O crescimento de 1,2% do Produto Interno Bruto (PIB) do primeiro trimestre foi o primeiro resultado em vários meses sem o combustível do auxílio emergencial. Retomado apenas em abril deste ano, o benefício impulsionou boa parte da recuperação da economia em 2020, mas, para este ano, os economistas esperam um cenário diferente.
O primeiro motivo é a dimensão do programa, que neste ano terá valor menor e será direcionado a menos pessoas. Em 2020, o governo destinou R$ 290 bilhões ao auxílio emergencial. Para este ano, a previsão é de cerca de R$ 44 bilhões.
Os efeitos do novo auxílio devem ser percebidos nos dados do PIB a partir do segundo trimestre. “O programa é bem menor que o do ano passado. Mas, de qualquer maneira, ele ajuda. O comércio tem efeito multiplicador, acaba movimentando a indústria, gerando mais empregos”, comenta Orlando Assunção, professor do curso de economia da FAAP.
“Vai ajudar, porém não no mesmo grau de relevância que foi no ano passado”, concorda Ricardo Jacomassi, sócio e economista-chefe da TCP Partners.
Outro motivo apontado para a expectativa de impacto menor do auxílio em 2021 é a vacinação já iniciada, o que não estava no horizonte no ano anterior. Mais do que a ajuda financeira para parte da população, a imunização é apontada como a força motriz que deve possibilitar uma retomada mais robusta da economia, segundo os especialistas ouvidos pelo InvestNews. “Ela é sem dúvida o fator chave, determinante para a recuperação da economia”, afirma Jacomassi.
“O consumo poderia ser melhor se tivesse a manutenção do auxílio. Mas a verdade é que eu gostaria de ver a economia não depender do auxílio. O avanço da vacinação e a reabertura da economia mais do que compensariam a ausência de qualquer auxílio emergencial”, analisa Assunção.
“O grande problema da vacinação é o ritmo lento, assim como ocasionais interrupções por falta de insumos”, complementa Matheus Albergaria, professor da Fecap. “A analogia que tenho feito é que você pode pensar na vacinação no Brasil como alguém andando de bicicleta. O problema é que o vírus está se adaptando e tem uma velocidade de disseminação bem maior. É como se uma bicicleta estivesse correndo atrás de um avião a jato”, compara o economista.
Quem vai puxar o PIB?
O consumo das famílias representa cerca de dois terços do PIB – ou seja, o gasto dos consumidores é um fator primordial para a economia brasileira crescer. Nesse cenário, em 2020, o auxílio emergencial evitou que a queda de 5,5% no consumo fosse ainda maior. O PIB caiu 4,1% no ano passado.
Já no primeiro trimestre de 2021, o consumo das famílias caiu 0,1% na comparação com os três meses anteriores e 1,7% sobre o mesmo período de 2020. Enquanto o consumo não ganha força para puxar a recuperação, a expansão do PIB nos primeiros meses do ano foi alimentada pelo comércio exterior.
Segundo os dados do Instituto Brasileiro de Geografia Estatística (IBGE), as exportações cresceram 3,7% no primeiro trimestre, impulsionando a economia. Em um cenário de alta dos preços das commodities e melhora na demanda externa, a Agropecuária puxou o PIB ao registrar alta de 5,7%, enquanto Serviços subiu 0,4% e a Indústria, 0,7% – esta última em um movimento puxado pela atividade de extração.
Diante desses resultados, Alex Agostini, economista-chefe da Austin Rating, comenta que esse movimento da economia não permite que a população sinta a melhora de maneira mais nítida. “A gente percebe que existe um certo descompasso entre o que a gente vive na economia do dia e a dia e o que o país vive voltado ao mercado externo”, afirma ele.
Olhando para o restante do ano, Albergaria vê o cenário com preocupação. “As exportações provavelmente não irão aumentar o suficiente para compensar no consumo das famílias”, diz o economista, que também não vê perspectivas sólidas de aumento dos investimentos e gastos do governo, outros componentes do PIB pela ótica da demanda, para segurar um crescimento forte do PIB de 2021.
“O consumo das famílias caindo hoje é o PIB caindo lá na frente”, pontua Albergaria.
Assunção também não acredita que o consumo das famílias seja o fator de impulso da retomada econômica neste ano – mesmo com o auxílio emergencial. “Sobre o auxílio, já está havendo discussões se pode ter uma prorrogação a partir de julho. Tudo vai depender dos valores envolvidos, mas, se não tiver dinâmica, a economia vai ficar concentrada numa força motriz do comércio exterior, com boas perspectivas de exportação de bens e serviços pela retomada mundial, especialmente Estados Unidos e China.”
Jacomassi explica que, a despeito da retomada do auxílio emergencial, em 2021 o consumo enfrenta desafios que não estavam presentes no ano anterior. “Com a retirada do auxílio e a demora na recuperação do emprego, as famílias tiveram ainda um desafio que até então estava longe do radar: a inflação, que acabou tendo uma crescente perigosa. Quando você olha o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo), você vê uma inflação em torno de 6%. Se a gente for comparar, no ano passado estava em torno de 2%.”
Ainda falando sobre a retomada do consumo e seu impacto nos próximos resultados do PIB, o economista diz: “enquanto nós tivermos uma inflação persistente e taxa de desemprego que não mostra tendência de queda, as famílias vão continuar pressionadas. Eu não vejo estímulo forte por parte do consumo das famílias nos próximos trimestre.”
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