O potencial de diversificação sempre foi um dos maiores atrativos para investimento em cripto. Com baixa correlação frente às demais classes de ativos – além do histórico de valorização -, o Bitcoin e os demais criptoativos apresentam uma importante ferramenta para melhorar a relação risco/retorno das carteiras de investimento.
No entanto, os criptoativos têm correlação historicamente alta entre si. O Bitcoin e o Ethereum, por exemplo, geralmente respondem de forma semelhante aos grandes eventos macroeconômicos e às notícias de maior peso para o ecossistema cripto – observadas, é claro, as diferentes sensibilidades do preço de cada ativo de acordo com a capitalização e a liquidez.
Os principais movimentos de preço do ecossistema parecem responder principalmente às percepções públicas sobre o Bitcoin, os riscos e o potencial disruptivo da tecnologia. Outros fatores que contribuem para os preços andarem juntos são os eventos que afetam o mercado como um todo.
A atenção que as stablecoins têm recebido dos reguladores dos EUA, por exemplo, é relevante para todo o ecossistema porque esses ativos são importantes fontes de liquidez e proteção contra volatilidade no mundo cripto. A inclusão de pagamentos com Bitcoin, Litecoin, Ethereum e Bitcoin Cash pela Paypal é outro caso interessante: além de abarcar diferentes criptoativos, a funcionalidade facilita o acesso e traz ainda mais uma validação institucional para o setor.
Vale notar que abrangência desses eventos explica a correlação entre o retorno dos ativos, ou seja, a congruência dos movimentos de curto prazo, mas não a interdependência das trajetórias de longo prazo. Analistas como Ryan Selkis, CEO da Messari, acreditam que o desenvolvimento das tecnologias e o crescimento da demanda contribuirão para o ‘descolamento’ dos criptoativos à medida que cada um acompanha seus próprios determinantes de valor.
Descolamento dos criptoativos
Charles Hoskinson, fundador da plataforma Cardano, acredita que o ‘descolamento’ das trajetórias de longo prazo está a caminho: investidores institucionais estão buscando diversificar suas apostas em cripto, o Bitcoin segue perdendo sua dominância na capitalização de mercado total do setor e os investidores passam a diferenciar até alguns detalhes técnicos de cada plataforma blockchain, demonstrando maior capacidade de identificar os determinantes de valor dos protocolos.
Segundo Hoskinson, para a consolidação desse processo, um fator relevante é a maturidade das soluções. À medida que as plataformas e suas aplicações passam a operar em escala suficiente para gerar um valor relevante e minimamente estável para os usuários e investidores, as decisões de investir podem ser mais baseadas na expectativa de criação de valor e menos nas especulações sobre o futuro da tecnologia como um todo.
Há outros motivos, além dos já mencionados, para que haja alguma correlação entre os criptoativos. Enquanto houver bitcoins sendo usados para financiar projetos cripto ou circulando em outras plataformas – como o Wrapped BTC no Ethereum ou outras soluções para a circulação de ativos cross-chain -, a criação de riqueza na rede Bitcoin vai contribuir para o crescimento desses projetos e suas aplicações.
No caso dos ativos de menor capitalização e volume, é comum que sejam negociados contra o Bitcoin e, em menor escala, o Ether. Isso também contribui para a congruência das trajetórias de preço. Mas tudo isso é bem diferente do antigo paradigma em que cripto era visto como um mundo relativamente homogêneo de soluções com blockchain.
Descolamento dos nichos de cripto
A crescente diversidade de aplicações de blockchain permite o florescimento contínuo de novos nichos no mercado cripto – de DeFi ao metaverso, passando pelos jogos online, plataformas de streaming, organizações descentralizadas… Enquanto cada nicho dá seus primeiros passos, as decisões de investir são motivadas principalmente pela expectativa de disrupção de mercados e de criação de novas economias.
Com o amadurecimento das tecnologias, dos modelos de negócios e da percepção de valor pelo público, os investimentos passam a ser embasados em métodos mais particulares. No meio de DeFi, por exemplo, hoje é possível valorar boa parte dos criptoativos com base nas expectativas de ganho a ser gerado para os seus detentores.
Os segmentos de jogos e metaverso, apesar de bastante recentes, parecem estar bem encaminhados na agenda do ‘descolamento’: os tokens desses segmentos resistiram, em boa parte, às quedas de maio e do final do ano, respectivamente, o que pode demonstrar que os investidores entendem a relativa independência dos determinantes de valor desses ativos em relação ao Bitcoin e ao resto do mercado.
O que esperar?
O mundo cripto é mais do que uma nova economia online: é um emaranhado de novas economias, cada qual com suas particularidades e sujeita a um conjunto de determinantes de valor, com níveis variáveis de interdependência entre elas. Com o amadurecimento desses setores, é de se esperar que evolua também a compreensão do valor de cada tipo de solução e, com isso, se desenhem trajetórias de preço mais independentes no longo prazo.
*Christian Gazzetta é economista formado pela UFRJ e redator da Hashdex, se dedica a aprender e ensinar sobre cripto desde 2017. Estuda métodos de valoração de criptoativos e os setores de DeFi e NFTs. |
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