A digitalização do dinheiro já é uma realidade no Brasil: menos de 3% das transações no país é na forma de papel moeda. Diante disso, o Banco Central já prepara terreno para o real digital, batizado de Drex.
Neste cenário, bancos centrais ao redor do mundo buscam criar moedas digitais, que podem trazer diversos benefícios tanto para o sistema financeiro de cada país como para os consumidores. O Banco Central do Brasil é um deles.
Em agosto de 2020 o BC organizou um grupo de trabalho para estudar a emissão de uma moeda digital brasileira que incluiu representantes de todas as suas áreas. A partir de resultados preliminares, foi criado um fórum para discutir o tema com o corpo técnico do BC. A iniciativa resultou na publicação das diretrizes do real digital, em maio de 2021.
Em março de 2023 foi iniciado o projeto piloto do real digital, que consiste em uma fase de testes para operações com a moeda em um ambiente simulado, sem envolver transações ou valores reais. Ela acontecerá em uma plataforma que permite o registro de vários tipos de ativos financeiros.
Veja abaixo os principais pontos sobre o real digital:
O que é real digital ou Drex
O real digital será a versão digital oficial da moeda brasileira, o real, e será apenas uma forma diferente de representá-la. O real digital poderá ser convertido para qualquer outra forma de pagamento disponível – como depósito bancário convencional – e também utilizado para pagamentos do dia a dia.
O objetivo é que o usuário do real digital possa fazer pagamentos em lojas, seja por meio de seu banco, instituição de pagamento ou outra que venha a ser autorizada pelo BC, ou mesmo através do Pix.
O consumidor também poderá também transferir reais digitais para outras pessoas, transformar suas moedas digitais que estarão em custódia de um banco em depósito bancário convencional; e pagar contas, boletos e impostos.
Ou seja, a ideia é que o usuário movimente seus reais digitais da mesma forma que movimenta o seu dinheiro depositado nos bancos.
Origem do nome Drex
De acordo com a autoridade monetária, a criação da moeda digital de banco central (em inglês, Central Bank Digital Currency – CBDC) viabilizará um ambiente seguro e regulado para a geração de novos negócios e o acesso democrático por cidadãos e empreendedores.
“A combinação de letras forma uma palavra com sonoridade forte e moderna: ‘d’ e ‘r’ fazem alusão ao Real Digital; o ‘e’ vem de eletrônico e o ‘x’ passa a ideia de modernidade e de conexão”, disse o BC em nota.
Para que serve o real digital?
A moeda digital permite movimentar reais que não existem fisicamente, o que implica na diminuição de custos de emissão da moeda física e facilita a implementação de inovações tecnológicas.
A expectativa é que a moeda possa ser operada em todos os métodos de pagamento já existentes, bem como se conecte a outros bancos centrais ao redor do mundo.
O BC não vislumbra que o real digital possa ter forte impacto sobre o dinheiro em espécie, ao menos no curto e médio prazo. A ideia é que ele seja um complemento do papel-moeda.
Em resumo, os principais objetivos objetivo do real digital são:
- Facilitar transações
- Reduzir custos, entre eles o de emissão de papel-moeda;
- Simplificar o rastreio do dinheiro;
- Incentivar a concorrência entre instituições financeiras ao cobrar taxas menores para realização de operações;
- Incluir mais pessoas no mercado financeiro;
- Fomentar a inovação: será possível criar novos usos para a moeda dentro de sua estrutura digital;
- Dar agilidade às transações: as operações poderão ser confirmadas em segundos, como ocorre no PIX;
- Proporcionar mais segurança: a estrutura da nova moeda poderá usar tecnologias como a blockchain, considerada um dos meios mais seguros para realizar transações pela internet
- Dar maior privacidade a dados, reduzindo ataques e fraudes
Como vai funcionar o Drex?
O Banco Central irá produzir, regular e emitir a moeda, assim como faz com o papel-moeda. A moeda digital será distribuída por bancos, instituições financeiras e de pagamento.
Como acontece com o papel-moeda, a política monetária será a base de sustentação do valor do real digital. Ou seja, quando o BC movimentar a liquidez da economia, com o objetivo de garantir a estabilidade do valor de compra do real, a quantidade de reais digitais em circulação será levada em conta.
