O desejo de comprar um carro costuma aparecer com frequência em listas de resoluções de ano novo. É o seu caso? Então precisamos fazer algumas contas. Isso porque o primeiro impulso da maioria dos consumidores tende a ser buscar crédito para fazer a compra.

A única vantagem de pegar um empréstimo será receber o automóvel na hora. De resto, o custo se torna muito mais alto.

Vamos às contas. Em um financiamento de 60 meses para um veículo de R$ 150 mil, com taxa mensal de 1,49% e sem nenhuma entrada, o valor da parcela fica em R$ 3,8 mil. No final, você terá desembolsado R$ 228 mil, dos quais R$ 78 mil apenas de juros. Ou seja, na ponta dos lápis, esse é um caminho mais árduo para chegar ao seu objetivo.

No entanto, é possível adquirir o bem no mesmo prazo com muito mais tranquilidade. A solução para realizar o plano passa pela estratégia correta de investimentos. Mesmo se você montar uma carteira bem conservadora, os juros compostos vão ajudá-lo nessa empreitada. E o momento atual, com juros elevados, vai turbinar os retornos.

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Veja alguns cenários. Com a taxa Selic em 12,25% ao ano, se os mesmos R$ 3,8 mil forem aplicados em produto conservador, que renda 100% do CDI, é possível juntar os R$ 150 mil em 33 meses – pouco mais da metade do prazo do financiamento. Isso, claro, sem levar em conta o efeito da inflação no período.

Mas na vida real é preciso considerar as variações de preços. E, claro, dento de um horizonte de cinco anos, muita coisa pode mudar. A Selic atual representa um juro real, quando você desconta a inflação, de quase 8% ao ano. Isso é um nível completamente fora da curva, que dificilmente vai se manter ao longo da década.

Então vamos considerar um juro real condizente com a média histórica. No caso, um nível de 5% ao ano (por exemplo, um cenário de inflação em 4% e Selic em 9%). Nessa situação, um investimento de R$ 2,1 mil por 60 meses seria suficiente para comprar o carro desejado. E você só terá tirado do bolso R$ 126 mil.

Já aqueles R$ 3,8 mil por mês que você gastaria no financiamento se tornariam R$ 258,7 mil na sua carteira, se forem aplicados com o juro real de 5% ao ano por 60 meses.

Podemos ainda usar as estimativas de profissionais do setor financeiro para os próximos anos. O Banco Central realiza toda semana uma pesquisa com agentes econômicos, chamada Focus, que traz as visões do mercado sobre o cenário macroeconômico até 2027.

No levantamento mais recente, a mediana das expectativas indicava uma Selic de 15% no fim de 2025. Para o ano seguinte, de 12%. E, em 2027, de 10%. Dentro dessas estimativas, a taxa básica média de 2025 estaria em 13,6%. Em 2026, seria praticamente a mesma, de 13,5%. E, em 2027, de 11%.

Ainda na Focus, as estimativas de inflação alcançam, respectivamente, 4,99%, 4,03% e 3,90% em 2025, 2026 e 2027. O juro real médio dos três anos, quando descontamos a variação de preços, portanto se situaria em 8,36%.  

Nessas condições, um aporte de R$ 3,8 mil mensais resulta em R$ 155,2 mil nesses 36 meses, líquido de IPCA nesse caso – ou seja, em dinheiro de hoje. Em “dinheiro de amanhã” o que estará na sua conta é o o valor nominal (juro real + IPCA). Vai dar R$ 165 mil. Caso o valor do carro tenha subido junto com o IPCA, ele custará R$ 170,2 em 2027. Ou seja, em três anos você consegue juntar o valor suficiente para comprar o carro desejado à vista e ainda sobram R$ 5,2 mil.

Percebeu as vantagens de criar uma carteira de médio prazo para realizar seu plano?

Juros: melhor receber do que pagar

O coordenador do MBA de negócios do Ibmec, Cristiano Correa, ressalta a importância de trocar o crédito pelo investimento para a aquisição do carro próprio. “O dinheiro tem um custo no tempo. Quando você financia ou aplica nos dois cenários tem juros, mas é a escolha entre você pagar ou receber.”

O especialista lembra que a taxa básica Selic deve alcançar 14,25% em março, conforme o Banco Central já sinalizou. “Mas arrisco a dizer que os juros vão ficar até um pouco mais elevados que esse patamar.”

Nesse caso, o professor do Ibmec sugere que o investidor aplique recursos regulamente no Tesouro Selic, o título emitido pelo Tesouro Nacional que simplesmente segue o juro básico. Num período como este, é uma forma segura de fazer com que os juros trabalhem a seu favor.

Retorno elevado da renda fixa

O sócio e estrategista-chefe da Casa do Investidor, Michael Viriato, defende ainda aplicação em CDBs de bancos médios, com remuneração acima de 100% do CDI, como uma estratégia para o médio prazo. Os certificados de depósitos bancários são títulos emitidos por instituições financeiras como forma de captar recursos. Podem ter retornos prefixados, ou seja, com uma taxa fixa anual, ou pós-fixados, que seguem a taxa de juros de curto prazo do mercado, o CDI.

