O ecossistema digital da Centauro (SBFG3) deve revolucionar o negócio da marca e o mundo do esporte. O que é uma informação são valiosa para os investidores analisarem as ações da organização.
Desde 2016, Pedro Zemel, presidente do Grupo SBF, dono da Centauro, fala sobre criar um ecossistema de esporte e aumentar a profundidade da relação com os clientes.
Para isso, a empresa, que antes só vendia no varejo físico, adicionou canais digitais, como e-commerce e plataformas próprias. A Centauro tem buscado também integrar seus canais físicos e digitais com estratégia multicanal e omnichannel.
Mais recentemente, o grupo se mostrou interessado em atuar como uma plataforma que reúne vários parceiros conectados. Mas os planos são ousados, a Centauro não quer apenas ter sua plataforma para a venda de artigos esportivos, como serviços e tudo que envolve o esporte. Em outras palavras, ela quer construir um ecossistema.
Mas, afinal, o que significa ser um ecossistema? Apesar do termo estar na moda, o conceito de ecossistema foi adaptado para o mundo dos negócios em um artigo de 1993, publicado na revista Harvard Business School.
A ideia é simples: uma empresa deve ser vista não só como membro do setor que atua, mas sim de um ecossistema de negócios de diferentes setores, indústrias e categorias que coexistem para oferecer soluções completas aos clientes.
Atualmente, os avanços tecnológicos e a aceleração da inovação digital nos negócios permitem quebrar as fronteiras entre empresas de diferentes áreas para colaborarem, coexistirem e competirem num ambiente digital, único e conveniente para o consumidor
A Apple (AAPL34), por exemplo, em vez de tentar desconstruir o sistema existente de pagamento, em 2014, anunciou o lançamento do Apple Pay em um trabalho conjunto com bancos, varejistas e empresas nas redes de pagamento. A função do Apple Pay foi de combinar o software, hardware e serviços para criar a experiência de pagamentos pelo smartphone.
A principal motivação da Apple neste caso foi oferecer serviços adicionais para clientes que tinham o iPhone. Sabendo da importância dos dados de transação para outros agentes do ecossistema, ela facilita para que bancos e varejistas tenham os dados dos consumidores que usam o Apple Pay para completar suas transações.
Agora voltando para o grupo SBF, a Centauro quer conectar a oferta de produtos e serviços com atletas, treinadores, clientes, fãs que acompanham jogos esportivos e até profissionais da saúde.
Como parte da construção desse ecossistema, vale destacar dois grandes movimentos da empresa. O primeiro, em dezembro de 2020, com a aquisição da NWB, uma das maiores empresas de entretenimento esportivo online do Brasil, por R$ 60 milhões. O que representou um passo importante para que o pilar de conteúdos do esporte potencialize a oferta de produtos e serviços no setor.
A NWB é detentora de canais do YouTube, como Desimpedidos, Acelerados, e Falcão 12, do ex-jogador de futsal. O grupo acumula mais de 10 bilhões de visualizações e de 150 milhões de seguidores em suas plataformas.
A aquisição de marketing de conteúdo tem ainda como objetivo reduzir o valor gasto para a atração de novos consumidores.
Outro benefício é que, via audiência dos canais da NWB, o Grupo SBF pode conhecer melhor o comportamento do consumidor de esportes. O que permitirá pensar em oportunidades para construir um ecossistema cada vez mais customizado, de acordo com os interesses para engajar o consumidor.
O segundo movimento da empresa também aconteceu em 2020, pouco antes da pandemia, quando o Grupo SBF adquiriu todos os contratos e ativos da Nike do Brasil por R$ 1 bilhão. Assim, tornou- se a operadora do canal de e-commerce da Nike e das suas lojas físicas.
Desde 2016, a Centauro vem construindo os passos dessa transformação, ao mesmo tempo em que concilia crescimento e rentabilidade, digitaliza o negócio e desenvolve o ecossistema de esporte de maneira cadenciada.
Desafios para desenvolver o ecossistema digital
Em todo negócio há uma série de variáveis incontroláveis que podem ameaçar a estratégia. As mudanças impostas pelas medidas de isolamento social com a pandemia atingiram a Centauro em um momento muito sensível de transição.
No curto prazo, ainda em 2020, a empresa anunciou a redução de custos. Em 2021, vemos uma recuperação dos resultados, o que poderá permitir que a gestão retome e acelere os planos para se tornar um ecossistema.
No terceiro trimestre de 2021, a receita bruta foi de R$ 1,9 bilhão, mais do que o dobro da receita do mesmo período de 2019. Já no lucro líquido, a companhia atingiu R$ 110 milhões, o que corresponde a três vezes o valor do mesmo período de 2019, marcado pelo crescimento das vendas nas 224 lojas físicas, na sua plataforma digital e da operação da Nike.
Agora, a Centauro precisa saber a hora de acelerar sua plataforma e selecionar os tipos de parceiros que estarão lá. Será necessário muito cuidado para não atropelar os passos, afinal, apesar de ter digitalizado o negócio, ainda precisa buscar aumento nas vendas por meio dos seus canais digitais e atrair parceiros independentes. Sem essa busca bem-sucedida, não haverá o crescimento pelo efeito de rede, que é necessário para um ecossistema digital.
A Centauro deve aumentar mais rapidamente a participação dos canais digitais, que hoje está por volta de 28%, preservando a boa experiência do cliente e o lucro. Dessa forma, terá boas chances de crescer por ser uma empresa especialista em esporte concorrendo com outras generalistas, que são multicategorias.
Nos Estados Unidos, muitas empresas encontraram maneiras de se especializar em uma vertical mais específica, desenvolver um ecossistema e obter melhores níveis de engajamento do consumidor do que as generalistas.
Para as generalistas, o esporte é apenas mais uma vertical de negócio, como no caso da Amazon (AMZO34), Mercado Livre (MELI34) e Magalu (MGLU3). Apesar disso, vale lembrar que a Magalu comprou a Netshoes, que é especialista no setor e tem um canal de conteúdo no esporte.
Assim como Centauro em esporte, a Raiadrogasil quer integrar serviços e produtos em um ecossistema de saúde. A Arezzo & Co (ARZZ3) quer desenvolver um ecossistema de moda, o Magazine Luiza quer desenvolver um ecossistema no varejo, a Bayer, de agronegócio, a Porto Seguro (PSSA3) de seguros e finanças, e assim por diante.
É preciso, agora, acompanhar como o Grupo SBF, com a Centauro, poderá prosperar em um ecossistema cada vez mais digital e negócios em plataformas digitas integradas com a operação física no varejo.
*Leandro Guissoni é Ph.D., professor de estratégia no Brasil e Estados Unidos, empresário, palestrante e autor de livros, artigos e casos de empresas por Harvard. Assessora grandes empresas em inovação digital e analytics. |
As informações desta coluna são de inteira responsabilidade do autor e não do InvestNews e das instituições com as quais ele possui ligação.
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