Finanças
As criptomoedas vão se popularizar como meio de pagamento? Especialistas opinam
Fontes ouvidas pelo InvestNews afirmam que ainda falta conhecimento sobre o ativo para ele ganhar força, mas uso já está em expansão.
Apesar de as criptomoedas terem ganhado popularidade no Brasil, fazendo o número de investidores deste tipo de ativo disparar 938% em 2021, segundo a gestora Hashdex, uma de suas funções principais, a de ser um meio de pagamento, ainda é tímida, apesar de estar em expansão, disseram especialistas ouvidos pelo InvestNews.
Ricardo Dantas, co-CEO da Foxbit, explica que as criptomoedas estão se popularizando como um todo, mas, como meio de pagamento, é algo a ser visto no longo prazo, pois trata-se de um processo mais lento, já que envolve uma mudança grande de conceitos e tem muita competição neste meio.
Dantas explica que, por mais que se fale muito de criptomoedas, ainda poucas pessoas possuem conhecimento para utilizá-las no dia a dia. Para ele, o uso prático de criptoativos ainda pode levar de 2 a 5 anos para ser uma opção comum para todos.
“Ainda temos a cultura do “lugar de dinheiro é no banco” ou “paga com o cartão”. Para a criptomoeda virar um meio de pagamento, as pessoas ainda precisarão aprender a gerenciar suas próprias carteiras e chaves”, avalia o co-CEO da Foxbit.
Orlando Telles, diretor de research da Mercurius Crypto, explica que o mercado de criptomoedas ainda é muito pequeno, de, aproximadamente, 300 milhões de usuários ao redor do mundo. Apesar disso, segundo ele, está acontecendo um avanço da digitalização global, além da adoção significativa de institucionais construindo infraestrutura grande para este mercado, criando modelos de aceitabilidade.
“Hoje, a gente pensa na questão de usabilidade no mercado de criptomoedas na linha de meio de pagamentos e de construção de infraestrutura para que nos próximos um ano e meio ou dois, quando começarmos a ter uma clareza de questão regulatória de forma mais significativa, veremos um expansão”, avalia Telles.
Expansão do uso de criptomoedas como meio de pagamentos
Pesquisa feita pela Visa apontou que quase um quarto das pequenas empresas em nove países planejam aceitar moedas digitais como forma de pagamento em 2022, enquanto 13% dos consumidores nesses países esperam que as lojas de varejo comecem a oferecer pagamentos com criptomoedas a partir deste ano.
A pesquisa feita com 2.250 donos de pequenas empresas de Estados Unidos, Brasil, Alemanha, Irlanda, Rússia, Singapura e Canadá, sugere que as criptomoedas podem estar começando a se popularizar como meio de pagamento.
Paulo Aragão, cofundador do Criptofácil, explica que, pelo fato de as criptomoedas serem descentralizadas, não é possível saber exatamente quais estabelecimentos estão aceitando o ativo como forma de pagamento.
“Hoje em dia, conseguimos fazer absolutamente tudo pagando com criptomoeda, como comprar um apartamento, adquirir domínio de site, pagar reforma de uma casa, comprar um carro, absolutamente tudo. Não existe um lugar onde a gente consiga consultar de forma centralizada todos os pontos de aceitação, pois qualquer pequeno lojista pode passar a aceitar criptomoeda sem ter que pedir autorização para ninguém. É algo descentralizado”, explica o cofundador do Criptofácil.
No entanto, já é sabido, por exemplo, que El Salvador se tornou o primeiro país a adotar bitcoin como moeda legal, em setembro de 2021. A mudança significou que as empresas do país devem aceitar o pagamento em bitcoin, assim como o dólar americano, que é a moeda oficial de El Salvador desde 2001 e segue com curso legal.
“Em poucas semanas, um terço da população já estava habituada com uma carteira de criptomoedas. Estamos falando de 2,1 milhões de pessoas. Vale muito ressaltar que 70% da população salvadorenha é desbancarizada. O que mostra que bitcoin não é apenas acessível, como é inclusivo”, diz o especialista em criptomoedas Felipe Escudero.
Escudero defende que, a partir do momento em que as pessoas entenderem que o dinheiro está fadado à desvalorização, naturalmente, elas perceberão que utilizar bitcoin não é apenas uma forma de obter lucros e ganhos, mas uma maneira de proteção contra a desvalorização cambial.
“O uso das criptomoedas pode ganhar força como meio de pagamentos quando as pessoas entenderem o poder de corrosão que a inflação causa no dinheiro. No Brasil, a inflação em 2021 foi de cerca de 10%. Nos EUA foi o pior cenário inflacionário em décadas”, lembra Escudero.
