Ainda hoje os números impressionam: são mais de 8 bilhões de buscas por dia no Google (GOGL34) e cerca de 90% de participação de mercado. É uma grande dominância.
Contudo, o modelo de receita da empresa, baseado na venda de propaganda online para anunciantes, está extremamente ameaçado. Os desafios são grandes com a crescente adoção da inteligência artificial generativa, queda dos cookies de rastreamento, além da competição pelas verbas de anunciantes com redes sociais como Facebook (FBOK34) , Instagram e TikTok, além de varejistas online como a Amazon (AMZO34).
Assim como já disputou vários setores para se tornar líder, minha predição é que, mesmo mantendo a liderança nos próximos três anos, o Google perderá parte desta participação de mercado.
Teoricamente, a disrupção acontece quando vemos a troca de participação de mercado entre empresas tradicionais em um setor para novos entrantes. Nesse sentido, o Google já foi o disruptor em vários negócios. Em 2006, por exemplo, o Internet Explorer da Microsoft (MSFT34) detinha 80% do mercado de navegadores, mas então, em 2008 o Google Chrome foi lançado e, até 2014, já havia alcançado 20% de participação no mercado.
Alguns anos depois, em 2018, o Google Chrome tinha a liderança com 60% de participação de mercado, enquanto a da Microsoft Internet Explorer encolheu para cerca de 16%.
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No entanto, em mais um episódio da disputa entre esses gigantes da tecnologia, parece que a Microsoft está prestes a ter sua revanche sobre o Google, e o ponto de alavancagem é a inteligência artificial com a Open AI, dona do Chat GPT.
Isso porque a Microsoft é o maior acionista da Open AI, seu maior financiador e principal parceiro de tecnologia, com investimentos de US$ 13 bilhões feitos na empresa desde 2019 – e houve momentos em que preço de suas ações disparou mais de 30% desde o lançamento do Chat GPT.
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De acordo com matéria publicada pela Bloomberg e divulgado em notas públicas, a Microsoft estima que sua receita com recursos baseados na Open AI pode chegar a US$ 99 bilhões até 2027, algo como adicionar três Netflix (NFLX34) na segunda empresa de capital aberto mais valiosa do mundo.
As maiores ameaças ao modelo de negócios do Google
A maneira como gosto de descrever o modelo de negócios do Google é simples: as principais partes interessadas são os usuários finais dos seus produtos e os anunciantes.
Os usuários, como nós, aproveitam a ampla oferta de produtos e serviços do Google, muitos deles de graça. Mas, para viabilizar isto, a empresa conta com a grande audiência de usuários e dados gerados ao navegarmos no Google, Gmail, Youtube e Google Maps, por exemplo, e que é atraente para os anunciantes gastarem suas verbas em anúncios.
Os anunciantes são especialmente atraídos pelo Google por sua capacidade de combinar anúncios com usuários de maneira direcionada, com base em dados individuais coletados para cada usuário. Seus principais concorrentes são Facebook Meta, Apple, Microsoft e Amazon. Mas tradicionalmente a rivalidade tem sido entre Facebook Meta e Google, que até poucos anos atrás capturaram basicamente todos os novos gastos com anúncios digitais.
Vale observar que essa não é a única briga: a nova disputa agora é a ameaça de inteligência artificial para o mecanismo de busca e modelo de receita do Google.
Modelo ameaçado: 3 fases
Ao tentar organizar o pensamento, classifico a ameaça ao modelo do Google em três fases. A primeira delas é o crescente uso de redes sociais para fazermos busca, como consumidores online – assim como milhares de pessoas, eu também uso cada vez mais o Instagram para buscar informações sobre empresas, serviços, restaurantes, experiências e pessoas.
A segunda fase é o que chamamos de Retail Media, muito impulsionado pela Amazon que, em 2022, atingiu US$ 38 bilhões em receitas de propaganda. Os varejistas começam a entender que seus clientes têm histórico, dados proprietários, propensões e a atenção de consumidores, então, muitos começam a vender essa atenção como propaganda online em seus canais.
Para citar alguns exemplos, a RaiaDrogasil (RADL3) lançou uma unidade de negócios, a RD Ads, focada em Retail Media, e Magazine Luiza (MGLU3) também fez aquisições para fortalecer seu negócio de venda de propaganda online, entre tantos outros que passam a competir com o Google por verbas dos anunciantes.
Só para se ter uma ideia, o total arrecadado pela Amazon com propaganda é quase cinco vezes mais do que o Google arrecada com propagandas pela sua plataforma de vídeo, o Youtube.
A terceira e última fase é a crescente adoção da inteligência artificial generativa, como o Chat GPT, da Open AI, como mecanismo de busca.
As novas formas de pesquisa impulsionada pela inteligência artificial generativa são mais centradas no interesse dos consumidores. No Chat GPT ou próprio Google Bard, não se vê tanta propaganda e ela já faz a curadoria, consolidando informações para poupar um tempo de navegação que no Google Search seria maior, com páginas de anunciantes que te distraem, e obtendo uma visão mais organizada da resposta baseada na sua busca.
Resumo da história: na minha visão, o desafio para o Google passa pelo fato de que grande parte da nossa navegação online está cheia de anunciantes e somos por vezes direcionados a eles. É um modelo “business-to-business” de receita originada pelo relacionamento e verbas do Google com outras empresas, mas justificado pelo até então domínio da atenção dos consumidores em termos de tempo e audiência gastos nas suas plataformas.
O argumento dos executivos de liderança da empresa é que a receita da propaganda online cobrada de anunciantes permite tornar muitos dos serviços gratuitos aos consumidores, e tem seu lado bom. Mas vale destacar a competição entre mecanismos de busca e o declínio do uso de cookies de rastreamento usados pelas plataformas para oferecer propaganda direcionada com o monitoramento das nossas informações de navegação e preferências.
De uma forma ou de outra, mesmo tendo a Google Bard concorrendo com Chat GPT, a empresa precisará mudar seu modelo econômico tradicional conforme pessoas migram de buscas feitas na ferramenta tradicional de search para o Google Bard, o que ao longo do tempo pode ter consequências para a sua receita no modelo atual.
Vale lembrar que o buscador Bing, da Microsoft, por ter pouca participação de mercado, pode arriscar mais ao incorporar soluções de inteligência artificial generativa da Open AI do que o Google com o Bard. Quero dizer que a Microsoft tem pouco a perder no modelo de receita do Bing, ao contrário do Google. A Microsoft ainda busca incorporar mecanismos de inteligência artificial no Microsoft Office, plugando com PowerPoint, Word e assim por diante.
Posso estar errado, mas a minha predição é de que há grandes chances de que o Google perca participação de mercado de maneira rápida nos próximos três anos, apesar de provavelmente continuar na liderança.
Será que o disruptor vai ser disruptado e a Microsoft terá sua revanche? A questão que fica é: qual o futuro do Google no mecanismo de busca?
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