O real digital será recebido por meio de códigos distribuídos pelo Banco Central. Os códigos serão armazenados em uma carteira digital, que será oferecida por bancos e outros agentes autorizados pela autoridade monetária.
Quem poderá usar o real digital?
O real digital deverá ter dois formatos: um de atacado e outro de varejo.
Uma CBDC (Central Bank Digital Currencies, que significa moeda digital emitida pelo Banco Central) de atacado é voltada apenas para transações de elevados valores. Normalmente elas acontecem entre participantes do sistema financeiro – bancos, cooperativas, instituições de pagamento etc – e, eventualmente, grandes empresas.
Já uma CBDC de varejo é voltada para atender às necessidades de pagamento e liquidação de indivíduos e empresas de todos os portes, podendo ser utilizada para pagamentos e para operações financeiras cotidianas em quaisquer faixas de valores.
Ou seja, qualquer brasileiro ou empresa poderá usar o real digital: bastará que esteja conectado à internet.
É possível que nem mesmo seja necessário ter uma conta no banco. Contudo, o Banco Central considera importante manter a parceria com o setor privado como forma de proporcionar liquidez ao mercado. Portanto, prevê a coexistência entre o real digital e moedas privadas emitidas por instituições reguladas em plataforma de pagamentos inteligentes.
Outra solução analisada é que as instituições financeiras possam transformar os depósitos que recebem em tokens capazes de oferecer novos serviços prestados na plataforma desenvolvida para a operação do real digital.
Quando o real digital será lançado?
O Banco Central planejava lançar o real digital até o final de 2024, mas pode haver alterações no cronograma. Somente a partir daí a moeda poderá começar a receber depósitos tokenizados – ou seja, permitir a conversão de ativos reais para digitais.
Os ativos que serão usados no projeto piloto serão:
- Depósitos de contas de reservas bancárias, de contas de liquidação e da conta única do Tesouro Nacional;
- Depósitos bancários à vista; contas de pagamento de instituições de pagamento;.
- Títulos públicos federais
Participam do projeto piloto instituições autorizadas, com acesso direto a contas e passivo digital do BC; usuários simulados, por meio de depósito tokenizado, e a Secretaria do Tesouro Nacional (STN), que irá emitir títulos públicos federais e liquidá-los por meio de uma conta pagamento.
O Drex é uma criptomoeda?
A nova moeda poderá ser classificada como uma Central Bank Digital Currency (CBDC), que significa, em tradução livre, moeda digital do Banco Central. Ou seja, ela é uma moeda pública e transacional alternativa, e não uma criptomoeda.
Diferente desses ativos, criptomoedas passam por mineração, são privadas e não são reguladas por Bancos Centrais. Além disso, a natureza das moedas virtuais é ser um ativo. Portanto, ela não tem todas as características fundamentais para ser considerada também uma moeda, como a possibilidade de ser usada como meio de troca, reserva de valor e também unidade de conta.
Além disso, criptomoedas, como bitcoin e ethereum, apresentam uma grande volatilidade, o que dificulta seu uso como meio de pagamento. Já criptomoedas da categoria de stablecoins buscam corrigir esse problema atrelando seu valor a algum ativo de fora do ambiente cripto, em geral a uma moeda soberana. Em ambos os casos os detentores desses ativos enfrentam riscos operacionais, jurídicos e de mercado.
Já o real digital é uma expressão da moeda soberana brasileira. Em um ambiente seguro, empreendedores poderão implantar inovações enquanto os consumidores poderão ter acesso às vantagens tecnológicas trazidas por essas ferramentas.
Quanto valerá R$ 1 digital?
O real digital ou Drex terá o mesmo valor do dinheiro real. Ou seja, R$ 1 será equivalente a R$ 1 digital. A ideia é que seja apenas uma forma de representação diferente da moeda original. Portanto, não terá um valor diferente.
Qual a diferença do Drex para o PIX?
O projeto-piloto do Banco Central está sendo comparado ao PIX. Isso porque, assim como o pagamento instantâneo brasileiro, as trocas de moeda entre consumidores poderão ser feitas de forma imediata, por meio da tokenização.
