O CDS (Credit Default Swap), título que funciona como uma espécie de seguro para operações de crédito no país e mensura o risco-Brasil, acumula um aumento de 18% em 2022 até agora. Em julho, o Brasil voltou a atingir máximas de percepção risco, chegando ao maior nível desde o final de abril de 2020, quando o país sentia dos primeiros impactos econômicos da pandemia de covid-19.
Isso significa que os investidores estão enxergando mais risco para colocar seu dinheiro no mercado do país. Quanto mais alto é o CDS, maior é o risco.
O cenário incerto fez o CDS chegar aos 468 pontos na segunda quinzena de julho deste ano, acumulando alta anual de 51% até aquele momento. Os número são do título com vencimento em 10 anos. Nesta segunda-feira (8), o indicador estava no patamar dos 367 pontos.
O aumento da percepção de risco reflete incertezas internas e o cenário externo. Além dos problemas locais, o mundo todo vem sofrendo com a alta da inflação. Até mesmo as principais potências mundiais têm tomado medidas mais rígidas com relação ao aumento da taxa de juros para amenizar o quadro, gerando um temor em massa sobre uma possível recessão global – já que juros mais altos inibem o consumo e, assim, tendem a segurar a alta de preços, mas também esfriam a atividade da economia.
Em julho deste ano, o Banco Central Europeu (BCE) elevou seus juros em 0,5 ponto percentual, primeiro aumento em 11 anos. Nos Estados Unidos, o Federal Reserve (Fed) também segue com seu ciclo de aumento de juros.
Idean Alves, sócio da Ação Brasil Investimentos, aponta que a comparação entre o prêmio por risco-país que está sendo pago no exterior, principalmente nos EUA, agora também na Europa e nos emergentes, é um dos fatores que têm influenciado este aumento do Risco-Brasil.
“À medida que o Fed ou o Banco Central Europeu forem aumentando os juros, a tendência é que os outros mercados tenham que acompanhar para que esse prêmio de risco valha a pena, principalmente para o investidor estrangeiro, e isso contribui para o aumento do custo de dívida local, o que acaba aumentando o risco”, explica ele.
Em outras palavras, com juros mais altos, os países se tornam mais atraentes para investidores. Quando mercados considerados mais seguros, como os EUA, elevam seus juros, investidores podem preferir tirar seus recursos de outros locais, como o Brasil. Para evitar essa fuga de capital, países considerados mais arriscados podem elevar suas taxas também.
Nesse cenário, existe ainda uma percepção de que juros mais altos comprometam a capacidade de pagamento de dívidas – o que também eleva a percepção de risco. “Já temos alta de juros lá fora e continua tendo alta da Selic aqui, sendo que a alta de juros por um tempo maior acaba também comprometendo a capacidade de pagamento da maioria dos devedores, por isso há um grande temor no mercado de que alguns não tenham como honrar compromisso, que foi o que aconteceu nos EUA”, acrescenta Alves.
Bruno Komura, analista da Ouro Preto Investimentos, pontua que o que mais tem influenciado a alta do CDS são os fatores locais, como o aumento do risco fiscal no país – ou seja, preocupações sobre a capacidade do governo de equilibrar seus gastos e honrar as dívidas.
“Vimos passar agora a ‘PEC kamikaze‘ (pacote de bondades), que eleva os gastos em R$ 40 bi até o final de dezembro, mas o principal problema é que gastos temporários no Brasil tendem a permanecer por um período mais longo do que o esperado, chegando até a se tornarem um gasto permanente. Esse é o maior medo do mercado”, alega.
“A gente já viu alguns candidatos dizendo que, se eleitos, esses gastos permanecerão, então isso quer dizer que R$ 40 bi para 6 meses se tornarão R$ 80 bi anuais. Esse é o risco fiscal que a gente vê”, completa Komura.
O analista ainda cita que o mercado já vinha reagindo mal desde a flexibilização do teto de gastos, no final de 2021, mas que em 2022 os investidores perceberam que não só haveria abandono da principal âncora fiscal, como também aumento dos gastos sob a forma de medidas consideradas populistas.
Pacote de bondades
O Senado aprovou há algumas semanas a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) conhecida como “pacote de bondades”, ou PEC kamikaze, que determina a concessão de benefícios em diversos âmbitos, apesar das regras que impedem essa prática em ano de eleições, o que gerou grande desconfiança no mercado com relação às contas do país.
Segundo informações do jornal “O Globo”, o montante das concessões anunciadas pelo governo de Jair Bolsonaro nos últimos meses já passa de R$ 343 bilhões.
Analistas alertam que as medidas podem gerar um impacto ainda pior ao cenário econômico do Brasil, já que, para que o Estado conceda esses benefícios sociais, é preciso uma contrapartida, uma fonte para financiar os gastos.
Alves, da Ação Brasil, acredita que o pacote de bondades irá piorar a percepção do fiscal do Brasil e comprometer a credibilidade do país. De acordo com o profissional, é possível que outras propostas percebidas como fora do contexto, criadas sem responsabilidade fiscal, apareçam até pouco antes da eleição.
