 2021. O avanço, porém, foi menor que no 1° trimestre do ano passado, de 1,1%.

De acordo com o último Boletim Focus, do dia 25 de julho, a expectativa do mercado é de uma alta maior do PIB neste ano, projetando que a economia cresça 1,93%, mas, para o ano que vem, a estimativa foi levemente reduzida, passando de uma alta de 0,50% para 0,49%.

Sung destaca que a atividade econômica surpreendeu no primeiro semestre e que, para a próxima metade do ano, a perspectiva é de arrefecimento, diante dos efeitos da elevação dos juros e da alta inflação. Porém, segundo ele, a retomada do mercado de trabalho e as medidas fiscais, como a PEC dos Auxílios, darão um novo fôlego no terceiro trimestre. 

O economista explica que a PEC mira beneficiar o consumo das famílias, por isso, é possível que os setores de comércio e serviços sejam os mais beneficiados.

A Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) projeta que a PEC dos Auxílios deve injetar R$ 16,3 bilhões no comércio varejista, com os ramos de hiper, super e minimercados, combustíveis e lubrificantes e as lojas de tecidos, vestuário e calçados sendo os mais beneficiados.

“Esse cenário, somado à contínua retomada do setor de serviços, deve levar a uma nova alta do PIB, de 0,6% no terceiro trimestre, ante o trimestre anterior. Para os últimos três meses do ano, enxergamos estabilidade. Juros altos, inflação disseminada e esgotamento dos benefícios da reabertura da economia devem impactar a atividade. Por fim, a massa de renda real também deve apresentar estabilidade. Para 2022, nossa projeção para o PIB é de 2%”, diz Sung.

Já para 2023, o economista-chefe da Suno Research diz que o cenário é mais desafiador. Segundo ele, a expectativa é de crescimento para o país é de 0,5%. 

“Há muitas incertezas no cenário e 2023, vai depender da gestão econômica do governo eleito, independentemente se for o atual ou a oposição. O grande problema será a questão fiscal, que, se for resolvida, pode trazer um impulso adicional, ou as perspectivas podem piorar”, afirma Sung.

Contas públicas x risco fiscal

Notas de 200 reais
Notas de R$ 200. Crédito: REUTERS/Adriano Machado

Por ser uma PEC e o valor orçamentário não precisar estar no limite do teto de gastos, Sung avalia que o gasto extra em si, de R$ 41,25 bilhões, causa impactos negativos sobre as contas públicas, mas em menor magnitude. Segundo ele, o maior problema está na falta de compromisso com a gestão do gasto público brasileiro. 

“Essa sinalização gera preocupação no mercado. Não é de hoje que isso começou. Quanto menor a responsabilidade fiscal, maior risco para o país no futuro. Isso vai exigir um prêmio de risco maior aos investidores para emprestar ao governo brasileiro. Além, é claro, de um câmbio mais desvalorizado impactando a inflação e, consequentemente, os juros”, valia Sung. 

O economista diz ainda que os auxílios foram criados no pior cenário possível, sem uma contraparte de financiamento, e em um contexto de aumento da arrecadação por questões conjunturais, como a inflação e arrecadação vindo do setor de commodities, e que não devem se manter, como hoje, no ano que vem.

Na mesma linha, Piter Carvalho também destaca que o risco fiscal é a principal preocupação do mercado.

“O governo já deixou de lado o plano de pagar a PEC dos precatórios, ainda tem os gastos do orçamento secreto, fundo eleitoral e outras benesses que vem fazendo sem se preocupar com os próximos anos. E tudo isso tem um preço, que é a alta do risco fiscal do país e os impactos são o dólar e taxa de juros para cima, juros esses que vão deixando a dívida do Brasil cada vez mais cara”, destaca Carvalho.

O economista da Valor Investimentos avalia ainda que o governo não fez a “lição de casa”, como as reformas administrativa e tributária, e ainda continua gastando, fazendo com que o orçamento fique sem espaço para ajudar aos mais necessitados.

“Agora fica o desafio de ajudar aos mais necessitados, que ficaram no ‘fim da lista’’. O governo não está olhando tudo, apenas onde ele pode sair ganhando. A PEC se mostra como medida eleitoreira, já que o governo não mostrou muita ajuda à população nos últimos anos e resolve abrir agora o pacote de bondade, justamente quando ele precisa, quando tem eleições”, defende o economista da Valor Investimentos.

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