De acordo com levantamento da plataforma de dados blockchain Chainalysis, Vietnã, Índia, Paquistão, Ucrânia e Quênia estão entre os países que mais adotaram e utilizam as criptomoedas. O Brasil aparece na 14ª posição. Confira o ranking dos países que compõem o Índice Global de Adoção de Criptomoedas de 2021, elaborado pela Chainalysis:
Segundo o estudo da Chainalysis, ao final do segundo trimestres de 2021, a adesão às criptomoedas cresceu mais de 881% em comparação ao ano anterior, com destaque para países emergentes, como uma maneira de preservar suas economias por causa da desvalorização das moedas oficiais.
Por outro lado, segundo o levantamento, a adoção de criptomoedas na América do Norte, na Europa Ocidental e na Ásia Oriental no último ano foi impulsionada em grande parte pelo investimento institucional.
No mundo, grandes empresas como Mercado Livre (MELI34), Tesla (TSLA34), PayPal (PYPL34) e Visa, por exemplo, já adotaram criptomoedas como meio de pagamentos.
Recentemente, no Brasil, o braço financeiro do Mercado Livre (MELI34), Mercado Pago, anunciou o lançamento da funcionalidade de compra e venda de criptomoedas por meio de seu aplicativo.
Ainda por aqui, o prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, afirmou que a prefeitura estuda a aplicação de 1% do Tesouro Municipal em criptomoedas, desconto no Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) para quem realizar o pagamento em bitcoins e a criação de uma criptomoeda, a CriptoRio.
“Esta iniciativa é um indicativo muito forte da popularização das criptomoedas. Isso tem acontecido, por parte das pessoas, de forma independente e orgânica, pois elas enxergam o bitcoin como um bom investimento de médio e longo prazo e uma forma de fugir da perda do poder de compra que a moeda fiduciária acaba tendo ao longo do tempo”, destaca Aragão.
Ricardo Dantas, CO-CEO da Foxbit, defende que é um processo de maturidade e depende muito da necessidade. “Ele deverá ser lento, porém, há lugares como em Jericoacoara, no Ceará, que, por causa da quantidade de estrangeiros que recebe, vários estabelecimentos já aceitam bitcoin como moeda”, lembra Dantas.
Escudero também avalia que o uso das criptomoedas no Brasil e no mundo como meio de pagamentos ainda é tímido, mas já está com muito mais adoção do que há 5 ou 6 anos.
Volatilidade das criptmoedas: risco?
Quando se fala em criptoativos, uma das características mais conhecidas dos ativos digitais é a volatilidade. São diversos os fatores que podem favorecer essa oscilação acentuada de preços, desde a falta de regulação, especulações até o tamanho deste mercado.
No início do ano passado, o bitcoin, por exemplo, subiu mais de 110% e bateu recorde na metade do mês de abril ao superar os US$ 62 mil. Duas semanas depois, o criptoativo despencou para US$ 49 mil.
Por serem ativos altamente voláteis, podendo ter uma movimentação drástica de preço dentro de poucas horas, Escudero explica que essa oscilação faz com que as pessoas se desinteressem por usar criptomoedas no dia a dia. Mas, segundo ele, hoje, existem formas de controlar essa volatilidade, seja por meio das stablecoins (moedas estáveis, que tendem a estar pareadas com o dólar), além também de condutas de empresas de cartão de crédito, como Visa e Mastercard, por exemplo, que aceitam que o usuário pague com criptomoedas e o sistema converte automaticamente para moeda corrente.
Ele ainda aponta que um dos empecilhos para o uso de criptomoedas como meio de pagamentos ganhar força é o fato de que os estabelecimentos ainda não entenderem que podem ter uma nova forma de pagamento para geração de receita. “E isso vem, obviamente, com demanda. Cabe aos “bitcoiners” mostrarem ao comércio que eles estão perdendo receita por não ter mais uma opção de meio de pagamento”, destaca o especialista em criptmoedas.
Escudero ressalta também que, hoje, o mercado de criptomoedas está criando base para uma maior aceitação, desde projetos de máquinas de cartão, QR code e outras tecnologias que estão sendo desenvolvidas e testadas para este fim.
“Quando as pessoas entenderem que podem ser donas do seu próprio dinheiro, sem intermediários, como bancos ou emissoras de cartões de crédito, e usarem criptomoedas como pagamento para o dia a dia, este mercado vai crescer ainda mais, pois deixa de ser meramente especulativo e passa a ter uma usabilidade global”, defende Escudero.
Criptomoedas promissoras como meio de pagamentos
Estudo global da Visa, intitulado “O fenômeno cripto: atitudes e usos do consumidor”, revelou que os consumidores engajados estão altamente interessados em comprar ainda mais criptomoedas promissoras para fins de investimento nos próximos 12 meses e acreditam que elas serão amplamente usadas para comprar produtos e enviar dinheiro nos próximos 5 a 10 anos.