“Como o título público tem menos risco, o aplicador vai ganhar menos comparado ao CDB. Mas o título bancário tem garantia do FGC.” O Fundo Garantidor de Crédito se responsabiliza por devolver o dinheiro aplicado dentro de um limite de R$ 250 mil por produto garantido e para cada CPF.

CDBs de bancos médios têm sido oferecidos no mercado com remunerações entre 100% e 150% do CDI. Uma taxa de 110% do CDI, por exemplo, equivale a hoje a uma remuneração de 13,47% ao ano. No teto, os 150% do referencial representam um retorno de 18,37% anuais.

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O investidor, porém, precisa ficar atento às condições de cada produto. Os certificados bancários diferem entre si não só na remuneração, mas também nas condições para saques e nos prazos de aplicação. Muitos deles, em troca do retorno mais polpudo, exigem que você mantenha os recursos aplicados por meses.

Oportunidades no médio prazo

O Tesouro Direto oferece várias opções de investimentos com retornos elevados. Além, do citado Tesouro Selic, há opções potencialmente ainda mais rentáveis no médio prazo. É possível, por exemplo, fazer aportes em papéis como o Tesouro Prefixado, que oferece uma taxa fixa de remuneração anual.

A modalidade conta com várias opções de vencimentos, com prazos de 3, 5 ou 10 anos. O Tesouro Prefixado 2027, com resgate em janeiro de 2027, tem remuneração nominal, atualmente, de 15,77% ao ano.

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Um outro tipo de título paga a variação da inflação mais um juro fixo. Trata-se do Tesouro IPCA+. A versão com vencimento em maio de 2029, por exemplo, remunera atualmente a uma taxa que soma o IPCA mais um juro real de 7,6% ao ano. Significa que, se a inflação alcançar 5% em 2025, o papel vai pagar 12,6% no ano, sem considerar o IR.

No caso do Tesouro Direto, existe um porém. Para ganhar exatamente o que foi contratado nos título prefixados e nos atrelados à inflação, você precisa deixar o dinheiro aplicado até o vencimento. Caso saque antes do tempo, o valor pode cair devido às condições de momento.

Renda fixa isenta de IR

Outras opções na renda fixa são os produtos isentos de cobrança de IR sobre os ganhos. As duas modalidades de investimentos mais populares são as Letras de Crédito Imobiliário (LCI) e as Letras de Crédito do Agronegócio (LCA). Ambas são emitidas por bancos e, como os CDBs, podem ser prefixadas, pós-fixadas ou atreladas à inflação.

Os produtos, porém, têm condições mais restritas de resgates. Os prazos mínimos para as aplicações são de 9 meses, mas algumas chegam a três anos de vencimentos. Ou seja, o dinheiro fica preso até o fim do tempo definido no produto escolhido. A vantagem é justamente a isenção de cobrança do imposto de renda sobre os ganhos, como ocorre em produtos de renda fixa tradicionais.

Até por causa desse benefício, LCIs e LCAs costumam pagar uma remuneração abaixo de 100% do CDI, quando pós-fixadas. Como são produtos bancários, as letras têm ainda a garantia do FGC, o que confere uma segurança a mais.

Descontos na renda variável

Em um prazo um pouco mais amplo, de três a cinco anos, o investidor também pode considerar colocar uma parte menor do dinheiro, cerca de 10% ou menos, em renda variável. No caso, em ações de grandes empresas que costumam pagar dividendos ou em ETFs – fundos de índices negociados na bolsa – que seguem o Ibovespa ou o IBrX100.

Essa seria uma aposta. Ninguém tem bola de cristal para prever o comportamento do mercado. E, caso opte por colocar parte do dinheiro na renda variável, você corre o risco de perder o chamado custo de oportunidade, ou seja, o rendimento do CDI no período para essa parcela da carteira.

“No Brasil de 2025, é válido se expor à renda variável, pensando no médio prazo”, afirma Correa, do Ibmec. Há um bom motivo para isso. Diante do cenário de juros em elevação e sem uma perspectiva clara de queda, as ações são negociadas com desconto. Isso porque os investidores buscam os polpudos ganhos atuais da renda fixa.

O Ibovespa negociava a um múltiplo de preço por lucro (P/L) de 8,2 vezes no fim de 2024. Esse indicador faz uma relação entre o valor de mercado das empresas que compõem o referencial e o lucro líquido desse grupo. Trata-se de um desconto de 25% sobre o P/L médio dos últimos 20 anos.

Se o mercado de renda variável melhorar, sua carteira de investimentos pode se beneficiar de um impulso extra. Trata-se de um risco. Mas, com um desconto tão grande, existe uma possibilidade razoável de a aposta se pagar.

Leia mais na série Investir para Viver – Edição 2025

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