“Isso, sem dúvida alguma, piora a questão fiscal, porque aumenta a capacidade de endividamento do emissor da dívida, mas também aumenta o risco dele não pagar, que foi muito do que aconteceu em economias da América Latina, por exemplo, que expandiram bastante seu balanço e, na hora que os compromissos foram aumentando, o risco também teve que aumentar, juntamente com os juros, e acabaram não tendo como pagar, algumas dando até calote, como no caso da Argentina”, comenta.
Comparação entre economias
O Brasil não é o único a enfrentar desconfiança de investidores. Mas alguns países de economia semelhante estão com indicadores de risco ainda mais alto.
“Olhe a África do Sul, por exemplo, que está com uma taxa de desemprego enorme, a Turquia, com uma inflação muito alta também, e com um BC que não vai subir os juros. A situação da Argentina acho que é ainda pior em relação aos nossos pares, e não está nem perto de estabilizar, porque nada tem sido feito. Quando olhamos outras economias como México e Colômbia, estamos muito próximos. A pior margem é a da Argentina, que tem espaço para piorar mais”, completa Komura.
“O nosso risco-Brasil não é dos melhores. Poderia ser bem melhor do que é hoje, mas, se compararmos com os demais países emergentes, o país está bem à frente dos outros e ainda não deixa de ser uma boa opção de investimento para quem busca investir em títulos de dívida com um bom prêmio“, complementa Alves.
Um dos motivos para isso, segundo ele, é o fato de o Brasil ter iniciado o mais recente ciclo de juros antes dos demais países. Para ele, o histórico de alta da inflação no país fez com que a situação fosse melhor administrada localmente.
“Começamos o aperto monetário já em março de 2021, e agora, como muitos dizem, já estamos em final de ciclo. O país já sofreu com inflação. Ainda sofre, mas nos últimos três meses ela já indicou um arrefecimento, o que acaba nos favorecendo”.
Nesse cenário, a economia local até recebeu certo fluxo de investidores estrangeiros, intensificado pela guerra na Ucrânia, já que muitos buscaram investimentos em commodities, e o Brasil é um de seus principais exportadores. Mas especialistas apontam que, por causa das últimas medidas adotadas pelo governo, as vantagens têm diminuído.
“Agora com esse problema de populismo, em que vemos o governo tentando implementar medidas para aumentar a quantidade de votos, a popularidade nas pesquisas, isso está deteriorando bastante a situação do país. Então, estamos ficando muito perto de outras economias emergentes”, argumenta Komura.
Já Alves pondera que, se o país quiser se tornar uma das primeiras opções de investimentos a nível global para os principais investidores, “precisa fazer muito dever de casa ainda”.
O que esperar da economia brasileira
Segundo os especialistas, para a população em geral, o impacto positivo dos benefícios do governo deve ser sentido pela população somente no curtíssimo prazo. Mais adiante, o cenário é mais preocupante.
“É quase uma política imediatista. Vemos esse alívio, dado que a atividade econômica não tem ajudado, tem muita incerteza em relação ao emprego, então os benefícios ajudam a população, mas a questão é que a conta virá, e ela vem no médio prazo. A partir de 2023, 2024, veremos uma inflação mais alta“, explica Komura.
“Por mais que tenha um efeito um pouco mais disperso ao longo do tempo, isso vai impactar o bolso das pessoas também, porque a inflação, querendo ou não, é perda do poder de compra e, geralmente, os salários não tendem a acompanhar”, complementa o analista.
Alves argumenta que a principal forma de reverter este cenário seria o maior respeito à responsabilidade fiscal no Brasil. Segundo ele, “para alguns, o teto de gastos virou apenas um indicativo de boas práticas, e não algo que realmente deva ser seguido à risca e cumprir pela saúde financeira do país”.
O que é Risco-Brasil?
Risco-Brasil representa uma série de indicadores que visam medir o sentimento do mercado com relação ao Brasil e que podem impactar a forma como os estrangeiros vêem os investimentos aqui.
Por meio do risco-país o investidor busca mensurar o quão arriscado é aplicar seu capital em determinado local. Elementos como oscilações do mercado e suas taxas, dívida pública ou tensões e conflitos políticos são alguns dos fatores analisados.
Esse risco pode ser avaliado por meio de alguns índices, sendo os mais utilizados EMBI, CDS e Rating.
O CDS (Credit Default Swap) é um título que funciona como uma espécie de seguro para operações de crédito no país. Em casos de inadimplência, aquele que possui o CDS é indenizado.
O EMBI (Emerging Market Bond Index), ou índice de títulos de mercados emergentes, em tradução livre, é utilizado para avaliar títulos e risco em países emergentes. No caso do Brasil (EMBI +Br), somente títulos de crédito emitidos nacionalmente são avaliados.
Já o rating é utilizado como uma nota que as agências de classificação de risco de crédito atribuem a uma empresa ou a um governo.
Quanto mais elevado o risco, mais o estrangeiro busca refúgios mais seguros para seu capital longe do país.
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