Segundo Romina Seltzer, head de Soluções para a Visa América Latina e Caribe, esse resultado sugere que as criptomoedas estão deixando de ser um ativo de nicho voltado a uma pequena comunidade de investidores e chegando ao mercado geral, ficando cada vez mais acessível ao público e a novos adotantes.
Ricardo Dantas, CO-CEO da Foxbit, destaca que existem várias criptomoedas que podem fazer esse papel de meio de pagamentos, como bitcoin, litecoin, stellar, XRP, stablecoins, pelo fato de os projetos e a tecnologia delas já terem sido criados com essa possibilidade.
Já Escudero pontua que, como meio de pagamento, o mercado adotou o bitcoin como padrão pelo fato de ele servir como facilitador para remessas de grandes valores. “Em menos de 10 ou 20 minutos, você pode transferir US$ 100 milhões para o outro lado do mundo, pagando uma taxa menor do que um cafezinho”, diz o especialista em criptomoedas.
Para pequenos valores, Escudero explica que existe uma solução que roda em paralelo com a blockchain do bitcoin, chamada de Lightning Network – ou rede relâmpago – que permite transações praticamente instantâneas e com custo de frações de centavos.
Aragão desta que entre as vantagens do uso de criptomoedas como meio de pagamentos está o fato de não ser necessária autorização, de ter um custo muito baixo para começar a se aceitar criptomedas como meio de pagamento e é uma maneira de inseri-la no mercado global. “Quem tem oferta de serviço pela internet, pode receber o pagamento de qualquer pessoa, de qualquer lugar do mundo, sem nenhuma burocracia e o dinheiro vai diretamente para o vendedor sem intermediário”, afirma o cofundador do Criptofácil.
Já entre as desvantagens, o cofundador do Criptofácil cita a característica de volatilidade das criptomoedas em relação a outros ativos financeiros, que pode ser ruim para os comerciantes, por exemplo, mas, segundo ele, é algo que pode ser solucionado já que, no próprio mercado brasileiro, existe a possibilidade de fazer a conversão automática da criptomoeda para o real no momento do pagamento.
Escudero lembra ainda que o uso de criptomoedas como meio de pagamentos gera um impacto positivo para os investidores nestes ativos, pelo fato de, segundo ele, haver um consenso de que o bitcoin pode ser uma forte reserva de valor, trazendo mais segurança ao investidor, além de possibilitar liquidez para o mercado cripto.
Impactos no sistema financeiro
Aragão explica que é natural que o mercado financeiro global tenha que se atualizar por causa das criptomoedas e que essa atualização pode ser de várias formas. “No Brasil, foi implementado o Pix. Ele ajudou bastante o mercado, pois é possível depositar e sacar 24 horas por dia. Isso foi uma evolução do mercado financeiro brasileiro, por exemplo”, lembra.
“O mercado financeiro vai ser impulsionado a evoluir graças às criptomoedas. Hoje, a gente chama muito de mercado financeiro tradicional e de cripto, mas não acredito que teremos essa divisão para sempre. A parte cripto, com certeza, vai integrar o mercado financeiro global em um curto espaço de tempo. Então, vai ser tudo mercado financeiro. Uma evolução é esperada, é natural e acredito que a gente já esteja neste caminho”, conclui o cofundador do Criptofácil.
Rodrigo Soeiro, fundador da Monnos, avalia que o Brasil é um país de grande potencial para a criptoeconomia e que há muita oportunidade, mas é um mercado no qual as empresas ainda não oferecem muito do que pode ser encontrado no panorama internacional. Para ele, a criptoeconomia é a próxima fronteira do setor financeiro.
Pontos de atenção para pagamentos com criptomoedas
Assim como todo meio de pagamentos online necessita de cuidados e atenção para evitar erros, e ter segurança na transação, com as criptomoedas não é diferente.
Ricardo Dantas, CO-CEO da Foxbit, ressalta que, com o aumento do uso das criptomoedas como meio de pagamentos, estudo é a palavra-chave para entender como ter uma carteira, mecanismos de segurança de chaves privadas e acessos aos celulares.
“Para evoluir neste processo, é preciso entender minimamente como isso tudo funciona. À medida que o tempo passar, será cada vez mais parte do nosso dia a dia. Um exemplo foi o próprio cartão de crédito. Levou anos para estar na rotina diária das pessoas e, hoje, ele está sendo substituído por QR code e aproximação. Tudo faz parte de um processo de mudança”, aponta Dantas.
Para Aragão, o principal cuidado tem que estar no momento de fazer o processo de pagamento, verificando se os dados do destino estão corretos, pois, no caso de criptomoedas, as transações são irreversíveis.
“Se enviar errado, perde o dinheiro. Porém, esse risco é minimizado, pois a maior parte das transações envolvendo criptos acontecem através de leitura de QR code, onde não precisa digitar nada, sendo uma forma segura de conseguir transacionar”, conclui o cofundador do Criptofácil.
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