Enquanto o PIX é um sistema de pagamento já em vigor no país, o real digital será uma moeda alternativa, ainda em implementação. Portanto, ela irá coexistir com o PIX, e não anulá-lo.
O PIX é uma operação eletrônica instantânea. Já o real digital não é uma operação, mas, sim, uma moeda.
Enquanto o PIX precisa ser intermediado por bancos, o real digital não necessariamente terá de passar por essa autenticação: bastará que esteja incluído em uma carteira digital para que seja transacionado, como ocorre com as criptomoedas.
Existe outra diferença entre o real digital e o PIX: como uma moeda, a CBDC poderá ser usada em larga escala, inclusive em operações entre grandes empresas e instituições financeiras. Já o PIX somente pode ser operado entre pessoas físicas, empreendedores e pequenas empresas.
O que é o PIX offline?
Está em desenvolvimento uma funcionalidade offline para que as transações via Pix possam ser feitas mesmo em locais que estejam sem conexão com a internet.
A informação foi confirmada pelo presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto. Para que a funcionalidade seja possível, são estudadas três alternativas: a mais segura é o uso de um cartão aproximação, que poderá ser carregado pelo usuário.
Vantagens do real digital
Uma das vantagens do real digital é que ele reduzirá a emissão de papel moeda.
A moeda alternativa também poderá ser usada em qualquer lugar do mundo. Ou seja, não haverá necessidade de que seja convertido em outras moedas, já que o pressuposto é que tenham a mesma cotação.
Assim como o PIX, o real digital poderá ter a capacidade para realizar operações online e eventualmente operações offline.
O real digital também irá inibir a lavagem de dinheiro ao permitir que as operações sejam rastreadas.
Pagamentos e remessas internacionais de pequenos valores, que hoje são em muitos casos inviabilizados devido aos custos de transação, poderão se tornar ágeis e baratos.
Outra facilidade que o real digital pode permitir é a criação de contratos inteligentes. Ou seja, será possível programar pagamentos em TVs ou realizar pagamento de pedágios de forma automática.
A nova moeda poderá permitir ainda a oferta de produtos personalizados a um custo não proibitivo. Esses produtos personalizados podem suprir necessidades de microcrédito de pequenas comunidades ou ampliar o acesso a contratos de financiamento personalizados que se adequem à geração de fluxo de caixa de pequenos negócios.
Por fim, será possível criar serviços financeiros geridos por um software com base no conceito de finanças descentralizadas (DeFi). A tecnologia permitirá, por exemplo, a realização de empréstimos entre pessoas, com cobrança de juros.
Exemplos de países que usam esse moeda digital
Segundo dados do Banco Central, mais de 80 países têm projetos de CBDCs, entre eles a China, Estados Unidos e Índia.
A mais avançada é a do yuan digital, na China. Os testes da moeda, que funciona por meio de uma rede de blockchain privada controlada pelo governo do país, vêm sendo expandidos. A pesquisa em torno da criação da moeda digital foi iniciada em 2014.
O yuan digital foi desenhado para ser transacionado em operações nacionais e internacionais e ser mais rápido e barato do que outras operações existentes no mercado financeiro local. A tecnologia permite realizar transações entre dois aparelhos que estejam offline.
Apesar de existirem rumores sobre uma provável CBDC nos EUA desde 2021, apenas em 2022 passado o presidente Joe Biden assinou uma ordem executiva apoiando o desenvolvimento de ativos digitais. Em novembro de 2022, o Federal Reserve de Nova York iniciou um projeto piloto no qual bancos comerciais poderiam emitir tokens fungíveis que representariam depósitos de clientes.
Na zona do euro, o Banco Central Europeu se posicionou, em 2019, de que iria estudar a criação de uma moeda digital, que permitiria à população continuar a usar o dinheiro emitido pela autoridade monetária mesmo que a circulação do papel moeda continuasse a diminuir. Desde então, a autarquia começou a pesquisar o tema, assim como o Banco Central do Reino Unido.
Também no ano passado a Índia anunciou seu projeto da rúpia digital. O projeto piloto foi lançado em novembro. Espera-se que a moeda digital seja utilizada em transações nacionais e no exterior.
A Bahamas anunciou, em 2020, a criação do sand dollar, sua moeda digital.